Este artigo faz parte de uma uma série de três, produzida por Dimitri Camiloto e publicada pela primeira vez em Constelar em 2007:
1 – Che Guevara, os primeiros anos
2 – Che Guevara, o mapa e o mito
3 – Os últimos anos de Che Guevara
1961: Che no Uruguai
Um aspecto muito importante envolvendo Che Guevara e a Revolução Cubana é que ele assumiu quase que exclusivamente as relações da ilha com o mundo exterior. Levando-se em conta que Júpiter [dispositor da casa IX] tem destaque em seu mapa natal e Saturno, radical na casa IX, transitava pela casa X, nota-se a frequência e o caráter crucial de suas viagens e negociações internacionais. Este fato terá íntimas consequências, por exemplo, sobre as relações com os Estados Unidos e a União Soviética.
Representando o governo cubano, Che Guevara visitou diversos países do Terceiro Mundo, constatando que o principal problema das nações subdesenvolvidas da África, Ásia e América Latina era a espoliação imperialista dos países desenvolvidos, sobretudo dos Estados Unidos.
Em 02.08.1961 Che viaja liderando a delegação cubana rumo à Punta del Este, no Uruguai, para participar da Conferência do Conselho Interamericano Econômico e Social. No aeroporto de Carrasco, milhares de pessoas receberam a delegação cantando slogans anti-yankees e aos gritos de “Viva a Revolução Cubana!”. No dia 8, Che intervém na quinta sessão plenária e fustiga a chamada “Aliança para o Progresso”, proposta pelos norte-americanos.
Neste dia, o Sol em trânsito formava um trígono com Saturno natal, na casa IX, indicando a importância de estar presente numa conferência continental representando a Revolução Cubana. Vênus estava sobre o Fundo do Céu, reforçando o seu sentimento de pan-americanismo num encontro daquele. A Lua aplicava conjunção a Plutão natal e Marte, um trígono para o Sol de Che. O Comandante estava, realmente, com a corda toda.
As quadraturas que Vênus radical recebia do Sol e de Mercúrio insinuam a postura dissidente em relação aos objetivos norte-americanos no encontro, com a proposta da Aliança para o Progresso, que visava reunir os países latino-americanos em torno da liderança dos EUA. Finalmente, uma conjunção entre Urano e o Nodo Norte estava sobre Netuno de Che, radicalizando as ambições de sua “missão” revolucionária. Esta conjunção aplicava quadraturas ao Sol e trígonos para Júpiter.
1961: três horas na Argentina
Dez dias depois, em 18.08.1961, Che visita a Argentina por apenas três horas, para um encontro com o presidente Frondizi, chegando a comer um bife na residência oficial. Ao motorista que o conduziu, perguntou como estavam seu time de rúgbi e o de futebol, o Rosário Central.
O avião aterrisou às 10:30AM. Dele só saiu Carrettoni. Os militares tiraram imediatamente suas luvas, saudaram-no, estenderam-lhe a mão e lhe disseram que o protegeriam com suas próprias vidas. “Não sou quem estão esperando – confessou Carrettoni – Mas são vocês que nos levarão a Olivos? Então, só um segundo”. Voltou ao avião e disse a Che: “Pode descer tranquilo”. Quando Guevara pisou em terra Argentina, viu dois marinheiros boquiabertos, tão paralisados com o assombro, que nem sequer notaram que suas luvas caíram na relva coberta pelo orvalho da noite anterior.
Por menos que Che Guevara tenha estado em sua pátria de origem, o momento merece considerações especiais. Ernesto voltava ao país tendo tido sucesso em suas ambições revolucionárias. Saturno [dispositor do Meio do Céu e radical na casa IX] aplicava um trígono para o Sol natal [1º16’ de órbita] o que também fazia Júpiter [ambos na casa X]. Ou seja, Che retornava praticamente como um chefe de estado, não era mais um anônimo, enfim, uma pessoa de poder.
