1928, ponto de inflexão
No início da juventude Oscar Niemeyer foi um típico boêmio carioca, tão despreocupado com seu futuro que só terminou o ensino secundário através de um supletivo em 1928, ano em que completou 21 anos. Este parece ser um momento de virada em sua vida: casa-se com Annita Baldo, filha de imigrantes italianos, e só então passa a “tomar jeito”, ciente das responsabilidades que então tinha diante de si, decidindo trabalhar e ingressar na universidade. É quando entra na oficina tipográfica do pai (de onde viria a ser demitido por passar o tempo inteiro desenhando) e começa os estudos na Escola Nacional de Belas Artes da Universidade do Brasil.
Não consegui ter acesso às datas da formatura colegial e do casamento, mas a Fundação Oscar Niemeyer aponta que tais eventos ocorreram ano de 1928. Ora, como o período letivo termina sempre ao final de cada ano, supõe-se que ele tenha concluído os estudos secundários em dezembro, perto ou pouco depois de completar 21 anos.
Na figura acima, temos os trânsitos de planetas médios e lentos, entre 01.01.1928 e 01.01.1929, sobre o mapa de Oscar Niemeyer. Comecemos por Plutão, que no início daquele ano estava em oposição exata a Vênus [regente da carta em si e da casa XII], retornando logo em seguida à conjunção exata com Netuno [co-regente do Meio do Céu], para finalmente voltar a seu movimento direto. Posto que Plutão tem grande relevância para Niemeyer, pois está angular e na Quadratura T natal com Sol e Saturno, percebemos a oposição ao regente do mapa [seis anos após ter iniciado oposição a Urano] revelando o clímax de uma tensão que permeou sua adolescência, já que, se o fato de pertencer a uma família com boa posição social servia de subsídio para se concentrar apenas nos prazeres pessoais e na própria liberdade, a boa vida que levava o impedia de amadurecer e ambicionar maiores voos.
De modo que a conjunção de Plutão a Netuno natal deve ser entendida como a tomada de consciência sobre a necessidade de estabelecer um conjunto de circunstâncias que viabilizasse uma base para a profissionalização e a vida futura. Além de transformar a despreocupação em relação à capacidade de começar a prover a si mesmo o sustento [Vênus e Urano na casa VIII em oposição a Netuno na casa II], Plutão representou a mudança que vem através do amor e da dedicação a alguém, levando-o a se casar e a perseguir metas profissionais. No mapa natal de Niemeyer, Netuno está conjunto ao Nodo Norte, indicando que o padrão de vida hedonista [Vênus-Nodo Sul-Urano na casa VIII] tendia a ser desprivilegiado em prol de uma atividade que visasse a sobrevivência através da inspiração [Netuno-Nodo Norte na casa II]. Ao longo desta época, Plutão formava trígonos com Marte e Saturno na casa X. Como Netuno é corregente da casa X e Plutão o é da casa VII, vemos uma fase crucial [Nodo Norte] criando uma sinergia entre carreira e casamento. Niemeyer seguiu sua intensa vida produtiva até depois dos cem anos e Annita foi sua esposa até vir a falecer em 2004.
Saturno em trânsito entra em ação
Ainda sobre esta importante fase de sua juventude, tendo como ponto de inflexão o ano de 1928, vemos acima o deslocamento de Saturno, que em janeiro daquele ano já havia deixado Mercúrio [consciência da importância em concluir logo a escola secundária] para, ao final do período, chegar ao Sol natal, ativando a Quadratura T. O trânsito envolve a casa VII [matrimônio] e reforça a ideia de crise e necessidade de superação [oposição a Plutão e quadratura com Marte e Saturno natais]. A passagem de Saturno sobre o Sol também indica o compromisso de trabalhar, inicialmente, na tipografia do pai.
A figura que segue continua a fundamentar a análise deste verdadeiro “rito de passagem” que foi 1928. Em janeiro, uma conjunção entre Júpiter e Urano na casa X [o primeiro é corregente da mesma e do próprio Sol] estava em quadratura com o Sol natal, reforçando a ideia de crise em relação ao futuro. É importante ressaltar que a casa X também diz respeito a matrimônios e uniões oficiais.
