O Islã e a Glória Olímpica
Em 1959, com 17 anos, Cassius Clay conheceu a organização “Nação do Islã” durante o campeonato nacional de boxe amador, em Chicago. Na escola escreveu uma redação sobre o tema, alarmando os professores de que era um jovem com profundo interesse na militância pregada pelo grupo. Num primeiro momento, conseguiram dissuadi-lo de se envolver, mas seu irmão acabou entrando para a organização três anos depois.
No retorno solar de 1959 vemos Urano aproximando-se do Ascendente e numa Quadratura T com o stellium em Aquário nas casas VI e VII. Vênus do retorno está em conjunção exata a Mercúrio e toma parte na Quadratura T, simbolizando a sintonia com pessoas possuidoras de uma visão mais inconformada quanto às relações raciais no país. Não apenas estava evidente para ele a “condição inferior” do negro nos EUA [associada ao trânsito de Plutão pelo Ascendente], como começava a despontar o interesse em participar de um esforço de grupo para tomar parte em um movimento de afirmação social [Urano-Ascendente].
Este artigo é o segundo de uma série, cobrindo toda a carreira de Muhammad Ali. Não deixe de ler as origens do mito, que analisa a carta natal do boxeador.
1942-1954: Muhammad Ali, as origens do mito
1959-1966: o Islã e a glória olímpica
1967-1973: Muhammad Ali, o inimigo da América
1973-1999: da luta do século ao mal de Parkinson
Netuno, co-dispositor da casa VIII encontrava-se em oposição a Marte e em quadratura com Plutão nesta fase de sua vida. Vemos o despertar de uma ideologia doutrinária focada na religião e no sentimento de uma comunidade étnica [casas XII, IX, III; Marte e Plutão dispositores IV] que resultaria em conflitos sociais através de uma investidura de poder [Netuno, co-dispositor da casa VIII].
No retorno solar, Lua e Marte em Touro fechavam uma Quadratura T com Urano em Leão e Vênus em Aquário indicando não apenas as tensões inerentes de sua precoce “politização”, mas também a carreira promissora e a fama incipiente, já que a esta altura começava a despontar como um grande campeão [lembre-se de que o orador na sua formatura previu que ele seria rico e famoso, pois já demonstrava ser um grande boxeador]. A Lua está em conjunção ao MC, em quadratura com Lua e Mercúrio e em oposição com Netuno natais. Marte aplica conjunção a Saturno-Urano [com o primeiro, exata], quadratura com o Ascendente, Mercúrio e Vênus natais e oposição com Júpiter em Escorpião. Aliás, Júpiter em Escorpião na casa IV é um trânsito que também implica em tomada de consciência étnica e religiosa tendo foco nas origens. Netuno, em oposição ao MC natal e à Lua do retorno solar, tem a mesma conotação.
Plutão, em trígono exato com Marte natal, com a Lua na casa IX e com Mercúrio e Saturno na casa V, sugeria formidável vigor físico e canalizava objetiva e intelectualmente a sua “raiva” [Marte quadratura Plutão no mapa natal]. Como Marte natal é o dispositor das casas IX e IV [doutrinas e origens], vê-se que Ali começa a ter um envolvimento religioso “sério” [trígono com Saturno, dispositor do Sol] e “radical” [trígono com Plutão, co-dispositores da IV]. A Lua estava em trígono com Mercúrio e Saturno em Capricórnio [domiciliado]. Mercúrio formava trígono com o MC. Havia, portanto, dois Grandes Trígonos.
Em 1960, ano em que concluiu os estudos secundários, Cassius Clay vai a Roma representar os EUA nas Olimpíadas, ganhando a medalha de ouro no dia 5 de setembro. Antes, porém, em 08.04.1960, ele se apresentou para o serviço militar.