A Parte da Fortuna acompanhava a ambos no feixe de trígonos. Por sua vez a situação era delicada, posto que Guevara era um agente de sublevação dos povos e visto com desconfiança em sua terra natal. O presidente Frondizi teve de fazer uma tensa negociação com a cúpula militar para que a visita fosse possível. Che só desceu do avião após saber que estaria tudo ok: tal contexto é simbolizado pelo trânsito de Marte [regente do Mapa de Che] pelo Descendente, em oposição à conjunção entre Marte, Urano e o Ascendente natais.
Che, em virtude do desenvolvimento do mito em torno de sua pessoa, que estava relacionado a seus ideais revolucionários e comunistas [Netuno na V], havia passado por um trânsito de Plutão sobre Netuno natal no passado e, agora, depois do encontro em Punta Del Este, tinha Sol, Urano, Mercúrio e o Nodo Norte sobre o mesmo. A amplitude do personagem que criou recaía sobre ele mesmo [stellium em Leão numa quadratura ao Sol natal]. Ter Che dentro de suas fronteiras era um perigo para qualquer ordem estabelecida.
O mesmo stellium em Leão formava trígonos com Júpiter natal, estimulando sua liderança e felicidade. Pelos seus valores pessoais, El Comandante retornava “grande” à Argentina. Vênus e o Meio do Céu do desembarque estavam em conjunção a Plutão natal na casa IV e a Lua [conjunta a Netuno] estabelecia trígonos com estas três coordenadas, o que dá a dimensão do tom de emoção e afeto nesta breve – mas impactante – visita ao país onde nascera. Finalmente, o Ascendente crava a cúspide de sua casa VIII: tratava-se de um misto de retorno ao passado com transformações radicais inegáveis.
A visita de Che ao Brasil em 1961
No périplo, Che esteve ainda no Brasil, sendo condecorado com a Ordem do Cruzeiro do Sul pelo Presidente Jânio Quadros.
“A posição adotada pelo Brasil foi, sem dúvida, o maior fator para que Cuba fosse tratada na Conferencia de Punta del Este como país americano” — afirmou nesta capital o ministro cubano “Che” Guevara, em entrevista que concedeu à imprensa. Acompanhado de uma comitiva de cinquenta pessoas, Guevara chegou às 23h30 de ontem [18.08.1961], procedente de Montevidéu e reencetou hoje, às 15 horas, a viagem de regresso a Havana, após ter mantido conferência com o presidente Jânio Quadros, que o condecorou com a “Grã Cruz da Ordem Nacional do Cruzeiro do Sul”. Depois da audiência com o sr. Jânio Quadros o líder revolucionário informou que se tratara de uma visita de cortesia, durante a qual manifestou ao presidente “o testemunho do agradecimento do governo cubano pela posição do Brasil em Punta del Este, além de apresentar as saudações pessoais do 1º ministro Fidel Castro” (Folha de S. Paulo, 19.08.1961).
Ostentando já a comenda, o ministro cubano agradeceu:
Sr. presidente: como revolucionário, estou profundamente honrado com esta distinção do governo e do povo brasileiros. Porém, não posso considerá-la nunca como uma condecoração pessoal, mas como uma condecoração ao povo e nossa revolução, e assim a comunicarei com as saudações desse povo que V.Exa. pessoalmente representa. E a transmitirei com todo desejo de estreitar as nossas relações (idem).
Durante a entrevista que concedeu após a cerimônia, Guevara disse que Cuba não subscreveu as decisões de Punta del Este porque “não poderia apoiar uma Aliança Para o Progresso, de que não participa”. Acentuou ainda que a declaração resultante da conferência “é ambígua quanto às necessidades dos países latino-americanos e quanto ao que se poderá fazer em seu benefício”. “Não obstante — prosseguiu — vimos com simpatia àquela reunião, pois, pela primeira vez, Cuba teve apoio para manter a sua posição de república americana. Antes estivemos sempre sós e de tal maneira agredidos, que só poderíamos reagir de maneira violenta.
Nesta conferência, a atitude do Brasil e também de outros países puderam evitar aquelas agressões pesadas e as tentativas de afastar Cuba do continente, mantendo-a isolada.” Che revelou a opinião de que a “Aliança Para o Progresso não resolverá nada”, uma vez que os Estados Unidos “tentam recuperar-se perante a América Latina”. Assinalou, contudo, “dois fatos novos animadores”: 1º) os EUA “reconhecem que há situações que é necessário enfrentar; e 2º) vários países falaram linguagem diferente da usual nesse tipo de conferência” (ibidem).
Elogiando a política exterior de nosso país que o sr. Paulo de Tarso apresentara como “característica de Brasília”, Guevara asseverou que o continente inteiro se estava beneficiando com ela. Ainda durante o almoço, o ministro formulou convite para que a Juventude Democrática Cristã visite Cuba. O convite foi aceito e os pormenores da viagem serão concluídos atraves de ofícios (ibidem).
Jânio Quadros havia intermediado, anteriormente, um pedido do Vaticano para que religiosos cubanos contrários ao novo regime não fossem fuzilados. Apesar de uma política interna relativamente tradicionalista, a política externa janista acirrou os ânimos da oposição ao seu governo, em especial a própria UDN da qual fazia parte e os setores militares.
Além de restabelecer relações diplomáticas com a URSS, Jânio aproximou-se da China e as condecorações a Che Guevara e ao cosmonauta Yuri Gagarin, além da visita de Fidel Castro (em princípio iniciativas que apenas visavam ampliar as relações comerciais com os países socialistas) desagradaram profundamente ao governo norte-americano e às elites conservadoras no Brasil.
O presidente brasileiro acabou renunciando menos de uma semana após Che deixar o Brasil, com o vice, João Goulart, estando em visita à China. Veio o golpe militar de 1964 e o ditador de plantão, Marechal Humberto Castello Branco, resolveu rever as condecorações do governo Jânio Quadros. Che Guevara foi “descondecorado” pelo governo militar brasileiro. Indiretamente, a visita de Che colaborou para que os militares solapassem, poucos anos depois, a democracia brasileira.
A Crise dos Mísseis
A crescente tensão com os Estados Unidos, após o bloqueio econômico, a exclusão de Cuba da Organização dos Estados Americanos e a invasão à Baía dos Porcos inserem-se dentro de uma lógica da Guerra Fria que levou à criação do Muro de Berlim, à Guerra do Vietnã e opunha frontalmente “comunistas” e “capitalistas”.
Como garantia de proteção a novas investidas norte-americanas contra a ilha, a URSS, em abril de 1962, tem a ideia de instalar mísseis nucleares em Cuba. O regime cubano tinha se aproximado da superpotência soviético, sendo que Che fora o principal “arquiteto” desta parceria. Várias conversações e visitas técnicas passaram a ser realizadas ao longo do ano quando, em 27 de agosto, Guevara finalmente viaja à URSS para selar o acordo que nuclearizaria a ilha.
Em 30.10.1962, Che encontra-se com Kruschev em sua residência de verão, na Crimeia. De início, a intenção de Che era tornar pública a instalação dos mísseis para evitar jogo duplo dos soviéticos, ao que Kruschev se opõe, exigindo que se mantivesse tudo em segredo.
É interessante observar que, depois de Urano ter um breve ingresso em Virgem entre novembro de 1961 e janeiro de 1962, é em meados de agosto que o trânsito se fará definitivo, iniciando uma aproximação cada vez mais intensa com Plutão, cuja conjunção terá enorme impacto na trajetória de Che Guevara. Ao garantir os mísseis em Cuba, Sol e Lua interpunham-se entre ambos os planetas, dando um caráter inaugural à conjunção aproximativa. Marte estava sobre o Fundo do Céu de Che, revelando a determinação em armar-se domesticamente, havendo ainda trígonos para Júpiter e Netuno em trânsito, e também para sua Lua natal.
Mercúrio, em oposição a Marte, Urano e Ascendente de Guevara, indicava o acordo nuclear com o grande aliado, do qual havia sido um dos principais entusiastas. Este último aspecto também reflete a intenção de Che em tornar tudo aquilo público e, em contrapartida, a própria negativa de Kruschev. Depois de selado o acordo, o mundo ficaria mais próximo do que nunca da 3ª Guerra Mundial.
Para a URSS, a instalação de mísseis nucleares em Cuba era uma resposta aos EUA, que haviam feito o mesmo na fronteira da Turquia com o seu território. Depois da fracassada incursão na Baía dos Porcos, os norte-americanos iniciaram uma série de sabotagens que desestabilizaram o governo cubano. Com os mísseis instalados a menos de 160 km do território dos EUA, Cuba tinha a certeza de que acabaria definitivamente com as hostilidades.
Porém, no dia seguinte ao encontro na Crimeia, a CIA, que já acompanhava regularmente os passos de Che, expediu um telegrama com desconfianças sobre o real motivo de sua visita à URSS, alegando que poderia ter outros fins além dos meramente econômicos. Para a CIA, o acompanhante de Che, Emilio Aragonés, não possuía experiência em assuntos econômicos ou industriais.
Em 6 de setembro, quando Che Guevara retorna a Havana, o aumento da presença militar soviética em Cuba já havia sido detectado. Dias antes, aviões U2 tinham detectado os pontos de instalação dos mísseis. No dia 9 de setembro, monitores da CIA registraram observações feitas por Che a um repórter, numa recepção da embaixada brasileira em Havana, de que “o mais recente programa de ajuda militar soviética era um acontecimento histórico que prenunciava uma inversão no relacionamento de poder entre o Leste e o Oeste”.
Na sua opinião, ele tinha alterado os pratos da balança em favor da União Soviética e “os Estados Unidos nada podem fazer a não ser cederem”. O telegrama da CIA seguia dizendo: “Ele parece achar que a ajuda militar soviética é um gesto da maior importância”.
Em outubro de 1962, com uma oposição entre Marte em Leão e Saturno em Aquário, ocorre a Crise dos Mísseis. Em 22 de outubro, às 19h, o presidente Kennedy fez um pronunciamento em cadeia nacional de TV, anunciando a descoberta e afirmando que um eventual ataque de Cuba a qualquer nação do hemisfério ocidental seria vista pelos EUA como uma ação impetrada pela União Soviética, o que levaria a uma retaliação imediata tanto contra Cuba como a URSS. Kennedy convocou 150 mil reservistas e impôs uma “quarentena naval” contra Cuba, para impedir preventivamente que qualquer suprimento militar pudesse chegar à ilha.
Em seguida, os EUA retiraram de Guantánamo todas as pessoas “não-essenciais” para o funcionamento da base e, ao redor do mundo, os militares do país foram colocados em alerta nuclear “3”. A OEA, por unanimidade, apoiou a quarentena à Cuba e 180 navios norte-americanos prepararam-se para o bloqueio naval. A URSS, todavia, declarou que a quarentena era ilegal e ordenou que seus navios furassem o bloqueio.
No dia 23 de outubro a URSS fez saber que revidaria a qualquer ataque norte-americano contra seus navios que se dirigissem a Cuba. O bloqueio teve início às 10:00AM de 24 de outubro. Naquele momento 19 navios soviéticos navegavam na direção de Cuba, sendo que 16 claramente deram meia-volta e apenas o tanker “Bucareste” continuou na direção da quarentena. Os outros dois, “Gagarin”e “Komiles”, foram depois descobertos a poucas milhas do bloqueio, sendo escoltados por um submarino soviético posicionado entre os dois. O grupamento USS Essex foi instruído a bloquear o avanço deste submarino e a usar “pequenos explosivos” caso fosse necessário. Às 10:25hs os dois navios soviéticos recuaram. Um oficial norte-americano chegou a dizer que “estávamos cara a cara, olho no olho, e eles piscaram”.
Foi quando os EUA buscaram uma solução diplomática, querendo que a URSS retirasse as armas nucleares de Cuba com a supervisão das Nações Unidas e que Fidel declarasse publicamente não receber outras armas no futuro. Em troca, os soviéticos pediram que os mísseis da Turquia também fossem retirados. O Brasil tomou parte nas negociações, passando a Cuba a mensagem norte-americana de que, com a retirada dos mísseis, não tentaria mais invadir a ilha. No dia 28 de outubro chegou-se enfim ao consenso.
