Há alguns anos, uma conhecida instituição financeira patrocinou uma exposição em Curitiba sobre pessoas que, em suas respectivas áreas, deram contribuições significativas para a infância. Num grande mural, lá estavam trechos da obra de Monteiro Lobato, desenhos de personagens de Ziraldo, de Maurício de Sousa e outros que alegraram a vida de crianças brasileiras. Num cantinho, apenas um texto sucinto: uma medida de sal e três medidas de açúcar num copo de água limpa.
Quem lia apressadamente, não entendia porque a enigmática instrução compartilhava o mesmo espaço do Cebolinha e do Menino Maluquinho. Contudo, poucas contribuições para a infância tiveram tanto impacto quanto aquela. Era a receita do soro caseiro, e sua difusão contribuiu para salvar centenas de milhares de vidas nos últimos 35 anos. A responsável pela façanha foi a médica pediatra e sanitarista Zilda Arns Neumann, exemplo extremo de como um mapa natal bem vivido pode levar às mais altas realizações.
Zilda nasceu em Forquilhinha, Santa Catarina, em 25 de agosto de 1934. Não temos o horário exato, mas sua carta solar, calculada para o horário-padrão do meio-dia, mostra Sol e Mercúrio conjuntos no início de Virgem, em trígono com Urano em Touro. Era uma mulher inventiva (aspecto fluente de Urano) mas ao mesmo tempo prática, terráquea, capaz de encontrar aplicação objetiva para conceitos inovadores.
A ênfase em Virgem dava-lhe um perfil de prestadora de serviços. Com Netuno em Virgem oposto à Lua em Peixes, o sentido fica ainda mais claro: trata-se especificamente de serviço social, ação comunitária, voltada para os mais necessitados.
Em 1983, a pedido da CNBB, criou a Pastoral da Criança juntamente com Dom Geraldo Majella, que à época era arcebispo de Londrina. No mesmo ano, deu início à experiência a partir de um projeto-piloto em Florestópolis, Paraná. Após vinte e cinco anos, a pastoral já acompanhava 1.816.261 crianças menores de seis anos e 1.407.743 de famílias pobres em 4060 municípios brasileiros. Neste período, mais de 261.962 voluntários levaram solidariedade e conhecimento sobre saúde, nutrição, educação e cidadania para as comunidades mais pobres, criando condições para que elas se tornem protagonistas de sua própria transformação social.
Para multiplicar o saber e a solidariedade, foram criados três instrumentos, utilizados a cada mês:
- a visita domiciliar às famílias;
- Dia do Peso, também chamado Dia da Celebração da Vida;
- Reunião Mensal para Avaliação e Reflexão. (fonte: Wikipedia)
A nota característica da Pastoral da Terra foi a valorização do agente comunitário como formador de consciência, com papel essencial num programa de atenção à saúde. Na concepção de Zilda, pessoas originárias da própria comunidade podiam fazer a diferença no combate à mortalidade infantil, desde que devidamente treinados para reconhecer situações de risco e fornecer a orientação essencial.
A ideia, de tão simples, pareceu ameaçadora para as instituições médicas e para os grupos econômicos atuantes na área de saúde, porque — completa heresia — retirava poder do profissional especializado e valorizava o papel do voluntário leigo. Ainda mais grave: em vez de estimular programas oficiais para aquisição de medicamentos e suplementos alimentares, a Pastoral disseminava receitas caseiras, como a do soro e da multimistura.
Num sentido amplo, Zilda Arns realizou alguns ideais virginianos já presentes, em forma teórica, nas propostas ambientalistas e de economia alternativa elaboradas nos anos 60, quando Urano e Plutão transitaram em Virgem: “agir globalmente, pensar localmente” era uma delas; outra está consubstanciada no lema “o negócio é ser pequeno” (“small is beautiful”).
Virgem simboliza a ação prática em escala humana, em contraponto ao gigantismo jupiteriano de Sagitário. Aposta na perícia, no know-how, no treinamento operacional, onde o importante é aprender como fazer. Virgem, em resumo, é menos filosofia e mais resultado.
Dona Zilda Arns foi genial exatamente por expressar, em seu nível mais elevado, essas qualidades do signo mutável de Terra e colocá-las a serviço daqueles que mais precisavam delas.
A conjunção Marte-Plutão em Câncer expressa uma tremenda energia e capacidade de trabalho voltada para a proteção dos que precisavam ser nutridos (Pastoral da Criança) e amparados (Pastoral dos Idosos). Esta conjunção está em quadratura com Júpiter, planeta que simboliza os doutores, os legisladores, os magnatas — as pessoas respeitáveis, enfim.
Nos 25 anos em que esteve à frente da Pastoral da Criança, a Dra. Zilda Arns enfrentou muitas resistências e suspeitas vindas exatamente de quem deveria apoiar o programa, como organismos públicos, entidades representativas na área médica, laboratórios e universidades. O sentimento corporativo, sempre cioso de suas prerrogativas, demorou a digerir aquele projeto revolucionário, que dava à comunidade condições para cuidar de si mesma — e a um custo irrisório! Contudo, os resultados começaram a aparecer. A tenacidade canceriana da médica de Curitiba falou mais alto, e aos poucos o trabalho da Pastoral começou a virar referência para programas governamentais.
A ideia da Pastoral da Criança surgiu em Genebra, em 1982, quando James Grant, secretário executivo da Unicef, sugeriu ao cardeal Dom Paulo Evaristo Arns que a Igreja poderia contribuir para a redução da mortalidade infantil mediante um trabalho de prevenção da diarreia (infecções intestinais: um problema virginiano). Voltando ao Brasil, Dom Paulo apresentou o projeto a sua irmã Zilda, que não apenas aceitou o desafio como também acrescentou outras linhas de atuação, enfatizando a ação educacional e a participação da comunidade.
A configuração mais importante nos céus de 1982 foi a conjunção Saturno-Plutão em Libra, um aspecto que fala de situações extremas e de sua possibilidade de superação. Tensões Saturno-Plutão podem significar extremismo, racismo e terrorismo. Podem significar também o confronto com a miséria extrema e a recuperação espetacular. A Pastoral da Criança traz essa marca.
Saturno e Plutão, ao fazerem conjunção em 1982, ativaram por quadratura Plutão e Marte em Câncer de Zilda Arns. Naquele momento ela despertou para sua grande missão e entregou-se à causa de corpo e alma (o aspecto Saturno-Plutão-Marte também fala de dedicação total e absorvente).
Em 2010, Saturno e Plutão estavam novamente em aspecto tenso no céu, lembrando o início do processo. E foi em pleno terremoto do Haiti, sob os escombros de uma igreja (Saturno) desabada (Plutão), que Zilda Arns encerrou seu trabalho de missionária da saúde e da promoção social. Morreu de pé, e trabalhando. A melhor morte que uma heroína virginiana poderia desejar.