No alistamento, vemos uma oposição exata entre Marte e Plutão no Céu, com o primeiro tendo a companhia da Lua. Não se esqueça que ambos tomam parte na Quadratura T natal com o Sol, o que confere magnitude considerável ao evento. Vemos o prenúncio do que viria a ser um conflito por toda a sua juventude. Clay foi reprovado no exame militar e dispensado por falar e escrever muito mal [lembre-se de que ele teve péssima classificação na escola e possuía Vênus, regente da casa III, afligido]. Tendo recusado posteriormente a convocação para ir ao Vietnã como reservista, o Grande Trígono exato formado por Marte natal, Júpiter em Capricórnio e Plutão em Virgem insinua a vitória final na Suprema Corte, dez anos depois. A Lua, em Virgem, toma parte na configuração.
Vê-se ainda mais aspectos importantes: Netuno, que fazia oposição a Marte natal, está harmonicamente posicionado diante da oposição Marte-Plutão e do Grande Trígono no Elemento Terra. O argumento de Clay/Ali acatado pela Suprema Corte e que viria a absolvê-lo era de que suas convicções religiosas o impediam de ir ao Vietnã [Netuno oposição Marte natal]. Urano, no Ascendente, aplicava oposição ao stellium em Aquário indicando que o exército seria um grande inimigo em sua vida. O Sol em Áries também sugere que ele seria o vencedor.
Vejamos agora a conquista da medalha de ouro:
Plutão em Virgem seguia em trígono com Marte natal, abrindo seus horizontes para viagens mais importantes, freqüentes e longas; lembre-se que Cassius Clay já tinha o costume de viajar pelo país quando adolescente, para lutar [Marte dispositor da IX, viagens]. Plutão aplicava ainda trígono para o MC e Saturno em Capricórnio [dispositor do Sol, dignificado] fechando um Grande Trígono. Analisando os trânsitos de sua medalha olímpica vemos que o início de sua consagração como boxeador está diretamente ligada ao seu primeiro retorno nodal [uma Lua Cheia ressaltava o trânsito] e à passagem de Urano [radical na casa X] pelo Ascendente. Vê-se que a data da final olímpica tinha relação direta com o seu “destino” [Sol e Nodo Norte em conjunção com Nodo Norte Natal e Lua em conjunção com o Nodo Sul]. Além disso, Clay despontava como um boxeador diferenciado [Urano], posto que lutava com a guarda baixa e convidando o oponente para atacá-lo, revidando em seguida avassaladoramente. Ele era um pugilista extremamente inconveniente para os adversários porque os perseguia nas vésperas das lutas para desestabilizá-los com agressões verbais e escândalos. Já em Roma Clay dizia a todo momento que a medalha de ouro seria sua, com incrível autoconfiança.
Naturalmente, a medalha olímpica colaborou decisivamente para esta “diferenciação”, alçando-o à condição de vencedor. O sucesso chegava até o garoto de Louisville.
Mas a “diferença” para Cassius Clay ficava patente por outros motivos. Naquele mesmo ano, depois de ser barrado num restaurante que só servia pessoas brancas, brigou com uma gangue racista e, segundo o próprio, jogou sua medalha no rio Ohio. Clay era um herói olímpico, mas encontrava sérias restrições pela condição de negro [Urano em oposição a Vênus natal e em quadratura com a conjunção Saturno-Urano], o que feria o seu orgulho [Ascendente Leão].
Voltando à conquista da medalha de ouro olímpica, vejamos sua progressão lunar para o dia 05.09.1960.
Vênus progredida, em conjunção com a Lua e em trígono com Júpiter, representa um aspecto muito poderoso que se manifestou pela glória e fama alcançados. Note que Vênus é o regente do MC de Cassius Clay. O Ascendente da progressão está em Virgem, num trígono para Marte natal.
O campeão estava em plena forma. Marte progredido, em conjunção com o MC natal, iniciava trígono para o Nodo Norte natal. Estes aspectos reiteram o vigor e a disposição de Clay, assim como um momento muito especial de sucesso e conquistas. Com a intensificação do trígono entre Marte e o Nodo Norte, Cassius Clay iria ingressar no boxe profissional. O MC progredido estava em trígono com Netuno natal, caracterizando um período de inspiração para metas pessoais e espirituais.