Durante a crise, Che Guevara ficou novamente baseado em Pinar del Río, no oeste da ilha, para defendê-la em caso de ataque, como no episódio da invasão à Baía dos Porcos. É sabido que Guevara foi um dos principais articuladores da instalação dos mísseis em Cuba. Quando souberam da negociação entre soviéticos e norte-americanos, ficaram furiosos. Diz-se que, quando Castro tomou conhecimento da notícia, quebrou um espelho com um murro. Afinal, os mísseis seriam a grande proteção contra uma eventual invasão.
Che fez então amargas recriminações ao presidente soviético, Nikita Kruschev. Ele jamais perdoaria os russos, considerando o desenlace do episódio uma verdadeira traição. Em Havana, cubanos indignados repetiam o coro “Nikita, mariquita, lo que se da no se quita!”.
Em entrevista ao jornal britânico Daily Worker, semanas depois do episódio, Che, alterando baforadas no seu inseparável charuto com inalações para a asma, declarou que os mísseis estivessem em poder de Cuba (os soviéticos eram quem os controlavam), todos eles seriam usados contra o coração mesmo dos EUA, incluindo Nova Iorque e as maiores cidades norte-americanas. “Nós marcharemos o caminho da vitória mesmo que isso custe milhões de vítimas atômicas. Nós devemos manter nosso ódio vivo e levá-lo às raias do paroxismo”. A entrevista foi publicada em 04.12.1962, mostrando toda a revolta de Che com o acordo feito pelas duas superpotências e, como era de costume, pregando a Revolução nos demais países da América Latina. Sam Russel, o repórter, disse que achou Che “uma personalidade cativante, com quem simpatizei imediatamente (…), sem dúvida um homem de grande inteligência, embora eu achasse que ele estava biruta pela maneira como não parava de falar nos mísseis”.
É curioso observar que nos últimos dias da crise dos mísseis Vênus entrou em movimento retrógrado aparente no signo de Escorpião, marcando a virada no que estava previamente combinado entre russos e cubanos, além da própria solução diplomática entre os EUA e a URSS. As declarações de Che arranham gravemente a sua imagem, já que ele se revelava disposto a levar o mundo à 3ª Guerra Mundial. Quando buscamos pela posição de Éris no seu mapa natal, vemos que a “deusa da discórdia” está situada entre a conjunção de Marte, Urano e o Ascendente, levando a crer que talvez Che Guevara fosse realmente capaz de matar milhões de pessoas com bombas atômicas.
A entrevista de Che, obviamente, repercutiu muito mal. Quando é publicada, Mercúrio, acompanhado pelo Sol, está numa Quadratura T com a conjunção Urano-Plutão e com uma conjunção Lua-Júpiter. Mercúrio estava sobre Saturno natal, aplicando quadratura à sua Lua e Vênus e Netuno faziam oposição a Vênus de Che. Saturno fechava outra Quadratura T em seu mapa. O radicalismo de Guevara começava a ser problema para os soviéticos e alertava os EUA, que temiam a propagação de movimentos revolucionários pela América Latina.
Transtornos políticos e familiares: Che é um perigo
À medida que Che Guevara segue pregando a Revolução na América Latina, sua condição de “subversivo” ricocheteava em sua própria família. Em fevereiro de 1962, a polícia Argentina desativou uma bomba colocada na porta da casa de sua mãe. Na noite de sua curta visita à Argentina, no ano anterior, outra bomba destruiu a entrada do prédio onde morava seu tio, após a notícia de que se encontrava no país ter vazado. Em abril de 1963, após uma viagem de três meses a Cuba, sua mãe é presa por mais de dois meses, após regressar à Argentina.
Bem ao estilo de sua conjunção entre Marte e Urano [e Éris] no Ascendente, por onde Che Guevara passava a terra “tremia”. No Uruguai, em 1961, um tiro matou um professor universitário local em uma confusão na plateia organizada por um grupo anticastrista que queria assassiná-lo. Sete meses após a visita de Che o presidente argentino Frondizi foi deposto por militares, tendo o seu encontro secreto com Che colaborado para que o golpe contra ele se acelerasse. Jânio renunciou uma semana após ter condecorado Guevara.
