Éris é um planeta anão gelado com um pequeno satélite, denominado Disnomia. A descoberta foi anunciada em 29 de julho de 2005 e aos poucos suas características, do ponto de vista astronômico, passaram a ser melhor conhecidas.
Éris tem uma órbita muito mais alongada do que a de outros planetas do sistema solar. Ao longo dos 557 anos que leva para completar uma volta em torno do Sol, cruza a órbita de Plutão durante um período, tornando-se temporariamente um planeta interior a Plutão.
Isto se deve à enorme diferença entre seu periélio (ponto de máxima aproximação do Sol) e seu afélio (ponto de máximo afastamento do Sol, que chegam, respectivamente, a 37,77 AU e a 97,56 AU (uma AU – sigla para Unidade Astronômica – corresponde à distância entre a Terra e o Sol).
Em comparação, Plutão, cuja órbita também é muito alongada, apresenta uma diferença entre periélio e afélio bem menor: 29 AU e 49 AU, respectivamente.
Éris tem também uma inclinação maior do que qualquer outro planeta com relação ao plano da eclíptica: nada menos do que 44 graus. Isto significa que este planeta anão não se desloca contra o pano de fundo das constelações zodiacais, apenas cruzando a eclíptica por cursos períodos ao longo de seu ciclo orbital.
Em comparação, Plutão, cuja órbita também é inclinada em relação à eclíptica, alcança uma latitude máxima de 17º43’.
Ao longo de sua órbita, Éris cruza regiões celestes muito distantes da faixa zodiacal, atravessando constelações como Perseu, Girafa, Ursa Maior, Cabeleira de Berenice, Hidra, Centauro, Grou e Pavão, entre outras. Basta dizer que, desde o início do século XVI, Éris cruzou a eclíptica em apenas dois momentos, durante seu trânsito pelos signos de Áries (latitude 0º provavelmente em 1516) e Libra (latitude 0º em 1715). Desde 1923 Éris se encontra novamente no signo de Áries, devendo cruzar a eclíptica nos próximos anos.
A eclíptica é a órbita aparente do Sol em torno da Terra, que tem como pano de fundo os 12 signos zodiacais. Se a entendermos como um símbolo de todas as experiências repertorizadas pela humanidade (representadas pelos signos), Éris, com sua inclinação anômala, pode indicar o desafio inédito: aquilo que é trazido da esfera bárbara (regiões não zodiacais) e que não faz parte ainda da experiência comum.
Na cultura grega, o mito de Éris apresenta-a exatamente como a divindade que, por ser considerada turbulenta, não é convidada para o Olimpo, ali irrompendo de surpresa durante a realização de uma festa para oferecer um presente enigmático: um pomo de ouro destinado de formal propositalmente vaga “à mais bela”. Esta declaração deixa Hera, Atena e Afrodite em polvorosa, iniciando-se aí um conflito que exige a interferência do próprio Zeus.
O senhor do Olimpo, evitando indispor-se com qualquer uma das contendoras, ordena a Hermes (Mercúrio) que as leve à Terra, onde o mais belo dos mortais terá a difícil incumbência de escolher quem deverá ficar com o pomo dourado.
Este mortal é Páris, na verdade um príncipe da família real de Troia, que vivia então como um pastor de ovelhas, exilado e ignorante de sua verdadeira condição. Instado por Hermes a decidir-se por uma dela, Páris é sucessivamente tentado pelas três deusas: Hera lhe promete poder e riquezas, Atena lhe oferece inteligência, capacidade estratégica e poder militar, enquanto Afrodite acena com a possibilidade de seduzir a mais linda das habitantes da Terra.
Páris decide por Afrodite, e a escolha se revela fatal para a Grécia: na sequência, Páris ganha o amor da linda Helena, esposa do rei Menelau, de Esparta. Ao fugir com ela para Troia, precipita uma feroz vingança do rei traído, que convoca uma guerra geral contra aquela cidade. Nos desdobramentos do conflito, tanto Páris quanto Helena perderão a vida de forma trágica.
Neste sentido, o mito do Julgamento de Páris coloca em questão uma série de temas que podem ser associados ao papel do planeta anão Éris:
- o sofrimento pelo desejo;
- o confronto entre o interesse pessoal e o da coletividade;
- a necessidade de ampliação de horizontes para uma decisão correta;
- as consequências trágicas de decisões e ações não inclusivas.
A escolha de Páris provoca sofrimento porque, além de não ter consciência de sua própria situação (era filho do rei Príamo de Troia, mas ainda não desconhecia este fato), o jovem pastor é levado a tomar uma decisão compulsória sem ter experiência suficiente para lidar com o novo cenário (ele agora está lidando com deusas, e não com mortais comuns).
Trata-se de uma ampliação brutal de responsabilidade, já que sua decisão em favor de Afrodite gera consequências que afetam um vasto contexto (por ser a causa indireta da Guerra de Troia).
Se considerarmos que o significado astrológico do planeta anão Éris guarda relação com o mito, podemos entender que Éris, tal como Plutão, é um indicador de situações-limite. A diferença é que, no caso de Éris, estas podem – e precisam – ser enfrentadas com planejamento, atenção para o ineditismo das novas situações e visão inclusiva – o que exige levar em conta as necessidades de todos e dialogar sempre.
Tanto Éris quanto Plutão simbolizam riscos letais. Contudo, enquanto Plutão é o processo impessoal de eliminação dos mais fracos (o princípio da seleção natural), Éris simboliza a seleção civilizatória, que depende do enfrentamento dos problemas pela ação coletiva, coordenada e inclusiva.
O planeta anão Éris foi descoberto, não por acaso, no momento em que a questão ambiental emergia de forma insofismável como o grande desafio da humanidade para as próximas décadas. O anúncio de Éris acontece sete meses depois do tsunami do Oceano Índico (dezembro/2004), e menos de um mês antes do furacão Katrina, em agosto de 2005, um dos mais destrutivos da História.
Ocorre também na mesma década em que têm lugar importantes conferências internacionais voltadas para o estabelecimento de metas de redução do aquecimento global e da poluição da atmosfera e dos oceanos.
O desafio ambiental, cujo enfrentamento exige das grandes potências mundiais a capacidade de dialogar intensivamente e tomar decisões “fora da caixinha”, é o julgamento de Páris de nossos tempos. A sincronidade entre a emergência desta temática e a descoberta de Éris permite que postulemos — com apoio, inclusive, no estudo de uma significativa quantidade de mapas nos últimos dezoito anos — que Éris é símbolo astrológico mais específico para o “pensar globalmente” de que tanto necessitamos.