Os trânsitos de Júpiter em Áries costumam ser mais rápidos que a média e, naquele ano, ele chegou até sua Lua natal em Touro entre agosto e outubro. Ao passar pela casa XI, Júpiter ampliava a consciência sobre a importância de sua própria inserção social sendo que, ao tocar a Lua, corroborava a necessidade de mais abundância e segurança, o que irá perseguir através do casamento e da busca de uma carreira. Júpiter ainda aplicou trígono a Netuno em Virgem [ambos regentes do Meio do Céu e da casa X], contribuindo decisivamente para uma atitude mais positiva em relação ao futuro. Todavia, este último aproximava-se do Fundo do Céu e começava então uma oposição ao Meio do Céu; estava claro que o sucesso que viria depois teria de ser conquistado com incrível afinco, dado o atraso que vivia em função de sua displicência escolar. Urano, que em 1929 ingressaria em sua casa XI, aponta que sua “inserção social” [iniciada, enfim, por Júpiter] teria necessariamente um compromisso com a originalidade e, de certa forma, a própria modernidade. É quando matricula-se na Escola Nacional de Belas Artes.
Finalmente, coroando nossa argumentação sobre este importante ano de 1928, vemos que o Eixo Nodal cruzou suas casas I e VII, fechando o período exatamente sobre o eixo Ascendente-Descendente. Niemeyer casara-se, e a partir de então seguiria sua singular e longeva trajetória na Arquitetura Moderna.
A importância do Retorno Solar
O Retorno Solar de Oscar Niemeyer para dezembro de 1928 é importante porque marca justamente esta “passagem” a que me referi. A breve análise que aqui farei dirá respeito apenas à carta em si, sem preocupações maiores com a transposição para a carta radical porque os trânsitos dos planetas lentos ao final de dezembro já foram mostrados. Nela, observamos Mercúrio e Saturno envolvidos numa estreita conjunção com o Sol na casa VI, apontando para o fato de que, no ano seguinte, sua preocupação com os estudos, o trabalho e a organização da sua vida, de modo geral, continuaria muito presente. Júpiter e Netuno [regentes do Meio do Céu natal] estão em um trígono com o Sol [casas II, VI e X], representando uma conjuntura favorável para quem corria atrás do tempo perdido. Ainda que os trígonos de Júpiter e Netuno ao Sol sejam de órbitas longas [Mercúrio e Saturno nem chegam a tomar parte], nota-se o estreito trígono entre os regentes de seu Meio do Céu. O Ascendente do Retorno [Marte acompanha] cai exatamente sobre a cúspide da casa II, favorecendo a ênfase transformadora que Plutão aplicava àquele setor.
A Progressão Secundária tirada para aquele mesmo aniversário também é reveladora: o Sol progredido acabara de deixar para trás uma conjunção com Urano, e indica a busca pela reinvenção de si mesmo, iniciada, provavelmente, antes mesmo de 1928. As oposições com Netuno e Nodo Norte natais, exatas, retratam novamente os temas discutidos mais acima, como a ideia de “crise” e falta de dinheiro. A partir dali, o Sol estaria em conjunção com Vênus radical [regente da carta de nascimento], sugerindo o início de um encontro consigo mesmo e de seu casamento, pontos de partida para seu desenvolvimento pessoal e profissional. A questão do casamento ganha ainda mais ênfase com a conjunção exata entre Lua e Vênus [este, o regente da carta de origem, lembre-se]. A oposição de ambos os astros a Júpiter aponta para o contexto fundamental de sua vida, naquele momento: se a consumação do matrimônio rompia a fase de bon vivant com as responsabilidades que ele passava a assumir junto à mulher que acompanharia sua monumental trajetória dali por diante, foi justamente o casamento o elemento que catalisou o início desta trajetória. Por fim, constatamos que em 1928 Marte e o Meio do Céu progredidos estavam conjuntos, corroborando as diretrizes pessoais, matrimoniais e profissionais que Oscar Niemeyer incorporou desde então.
Próxima etapa: Niemeyer e Lúcio Costa: a descoberta do Modernismo (1934-1939)
NIEMEYER, A SÉRIE COMPLETA:
1 – Dos cabarés da Lapa à arquitetura moderna (1907-1927)
2 – Niemeyer, o boêmio que virou marido (1928)
3 – Niemeyer e Lúcio Costa: a descoberta do Modernismo (1934-1939)
4 – Pampulha, a revolução da arquitetura brasileira (1940-1943)
5 – Um comunista na terra do Tio Sam (1945-1947)
6 – Niemeyer e Le corbusier: do Copan ao Ibirapuera (1949-1955)
7 – Brasília, a utopia de Juscelino e Oscar Niemeyer (1956-1960)
8 – O regime militar e o exílio (1964-1976)
9 – Oscar Niemeyer, a vida começa aos setenta (1978-1993)
10 – A paixão aos 99 anos (1997-2007)