Repare que a Lua havia aplicado conjunção ao mesmo Netuno na virada 1959-60 [e trígono para o MC progredido], um símbolo não apenas de sua ascensão como boxeador nos meses que antecederam a disputa olímpica, mas também de seu contato com a organização Nação do Islã. Nesta mesma época, Mercúrio progredido estava em quadratura com Urano natal, abrindo sua mente para novas e combativas idéias.
Após vencer em Roma, Clay voltou para Louisville e tornou-se boxeador profissional, vencendo sua primeira luta em 29.10.1960, contra um chefe de polícia da Virgínia Ocidental. Seu estilo era “revolucionário” já que preferia manter a guarda abaixada desviando-se dos golpes com movimentos laterais do tronco e movendo-se rapidamente com os pés. Até então (ou mesmo depois de sua aposentadoria) ninguém havia ousado expor-se desta maneira em lutas de pesos-pesados, onde um único golpe encaixado pode ser fatal.
Curiosamente, ao vencer sua primeira luta como profissional a Lua encontrava-se novamente em conjunção ao Nodo Sul, em Peixes. Saturno na casa V, e em trígono com o MC, representa a passagem do amadorismo para a profissionalização, fechando um Grande Trígono com o retorno do Nodo Norte. Note que Sol e Netuno estavam em conjunção e sua carreira seria influenciada por sua inspiração religiosa.
Entre 1960-64, permanceceu invicto no Boxe, tornando-se cada vez mais famoso. Enquanto isso, Netuno cruzanva o FC e seu envolvimento com o Islã, cada vez mais forte, ainda permanecia em sigilo. Às vésperas da ansiada disputa pelo título mundial, Saturno chegava à cúspide da casa VII reforçando a visão do homem branco como um “inimigo em potencial”.
Clay Campeão do Mundo… Clay?
Finalmente chegara o dia em que Cassius Clay sempre se disse preparado: a luta pelo título mundial dos pesos-pesados. Clay infernizou a vida do adversário, Sonny Liston, nas semanas que antecederam a luta. Chegou até mesmo a levar um ônibus com auto-falantes até a sua casa, durante a madrugada, para perturbar o sono de Liston gritando escandalosamente que seu rival era feio e medroso, e que o título seria uma barbada. Obviamente que todos os jornais e redes de TV foram previamente avisados da invasão de privacidade. A conjunção natal entre a Lua, Mercúrio e Vênus em Aquário entre as casas VI e VII, que por sua vez estabelece uma quadratura para Saturno-Urano na X traduz a forma como Clay encarava seus rivais: provocações, barracos, desacatos, humilhações. Clay parecia não possuir controle. Mas tinha muito faro para se auto-promover. Em certos momentos, é difícil saber onde termina a pessoa e começa o personagem [Capricórnio, Leão, stellium em Aquário e Saturno-Urano na X]. De qualquer maneira, o stellium em Aquário diz muito da tática de intimidação como recurso para começar a vencer as lutas antes mesmo delas começarem, Já que Clay os preferia possessos.
Entre a primeira luta como profissional, em 1960, e a luta com Sonny Liston, em 25.02.1964, o boxeador de 22 anos estabeleceu o recorde de 19 vitórias e nenhuma derrota, sendo 15 delas por nocaute. Nesta época, Cassius Clay tornou-se famoso ainda por prever corretamente em qual round ele venceria seus oponentes. Posteriormente, confessou que copiou a “prática” de um lutador de wrestling (Vale Tudo) que tinha milhares de fãs.
Mas o combate de sua vida ainda teria outros ingredientes. Na semana que antecedeu a luta em Miami Beach, o líder Malcolm X foi visto na cidade criando enorme rebuliço no país sobre um possível vínculo entre Clay, X e o grupo Nação do Islã. Na antevéspera Malcolm X sumiu da cidade, dando a entender que não assistiria a luta, mas apareceu subitamente no ginásio minutos antes de Clay entrar no ringue para desafiar Liston.
