Uma menina criada em Curitiba revelou há algum tempo, quando não contava mais do que cinco anos, sua versão pessoal da criação do mundo. A história era mais ou menos a seguinte:
“Antes não tinha nada. Aí Deus fez Curitiba e botou o Greca pra ser prefeito (Rafael Greca, ex-prefeito da cidade). Então, o Greca criou as ruas para as pessoas andarem, e as plantas para as pessoas comerem, a praia de Caiobá para os curitibanos tomarem sol no verão, o resto do Brasil para Curitiba ficar no chão e o dólar para os curitibanos comprarem coisas no Paraguai.”
Para uma criança de cinco anos — assim como para qualquer povo dito “primitivo” — parece muito natural que seu local de origem seja o lugar mais importante do mundo e que um herói mítico e igualmente local tenha sido investido de algum poder divino para criar todas as coisas. Esta concepção do indivíduo como centro do universo também está presente no Local Space. Todas as linhas de força cruzam-se exatamente sobre nossas cabeças, e ali está o núcleo da esfera celeste; e os limites do mundo conhecido estão no horizonte visível, aquele que forma um vasto círculo de 360 graus em torno de nós, marcando o encontro do Céu e da Terra.
Como localizar cada planeta? Simplesmente traçando uma linha que, partindo do centro da esfera celeste visível, corte o planeta em questão e estenda-se até o grande círculo do horizonte. O que temos, ao assim proceder, não é apenas a localização estática de um lugar no espaço, mas o traçado de uma linha planetária que estabelece uma direção referenciada aos pontos cardeais. Esta linha pode ser prolongada para além do horizonte visível, estender-se por campos e cidades e cruzar oceanos, até dar a volta em torno da Terra e retornar ao ponto de partida.
Local Space, ou Horizonte Local, é uma técnica que vem alcançando crescente difusão nos Estados Unidos desde a década de setenta. Apresentado como um desenvolvimento recente da Astrologia, o mapa Local Space é na verdade a maneira mais arcaica e mais intuitiva de representar o céu.
Uma das primeiras noções que todos os povos antigos desenvolveram foi a da localização com base na trajetória aparente do Sol e da Lua, do nascente ao poente. Da observação do movimento dos dois grandes luzeiros, surgiu o conceito dos pontos cardeais, e é exatamente com base neles que o mapa Local Space se estrutura.
Para entendê-lo melhor, coloquemo-nos por instantes na pele de um índio norte-americano da época pré-colombiana, ou de um nativo das Ilhas Britânicas, muitos séculos antes da chegada dos romanos. Se observarmos o céu à noite, o que vemos? Grupos de pontos luminosos que parecem formar desenhos fixos e deslocar-se sempre em bloco pela abóbada celeste (as constelações) e outros pontos luminosos — os planetas — que, ao contrário das estrelas, parecem deslocar-se com maior liberdade e de acordo com uma velocidade própria, o que os coloca ora contra o pano de fundo de uma constelação, ora de outra.
É claro que estes corpos celestes diferentes dos demais irão chamar nossa atenção e levar-nos a algum esforço para tentar descrever sua posição a cada dia. Para isso, será necessário que encontremos uma estrutura de referência fixa. As alternativas são duas: as constelações que ocupam a faixa do céu por onde transitam os planetas (uma referência celeste) ou o próprio horizonte que nos cerca, com seus vários acidentes topográficos (uma referência terrestre).
A primeira alternativa nos conduzirá aos poucos a elaborar as noções de zodíaco, de eclíptica e, num desenvolvimento posterior, de signo — entendido como uma divisão racional da esfera celeste em arcos de trinta graus ao longo da eclíptica. Foi este o caminho que levou à crescente complexidade da Astrologia ocidental, como hoje a conhecemos. Já a segunda forma de localizar a posição dos corpos celestes é muito semelhante à da dona de casa que, ao chegar à janela do apartamento, diz ao marido que “a lua acabou de aparecer atrás da torre da igreja da praça”. É o caminho natural para a concepção do Local Space.
O princípio básico da teoria do Local Space é que todos os locais da Terra cruzados por uma determinada linha planetária terão a natureza e ativarão experiências típicas do planeta envolvido . É como se uma pessoa tivesse, sob seus pés, o entroncamento de dez diferentes estradas, que se espalham em várias direções.
Se ela andar na direção da Linha de Saturno, encontrará experiências saturninas: responsabilidades, obrigações, restrições e possibilidade de crescer profissionalmente pelo próprio esforço e disciplina. Já na direção da linha de Vênus, estarão algumas experiências realmente agradáveis, ligadas ao lazer, à experiência estética e a assuntos afetivos. A linha de Júpiter, por sua vez, é uma boa pedida para encontrar abertura de oportunidades, reconhecimento e sucesso material.
Alterando o significado astrológico da vizinhança
Cada pessoa tem seu próprio mapa Local Space. O traço mais notável deste mapa é que ele representa uma estrutura de direções permanentes, que carregamos conosco toda vez que mudamos de bairro ou de cidade. O que se altera, no caso, é apenas o ponto de referência para o traçado das linhas planetárias.
O mapa Local Space é, portanto, um poderoso auxiliar para compreendermos nossa relação com o espaço geográfico. Com ele, entendemos por que uma mudança de residência costuma provocar reflexos em todos os setores de nossa vida. De posse de um mapa Local Space temos uma noção imediata de onde podemos encontrar experiências confusas ou decepcionantes (linha de Netuno) ou até mesmo invadir territórios “proibidos” e ter encontros desagradáveis com gente do submundo (linha de Plutão).
A carta Local Space é muito útil também para a definição das funções de cada cômodo da casa. De posse da planta do imóvel, podemos colocá-la sobre uma mesa e alinhá-la com os quatro pontos cardeais, com ajuda de uma bússola. Depois, colocamos sobre a planta nosso mapa Local Space, impresso numa transparência, de forma que o centro do mapa coincida com o centro da área construída.
As linhas planetárias indicarão o melhor uso a fazer de cada espaço. Por exemplo: telefones jamais devem estar sob a linha de Netuno, que não é compatível com equipamentos que visem à comunicação verbal (Mercúrio). Há pessoas que sofrem de insônia porque têm as linhas de Urano ou de Marte, ambas excitantes, passando diretamente sobre o local onde dormem. Uma simples rearrumação do quarto pode ter um efeito altamente salutar.
O uso do mapa Local Space não é difícil, mas exige um excelente conhecimento do simbolismo astrológico e pode apresentar problemas de grande complexidade quando temos de compatibilizar os mapas de várias pessoas vivendo na mesma casa. O mesmo cômodo pode estar — digamos — sob a linha de Vênus da esposa, estimulando o romantismo, e sob a linha de Saturno do marido, trazendo à tona preocupações de toda ordem. Por mais sensual que ela esteja, ele não consegue parar de pensar na declaração do imposto de renda que precisa entregar na semana que vem!
Da mesma forma como cada indivíduo tem um mapa Local Space, as cidades também têm o seu, indicando tendências gerais e coletivas de ocupação e destinação do espaço urbano. Analisar a carta Local Space de uma cidade é ver o simbolismo astrológico em pleno funcionamento. Não se trata, evidentemente, de influências, no sentido que os horóscopos de jornal costumam atribuir, já que não existem relações diretas de causa e efeito entre fenômenos cósmicos e eventos do cotidiano. O que há é um efeito de ressonância, como se o mapa astrológico da cidade representasse um molde simbólico e arquetípico que fosse preenchido instintivamente por seus habitantes.
O Local Space também serve para compreender a identidade de cidades e países: