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Um olhar brasileiro em Astrologia
 Edição 77 :: Novembro/2004 :: -

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A DESCOBERTA DO MEIO DO CÉU

 


A Persona Social e a Realização no Mundo

Este artigo contém parte de um dos eventos organizados pela Escola Rio Constelar, que ocorreu no Espaço Saúde, no bairro de Laranjeiras, Rio de Janeiro. O texto faz referência à palestra A auto-estima está no Meio do Céu, proferida pelo astrólogo Carlos Hollanda. Entre os palestrantes estavam Fernando Fernandes, Roseane Debatin, Alexey Dodsworth, Angela Schnoor e Vanessa Tuleski. Todas as palestras contavam com a gratificante participação do público através de exercícios práticos com os mapas natais ali presentes e com exemplos conhecidos de todos.

Costuma-se negligenciar o Meio do Céu como elemento definidor da personalidade e do comportamento. A ênfase da leitura astrológica para muitos intérpretes se concentra no Sol, na Lua e no Ascendente, secundarizando o Meio do Céu, situando-o como uma das cúspides das demais casas astrológicas, algo de peso menor em relação à tríade supramencionada.

Coisa bem comum, tanto nas leituras corriqueiras quanto nos textos difundidos em livros e pela Internet, é a afirmação de que o Meio do Céu está relacionado à carreira. Nisso, inclui-se a profissão, a vocação, a realização, sendo esta última uma referência a conquistas freqüentemente materiais derivadas do status, da posição ocupada numa empresa ou da respeitabilidade que se obtém por algum título honorífico. Todas essas acepções são, sim, corretas. Convém lembrar, no entanto, que status não significa apenas uma posição elevada na escala social ou algo que dê a idéia de honra e prestígio. Status, que quer dizer literalmente "estado", vem das antigas sociedades rigidamente estratificadas, cuja visão de um universo ordenado ("por Deus") indicava a cada coisa e a cada pessoa um lugar específico, intransferível e imóvel.

Embora desde a Antigüidade tenhamos indícios de diversas sociedades onde não havia mobilidade social (se alguém nascia camponês, morria camponês, fizesse o que fizesse), o termo latino "status" ganhou sentido na Europa medieval, com a sociedade de ordens. Cada ordem, um "estado". Isso dividia as pessoas em primeiro, segundo e terceiro estados. O primeiro, o clero, o segundo, a nobreza, e o terceiro, o "resto", que comprendia desde camponeses a pequenos comerciantes, passando por andarilhos, mendigos e tudo o que não pudesse ser classificado dentro dos dois primeiros estados. As distinções dos estados e a estratificação social passava também pelo uso de roupas, cores, gestos, modos de falar, além de outras regras proibitivas à força por um lado ou, por outro, impeditivas pelos sinais característicos de cada ordem, que inviabilizavam ou dificultavam sobremaneira a um camponês tentar se fazer passar por um nobre ou por um clérigo. Para se ter uma idéia, quando alguém, atualmente, quer humilhar outra pessoa ou tenta discipliná-la para que se encaixe numa ordem que considera mais "justa" do ponto de vista do mérito ou do direito de nascença, normalmente usa a conhecida frase "ponha-se no seu lugar". A raiz dessa frase tão comumente utilizada em momentos de irritação de alguém que se julga superior a outrem está também na sociedade medieval e ainda permaneceu nos séculos XVI, XVII e por aí afora. Não é de espantar que no Brasil isso seja comum, afinal herdamos dos portugueses, europeus, portanto, diversos hábitos que permaneceram desde o medievo.

A frase, que para nós, hoje, é conotativa, anteriormente era denotativa, quer dizer, era uma afirmação literal, especialmente quando pensamos na divisão feita dentro das igrejas, onde havia o lugar do nobre, do prestigiado e o do "resto", isto é, do terceiro estado. Aquele que pertencia ao "resto", se estivesse sentado num local da igreja reservado àqueles que tinham prerrogativas, era passível de receber a reprimenda: "ponha-se no seu lugar!". E lá ia o sujeito sentar-se no lugar que lhe competia, que era o que ele deveria ocupar consoante seu "status".

Do que estamos falando, afinal, de Meio do Céu ou de história e sociologia? Podemos dizer que uma compreensão mais aguda das funções do Meio do Céu no mapa e o que ele representa em nossas psiques individuais só pode ser obtida se conjugarmos esse conhecimento histórico-cultural com o astrológico. Tudo o que foi dito acima retrata a tendência de os grupos humanos subdividirem-se em lugares exclusivos na sociedade. É o que se chama "lugar social", e o Meio do Céu é, no mapa astrológico, um dos mais coerentes indicadores do modo como procedemos para sermos enquadrados num determinado lugar, numa classificação que os outros nos dão, diferenciando-nos dos demais por um título, por um apelido carinhoso ou por uma classificação pejorativa.

É certo que hoje em dia temos uma mobilidade social. Em outras palavras, um operário pode tornar-se presidente ou um camelô pode vir a se transformar num rico empresário do mundo da mídia (apesar de essa mobilidade não ser tão ideal quanto parece ser ao vermos esses casos especiais - a maioria das pessoas não tem o conjunto de oportunidades que favoreceram a ascensão daqueles indivíduos, sejam elas oriundas de um contexto histórico, sejam da possibilidade de desenvolverem suas expectativas). De qualquer jeito, mesmo com a mobilidade que atualmente acreditamos ter, esses indivíduos que ascenderam têm um lugar social, eles ocupam uma posição na qual podem ser reconhecidos e rotulados de forma a dar à sociedade a noção de que existe uma ordem, uma regra a ser seguida e níveis hierárquicos a serem respeitados. Essas posições indicam aos outros quem nós somos. Aquilo que fazemos fala muito a respeito daquilo que realmente somos, mesmo que todo um verniz de convivência em sociedade pareça ocultar nossa essência.

O Epíteto

Ao indicar não apenas a vida profissional, mas a forma como nos enquadramos na sociedade e aquilo que nos tornamos internamente ao fazê-lo, o Meio do Céu indica também o epíteto que somos passíveis de receber por desempenharmos nossas funções na sociedade. "Mas isso não é o mesmo que falar da profissão?" - logo alguém pode perguntar. Na verdade não. "Desempenhar nossa função", muitas vezes não é algo com o que trabalhamos. Na maior parte dos casos é cumprir expectativas de terceiros. Assim, o autor deste artigo não é apenas Carlos Hollanda, mas "o astrólogo" Carlos Hollanda. Reparem que junto com o nome vem o epíteto: "o astrólogo". Assim também temos; Zé das Couves, o segurança de banco; Dom Manuel, o Venturoso e assim por diante. Ora, e o que é um epíteto senão um nome ou uma frase que qualifica uma pessoa? Reparem bem no termo: "qualifica". No caso de uma sociedade isso é o mesmo que enquadrar essa pessoa, rotulá-la, dar a ela um lugar social, um meio através do qual ela possa encaixar-se no sistema e por ele ser reconhecida e aceita, o que implica não ser rejeitada. Não rejeitada ao menos em teoria. Como? Pode-se receber um epíteto depreciativo, como "Fulano, o gosma", mas ainda assim, tem-se uma identificação do sujeito pelo rótulo e isso o torna menos ameaçador para os demais, algo conhecido, cujos limites estão socialmente estabelecidos: "ele é um 'gosma', portanto afaste-se dele para não ficar 'infectado com sua gosmice". A sociedade busca, com isso, manter a estabilidade, e o indivíduo com o epíteto depreciativo representa o que não fazer ou como não obter a estima pública. Ele, portanto, tem um lugar social importante, embora nada confortável e completamente desprestigiado.

O Meio do Céu também identifica o processo de amadurecimento pela dissociação do indivíduo consigo mesmo. É representativo da mudança gradual que faz com que sejam levados ao centro das ações individuais os interesses de terceiros acima dos próprios. Isso se consolida na casa 11, a casa dos ideais, da fraternidade (seria melhor dizer "fraternidades", agrupamentos por afinidade ideológica, como partidos políticos ou aquelas que selecionam seus membros impedindo a entrada de quem não está de acordo com o modelo de conduta adotado). Mas é na casa 10, a casa subseqüente ao Meio do Céu, que encontramos nossa persona-símbolo no mundo. É ali que, num nível maior de integração entre o aspecto individual e o coletivo, tornamos nossa individualidade semelhante a um arquétipo. Muitas vezes, agimos, sem imaginar que o fazemos, como tal, pois assumimos, pelo amadurecimento de nossos anseios, a imagem que o público projeta sobre o indivíduo. É ali que, ao alcançarmos a individualidade integral, tornamo-nos, tal qual afirma Jung, o mais geral de todos os seres, alguém que se torna símbolo vivo numa cultura e época despertando a identificação dos demais com a imagem ideal, realizada na parte mais alta do céu no momento do nascimento. E quem disse que o que é ideal só se encontra nas casas 11 e 12? A casa 10 e o Meio do Céu indicam, em casos de um alto nível de dedicação e esforço, o assumir de uma condição ideal perante as expectativas dos demais. É, ao mesmo tempo, uma forma de emergir do público, destacando-se, tal qual afirma a oposição do eixo das casas 4 e 10 do mapa astrológico individual, e uma maneira de representar o público em suas mais altas aspirações. É ser e não ser ao mesmo tempo. Complexo? Paradoxal?

Ascendente x Meio do Céu



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