Cassius Clay nocauteou Sonny Liston no sétimo assalto, tornando-se enfim campeão mundial de pesos pesados. Ao vencer, eufórico, gritou a frase que se tornaria sua alcunha: “Sou o maior de todos”. No dia seguinte após a luta, revelou à nação que era membro do Nação do Islã, também chamada de “Negros Muçulmanos”.
Além de assumir que era membro da organização, Clay declararia ainda que o grupo havia dado a ele o nome de “Cassius X”, posto que o sobrenome “Clay” era um símbolo da escravidão de seus ancestrais. Dias depois, em 06.03.1964, Malcolm X, ministro e porta-voz do Nação do Islã, levou-o para uma visita ao prédio das Nações Unidas e reiterou que o pugilista receberia o “X” de seu nome. Na mesma noite porém, Elijah Muhammad, líder espiritual do grupo (“o mensageiro”), gravou uma entrevista para uma rádio dizendo que o nome que Cassius Clay passaria a usar seria Muhammad (“glorioso”) Ali (“o quarto califa”).
No início poucos jornalistas levaram o novo nome a sério, mas os repórteres britânicos e o veterano boxeador Don Dunphy passaram a chamá-lo assim. A adoção do novo nome representou uma nova identidade, forjada no fato de ser um membro da “Nação do Islã” e comprometida com a emancipação da comunidade negra norte-americana.
A relação entre Muhammad Ali e Malcolm X é importante porque toca no cerne da questão envolvendo a militância do pugilista. Netuno de Malcolm está em conjunção exata com o Ascendente de Ali, demonstrando não apenas a influência religiosa sobre o boxeador [Malcolm era ministro do “Nação”], mas a presença sua presença na conquista do título e ao seu lado no anúncio da conversão e da primeira mudança de nome. Como está junto ao Ascendente, Netuno de Malcolm está em oposição ao stellium em Aquário, e o líder representava um de seus mentores espirituais na busca da emancipação frente aos conflitos com a “sociedade branca”.
O Sol de Malcolm, em Touro, fazia conjunção estreita com Urano de Ali, estimulando a conversão e a militância. Um trígono estreito entre o Sol de Malcolm com Sol de Ali gerava sintonia pessoal, havendo inclusive intimidade familiar. Outro trígono muito preciso entre o Sol de Malcolm e Netuno de Ali reforçam a conexão espiritual. Júpiter de Malcolm aplica conjunção ao Sol do boxeador, favorecendo a ascendência religiosa e política sobre ele através do ensinamento de certos dogmas e preceitos. O mesmo Júpiter forma trígonos com Saturno-Urano do pugilista, estimulando sua atuação política. Urano de Malcom X estabelecia uma oposição a Netuno de Muhammad Ali, politizando as inclinações espirituais do novo campeão mundial.
Saturno de Malcom X, em conjunção com o FC de Ali, representa a cobrança sobre o compromisso com sua etnia e o passado [Islã]. Lua e Mercúrio de Malcolm forma conjunção com Marte do nosso biografado [com aquele último, exata], assinalando uma influência intelectual [Mercúrio] carregada de um sentimento étnico [Lua] sobre a canalização de sua indignação e sobre a carreira de boxeador [Marte].