Por volta da época em que a mãe de Che é presa, Plutão aplicava oposição à sua Lua [dispositor da casa IV], marcando não só as consequências de seu perigo subversivo sobre ela, como também sobre toda sua família. E mais, era o próprio “Ernestito” quem estava em processo de metamorfose, com sua mudança sendo sentida de forma drástica pela família. A vida da família passa a ser cada vez mais difícil. O pai de Che confessou que ficara chocado com as execuções sumárias que seu filho promoveu logo após a tomada do poder, na prisão de La Cabaña. O líder guerrilheiro e o reboliço que ele provocou no mundo sacudiram radicalmente a vida da família, e a transformação de sua pessoa espantava seus parentes.
Um Comandante cada vez mais radical
Em 1963, Che já havia publicado livros sobre táticas de guerrilha que eram lidos tanto por revolucionários que queriam tomar o poder no mundo inteiro (em especial, na América Latina) e também pelos que se preparavam no sentido de combater a Revolução, principalmente nos Estados Unidos e nas fileiras militares do continente. Nesta época, Che treinava grupos para tomar o poder em sua terra natal, a Argentina.
A retirada dos mísseis pela União Soviética irritara Fidel e Che, este último mais ainda. O Comandante, que recusava quaisquer privilégios para si ou sua família, ficava indignado quando, nas viagens a Moscou, via os dirigentes do PCUS vivendo no luxo, ao contrário do povo russo, que, num regime socialista, não tinha naturalmente direito a regalia de qualquer tipo.
Por outro lado, a partir da Crise dos Mísseis a posição da URSS foi cada vez mais a de uma convivência “pacífica” (dentro da lógica da Guerra Fria, claro) com os Estados Unidos e o mundo ocidental. A China mantinha uma postura cada vez mais distanciada da URSS, radicalizando o seu socialismo com a ideologia da “revolução permanente”, agradando mais e mais ao próprio Che; logo ele que fora o arquiteto das relações de Cuba com a União Soviética.
Nesta época, Che e Cuba tinham participação direta ou indireta em insurgências no Peru, na Venezuela, na Argentina e na África, além de pregarem abertamente a tomada do poder na América Latina de modo geral, o que, mais do que nunca, desagradava aos soviéticos. No entanto, Che era o mais enfático nessa pregação, sendo que a maioria dos partidos comunistas dos países onde estava promovendo insurgências era contra essas iniciativas, posto que estavam alinhados com o PCUS.
A URSS começou a pensar que Che teria se tornado maoísta e ele passa a ser figura incômoda, desestabilizando não apenas a liderança e a doutrinação soviética, mas o próprio ambiente delicado das Guerra Fria. Cuba, por sua vez, era cada vez mais dependente dos russos, sendo que a direção econômica e industrial empregada por Guevara mostrava-se um grande fracasso. Como “embaixador da Revolução” e responsável pela política externa, Che estava sendo por demais agressivo, e tudo que Cuba, ou melhor, Fidel, queria agora era a paz com os EUA.
Símbolo Sexual
Os heróis costumam ser reconhecidos por suas façanhas, mas se são bonitos o seu magnetismo passa a ser ainda maior. Com Che Guevara foi exatamente assim.
Para a grande maioria das pessoas que conviveu e estudou a vida de Che, ele exercia um poder hipnótico sobre as mulheres e, em determinados casos, até mesmo sobre os homens.
Julia Constenla, biógrafa do guerrilheiro e de sua mãe, revela que a atração que ele exercia “era tão impressionante que durante a conferência internacional de Punta del Este, em 1961, até as mulheres de diplomatas norte-americanos queriam conhecê-lo”. Segundo ela, essa atração fez com que o próprio presidente Kennedy fizesse viajar de imediato ao Uruguai o ator e agente do Departamento de Estado Richard Goodwin, para desviar um pouco os olhares e negociar um encontro com Guevara, que havia minado a Aliança para o Progresso com um discurso demolidor.
