A visão de mundo de cada povo é
determinada por sua cultura. E cada cultura constrói um processo
simbólico diferente, o que relativiza os significados astrológicos.
Quando se usa o termo "cultura", quase
automaticamente as pessoas dão-lhe um significado restrito
de "refinamento intelectual, de hábitos, modos ou gostos",
além de uma grande gama de conhecimentos legitimados socialmente.
Na verdade, a cultura não é um atributo restrito a
pessoas de grande erudição ou de complicada parafernália
vocabular. O conceito de cultura, na acepção antropológica,
pode ser resumido como o conjunto complexo dos códigos e
padrões que regulam a ação humana individual
e coletiva. Em outras palavras, todos os indivíduos têm
cultura, pois todos tiveram algum tipo de relacionamento com a sociedade
na qual tiveram origem. Os códigos comportamentais de cada
grupo social estão implantados, ou melhor, entranhados, na
mente de seus componentes.
Podemos fazer a seguinte analogia: a cultura é
como um programa de computador, sendo o software nossas crenças
e valores sociais, inserido em nosso hardware (o organismo
físico) que regula as ações e comportamentos
segundo um padrão estabelecido e fora do qual não
há resposta codificada. Por exemplo: se num software
construído especialmente para a edição de textos
estivermos tentando usar um dispositivo para desenhar à mão
livre, fatalmente não conseguiremos realizar nosso intento.
O programa ou não responderá aos comandos ou poderá
interromper por completo suas operações. Isso ocorre
porque os comandos dados estão fora do quadro de referências
para o qual o programa foi criado. Ele, então, rejeita as
operações solicitadas.
Nos grupos sociais ocorre algo semelhante. Se uma
atitude que não se encaixa na cultura daquele grupo está
muito evidente, é provável que o grupo rejeite o perpetrador
da atitude ou o condene a algum tipo de punição. Aquela
cultura não tem um quadro de expectativas capaz de assimilar
tal ação fora dos padrões, por isso a considera
perniciosa, capaz de atentar contra a ordem que mantém o
senso de realidade (cosmo - universo criado e ordenado) do grupo
social.
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Por exemplo, dentro de um hospital
a morte é uma rotina para a qual certos procedimentos
são comuns. Eles servem para amortecer o impacto que
a morte causa no sistema de percepção dos componentes
daquela cultura. Entretanto, se ocorre um assassinato de um
funcionário que transita pelos corredores, as reações
dos outros funcionários serão de pânico,
surpresa ou comoção. |
A explicação está no fato de
que tal evento não está dentro do código de
circunstâncias previstos na cultura daquele grupo social.
Tal tipo de morte não é considerada uma "morte
de hospital", isto é, não ocorre segundo o conjunto
de normas que admite a morte como rotina. Está fora das expectativas.
É um elemento imprevisível e, portanto, passível
de causar desestruturação da noção de
realidade daquele grupo. Em outras palavras, é o caos que
se apodera da ordem, do universo previsível.
Pela analogia, Urano é significador de pessoas,
eventos, objetos e circunstâncias para os quais a sociedade
não tem, a princípio, um conjunto de expectativas
capazes de neutralizar ou atenuar seu impacto. O símbolo
contraria tudo o que está dentro de um escopo tratado como
normalidade. No entanto, a mesma coisa que para um determinado grupo
seria contraditória, pode ser absolutamente normal para um
segundo grupo, isto é, pode estar dentro de seu sistema de
expectativas de comportamento. A mesma concepção se
estende para os símbolos de Netuno e de Plutão, quando
vistos sob o prisma da dificuldade ou até impossibilidade
de controle sobre algumas de suas manifestações correlatas:
a desagregação contínua e imperceptível
(Netuno) das estruturas sociais e a morte (Plutão).
Teoriza-se que a cultura surgiu em vista da
necessidade humana de sobrevivência ante um mundo hostil.
O Homem desenvolveu-se e proliferou em função do aprendizado
cultivado em cada sociedade. O acúmulo e a transmissão
de conhecimentos e experiências foram criando subsídios
para uma vida mais confortável, garantindo a sobrevivência
em meio às dificuldades. Em conseqüência, cada
cultura se autojustifica e dá legitimidade a seu sistema
excluindo quaisquer outros, pois tudo aquilo que está fora
dela parece-lhe atentar contra a continuidade da existência
(seu cosmo particular). A cultura, portanto, é também
um sistema de garantia da vida. Desestruturar esse sistema é
aproximar-se da destruição da vida. Eis aí
um dos tabus mais comuns da humanidade.
A cultura
e a baba que escorre da boca
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