No retorno solar do ainda Cassius Clay, em janeiro de 1964, Marte em Aquário estava em conjunção com o Sol, em oposição exata a Plutão, e também fazia uma quadratura estreita com Marte, ativando sua Quadratura T natal. Assim como no dia de seu alistamente, novamente uma oposição exata entre Marte e Plutão. Este quadro sintetiza o que eram aqueles tempos: o pugilista de Louisville chegava ao topo da carreira ao se tornar campeão profissional de pesos-pesados [Marte] e revelava sua militância política [Aquário]. Plutão, na revolução solar, estava em conjunção ao MC e ambos incidiam sobre o Nodo Norte natal. Naquele ano, ou melhor, poucas semanas depois de seu aniversário, o agora Muhammad Ali era coroado o maior boxeador do mundo e trocava de identidade. O Ascendente do retorno solar daquele ano caía sobre sua casa IV. Clay buscava através da afirmação de sua etnia [casa IV] a emanicipação dos negors na sociedade norte-americana[Sagitário]. A quadratura envolvendo Saturno na casa VII e Netuno e o Ascendente na casa IV revela as tensões inerentes à sua posição em defesa da sua “raça” [casa IV] e o resto da sociedade norte-americana, majoritariamente “branca” [casa VII]. A partir de então, Muhammad Ali influenciaria decisivamente não apenas a sociedade dos EUA na luta pelos direitos civis, mas a própria ascensão dos negros numa década notoriamente conhecida pelo confronto político e comportamental.
Diante da hipocrisia da democracia norte-americana em relação aos negros, Ali rapidamente tornou-se um personagem polêmico e controverso, além de extremamente popular e sem papas na língua. Afinal, ele possui Lua, Mercúrio e Vênus numa conjunção em Aquário.
Oscilando entre a luta pelos direitos civis e o próprio separatismo, Ali, Malcom X, Elijah Muhammad e o Nação do Islã passaram a ser vistos com suspeição cada vez maior pelo status quo e segmentos da sociedade local. Ali provocava deliberadamente situações de conflito, como quando afirmou: “Seguimos os ensinamentos do líder Elijah Muhammad e não queremos ser forçados à integração. A integração é errônea. Não queremos conviver com os brancos, isso é tudo”. Sobre casamentos inter-raciais disse que “nenhum negro ou negra inteligente, de acordo com a sua consciência, gostaria de ver garotas e rapazes brancos indo a seus lares para se casarem com seus filhos e filhas negros”. Ademais, seu grupo via o homem branco como sendo o “diabo” e “desonesto”. Ali acusava os brancos de odiarem os negros. O campeão migrara, em pouquíssimo tempo, para o centro do rodamoinho da questão racial nos EUA.
No mapa natal de Muhammad Ali fica evidente a importância de sua Quadratura T entre o Ascendente Leão, Vênus em Aquário e a conjunção Saturno-Urano em Touro para entender a síntese de sua controvertida e conflituosa trajetória. O Ascendente Leão indica um indivíduo orgulhoso e cônscio de seu valor, mas com um sentimento de “diferença” em relação ao convívio com a hegemonia branca [Vênus em Aquário na cúspide da casa VII] e sabedor do papel especial que ele mesmo e sua geração tinham de exercer para reverter e transformar a condição da população negra [Saturno-Urano na casa X]. Desta forma ele colaborava para, junto aos nascidos em 1942 [Saturno-Urano, uma geração que viraria o mundo de cabeça para baixo], criar um ambiente “revolucionário” segundo a sua perspectiva pessoal.
Pois bem: na noite em que chegou ao posto máximo do boxe, a Lua estava sobre seu Ascendente [e em conjunção a Netuno de Malcolm X], aplicando trígonos para uma conjunção Vênus-Marte em Áries na casa IX. Uma ênfase do Elemento Fogo nas casas I e IX coroa-o o “melhor” do “mundo”. A Lua fazia ainda uma oposição a Mercúrio e Saturno na casa VII, insinuando que o “controle do palco” [Lua em Leão] durante a preparação e a desarticulou e gelou seu oponente [Mercúrio-Saturno na VII]. A configuração fechava a Quadratura T com Saturno e Urano natais. Sol e Marte ainda estavam em conjunção [veja retorno em 1964], agora numa oposição com Urano em Virgem. Para que imaginava que Cassius Clay era apenas um grande e abusado boxeador, o circo apenas começava a pegar fogo.
No dia seguinte, quando revelou que passaria a se chamar Cassius X, a Lua em Leão intensificava a quadratura com Saturno-Urano natal. Com a oposição entre a Lua e a conjunção Mercúrio-Saturno na casa VII ocorria o mesmo. Saturno em quadratura exata com Urano natal. Cassius Clay dava outro golpe, tão importante quanto o título.
Na visita com Malcolm X à sede da ONU dias depois do título (06.03.1964), uma oposição exata entre Marte e Plutão estava sobre seu eixo nodal. Vemos que este é um aspecto recorrente em eventos marcantes de sua vida. Ao final, a briga de Ali não era apenas para ser o maior do mundo, mas envolvia a própria sociedade norte-americana.
Para termos a dimensão do que vivia Muhammad Ali naqueles dias e quais seriam as conseqüências de sua atitude, basta checar sua progressão lunar para a noite em que se tornaria campeão mundial dos pesos pesados, revelando no dia seguinte troca de nome: o MC progredido aplicava uma sextilha a Plutão e a Parte da Fortuna natais [grande sucesso e mudança de identidade notoriamente voltada para fins políticos], a Lua progredida estava em oposição a Urano natal, na casa IV [o vínculo étnico e a opção pela militância, numa atitude de rebeldia e inconformismo com a situação dos negros nos EUA] e, o que não é menos importante, o Sol estava sobre a cúspide da casa VII e em conjunção com Vênus natal [Ali conseguia atingir o maior objetivo de sua vida, comprava a briga com os brancos opressores e se sentia em condições de enfrentar qualquer adversário]. Nos meses seguintes, o Sol progredido iniciaria quadratura com Saturno natal [o pugilista afrontava o status quo e passaria a sofrer fortes retaliações dele].
Contudo, o próprio movimento negro nos Estados Unidos dava mostras de divisão: se no início Cassius tornou-se “X” (Malcolm), dias depois virou “Muhammad” (Elijah). Entre novembro de 1963, após declarações de frieza quanto à morte de John Kennedy até março de 1964, quando notificou publicamente seu desligamento da entidade, Malcolm passou por um longo processo de “fritura”. Vê-se, então, que a declaração de Cassius Clay como membro do Nação do Islã e a dupla mudança de nome ocorrem nas duas semanas que antecederam a saída de Malcolm (08.03.1964). Muhammad Ali tomaria então partido da organização, afastando-se de Malcolm, que viria a morrer assassinado menos de um ano depois.
O Primeiro Casamento
Meses depois ser alavancado para a fama com o título e a conversão, Muhammad Ali se casou com Sonji Roi em 14.08.1964. Sonji era uma moça que servia drinques num bar, e ambos se casaram apenas um mês depois de se conhecerem.
Uma conjunção entre Vênus, Marte e o Nodo Norte em Câncer aplicava trígonos para Saturno em sua casa VII. Ainda que Saturno talvez indicasse a vontade de se comprometer seriamente numa união marital, a conjunção Vênus-Marte-Nodo Norte insinua a decisão precipitada. Júpiter, dispositor da casa V, estava sobre a conjunção Saturno-Urano [mais próximo a Urano que de Saturno] revelando a “paixão fulminante” que também pode ser corroborada pela conjunção entre Lua e Netuno na casa IV no dia de seu casamento. Trânsitos na casa X costumam indicar assuntos relativos às uniões civis. Finalmente, o Sol encontrava-se sobre o Ascendente, sugerindo uma perspectiva pessoal muito “autocentrada” ao ingressar na união. Pouco tempo depois isto ficaria evidente e veremos o porquê. Em sua progressão lunar, Mercúrio estava retrógrado na casa VII e Vênus também fazia o movimento aparente.
Como podemos observar, o ano de 1964 é um marco na trajetória biográfica de Ali por vários motivos, que busquei correlacionar aos trânsitos e progressões apontados acima. A magnitude desses eventos pessoais pode ser sintetizada pelo impacto da chegada de Plutão ao Nodo Norte natal.
Contudo, no início de 1966, Ali iria se divorciar de Sonji Roi pelas objeções dela aos costumes islâmicos tais como a severa observância aos trajes femininos. Ficção ou realidade, num (bom) filme rodado dez anos depois sobre sua vida, em que o próprio Ali estrelou [Capricórnio, Leão, stellium em Aquário], há uma cena em que ele a agarra numa festa doméstica com muitos convidados e a carrega escadas acima, obrigando-a, no quarto, a abaixar a curta saia que usava até os joelhos, rasgando sua roupa e deixando a esposa seminua, que desceu correndo as escadas, passando por todos os convidados e deixando a casa. Com ou sem moral islâmica, Ali é muito ciumento [Ascendente Leão, Quadratura T Sol-Marte-Plutão]. Definitivamente, uma pessoa muito difícil de se lidar.
Paralelamente ao divórcio, o exército reconsiderou o exame que Ali havia feito seis anos antes, reclassificando-o como apto para lutar no Vietnã, um claro sinal de retaliação política ao pugilista cada vez mais envolvido com o movimento pelos direitos civis e a propagando do Islã.
Ali, em seguida, recusou-se a entrar para o exército, alegando que a guerra era incompatível com o Qur’an Sagrado e suas convicções religiosas. “Não estou fugindo do barco. Não lutaremos em guerra alguma a não ser aquelas declaradas por Alá ou pelo Mensageiro (Elijah Muhammad). Não participamos de guerras cristãs ou guerras de infiéis. Não vou lutar contra o Vietcongue. Eles nunca me chamaram de crioulo. Os brancos, ao contrário, sempre agrediram a mim e a minha gente”.
Voltando ao divórcio: se Muhammad Ali se casou sob uma conjunção entre Vênus e Marte em Câncer, ele se divorciou com outra conjunção entre os dois planetas, então em Aquário e sobre sua conjunção Lua-Mercúrio natal que, como vimos, está associada a conflitos em sua vida pública e pessoal.
O retorno solar de Ali em 1966 é uma importante fonte de análises para seu divórcio e a negativa em lutar no Vietnã, até porque estes foram eventos que ocorreram muito próximos ao seu aniversário daquele ano. O Ascendente estava junto a Júpiter, colocando em primeiro plano o direito à liberdade de escolha na questão da guerra e o divórcio por incompatibilidade religiosa. Ali afirmava sua “independência”. Saturno e o MC pairavam sobre o Nodo Sul, estabelecendo uma oposição com a conjunção entre Urano e Plutão em Virgem, símbolo de uma época de radicalizações políticas e comportamentais. Se por um lado a conjunção Urano-Plutão aplicava trígonos para o MC e Saturno-Urano natais, indicando sua impetuosidade em projetar-se como um líder militante visando ora os direitos civis ora o separatismo, por outro criava uma forte represália do status quo [oposição de Saturno em Peixes]. A Lua em Sagitário fechava a Quadratura T com Saturno, Urano e Plutão e Marte estava exatamente sobre Vênus e a cúspide da casa VII, aumentando a pressão exercida e sofrida pelo homem que se tornava uma das lideranças mais amadas e odiadas dos EUA. Começava o maior de todos os combates.
Já a progressão secundária do início de 1966 mostra o Sol em quadratura com Saturno natal, refletindo um período de dificuldades pessoais, caracterizadas pela problemática da convocação ao Vietnã [Saturno na casa X, “cumprimento do dever”].
Note que as questões civis relativas ao casamento também envolvem a casa X, onde está Saturno. O Sol progredido, por sua vez, estava na casa VII. Na verdade, Ali sempre teve envolvimentos extra-conjugais, chegando a ter dois filhos fora de seus casamentos. Mercúrio retrógrado estava sobre a cúspide da casa VII.
José A. Baptista diz
Puxa, com essa matéria o Dimitri está com a metade de um livro pronto, basta analisar mais três ou quatro personalidade de outras atividades esportivas – futebol, Pelé; automobilismo, Ayrton Senna; e outros dois a critério de Dimitri – que o material para o livro estará pronto para ir para a editora. Parabéns pela matéria, uma Wikipédia quase astrológica sobre o fenômeno Cassius Clay – que até cegos adoravam assisti-lo.