Ao final da conferência, houve uma festa de aniversário para um dos membros da delegação brasileira. Richard Goodwin, em relato a Kennedy, afirma que “havia umas 30 pessoas na festa, bebendo e dançando ao som de música americana. Conversei com uma porção de gente e, cerca de uma hora depois, disseram-me que Che estava vindo. Chegou poucos minutos depois. Não falei com ele, mas todas as mulheres na festa se juntaram à sua volta. Então, um dos brasileiros disse que Che tinha algo importante para me dizer”. Os dois passaram para um sala ao lado, onde conversaram por cerca de meia hora, com interrupções de “garçons e gente querendo autógrafos”, até que o norte-americano tomou a iniciativa e terminou a conversa.
Como a ex-mulher de Che, Hilda, morava em Cuba com a filha de ambos e participava ativamente do projeto revolucionário para sua terra natal, o Peru, havia um convívio intenso entre o dois. Aleida morria de ciúmes e numa noite chegou a gritar com ela aos berros. Dado o efeito notável que produzia nas mulheres, um amigo perguntou a Che por que se casara com uma mulher tão feia como Hilda. Che repreendeu-o, mas reconheceu que ela não era fisicamente bonita, mas que ela tinha sido uma grande compañera e que uma pessoa “não precisava ser necessariamente bonita” para ser uma amante apaixonada.
Um de seus colaboradores estava numa reunião social em que uma jovem bonita começou a flertar abertamente com Che. Em vez de se sentir lisonjeado e corresponder com um galanteio ou uma brincadeira, Che a repreendeu de modo sério, dizendo-lhe com “se comportasse”. Entretanto, essa severidade não era constante, pois até mesmo ele reconhecia uma mulher bonita quando aparecia na sua frente. Num jantar em uma embaixada em Havana, Che e outro de seus amigos estavam sentados com a bela filha do embaixador.
Havia claros indícios de que a moça estava “sendo oferecida” pelo anfitrião, que obviamente queria “se aproximar” de Che. O amigo de Che disse que a moça era “tão bonita” que qualquer homem teria esquecido seus votos matrimoniais ou revolucionários só para dormir com ela. Che estava visivelmente tendo dificuldade para resistir e acabou virando-se para o companheiro e sussurrou: “Arranje uma desculpa para me tirar daqui antes que eu sucumba. Ya no puedo más!”.
Mas Che também era capaz de exercer forte atração nos homens. Um enviado russo que tinha a missão de descobrir se Che havia se tornado maoísta ou não, Nikolai Metutsov, teve várias conversas com ele em 1963-64. Numa ocasião, conversaram até o raiar do dia na biblioteca da residência do embaixador soviético e, quando terminaram, nadaram juntos na piscina. Enquanto conversavam, o agente russo começou a ter uma sensação estranha: se deu conta de que estava “se apaixonando” por Che. Ele mesmo revela:
Eu lhe disse: ‘Sabe, sou um pouco mais velho que você, mas gosto de você, sobretudo da sua aparência’ (…) e confessei meu amor por ele, porque ele era um homem muito atraente (…). Conhecia seus defeitos, através de todos os documentos, de todas as informações [que nós russos possuíamos], mas quando estava falando com ele, quando tratamos um com o outro, fizemos brincadeiras, rimos e conversamos sobre coisas menos sérias e esqueci seus defeitos. (…). Senti-me atraído por ele, entende? (…) Ele tinha olhos tão bonitos. Olhos magníficos, tão profundos, tão generosos, tão honestos, um olhar que era tão honesto que, de alguma maneira, não se podia deixar de senti-lo (…) e ele falava muito bem, ficou intimamente empolgado e sua exposição era assim, com todo esse ímpeto, como se as palavras dele o estivessem sufocando.
Che Guevara era um taurino, com Vênus em Touro, posições notadamente conhecidas por suas características sensuais. Além disso, ele possuía uma conjunção entre Marte e Urano no Ascendente, demostrando que era um homem viril e singular. A Lua, em Peixes, colaborava para sua aura de magnetismo, conferindo-lhe mais sensualidade ainda.
O Sol está em sextilha com Marte, reforçando suas características masculinas, ainda mais por se tratar de Marte no Ascendente. Por outro lado, Netuno na casa V denota um magnetismo e uma magia especiais e cativantes, sendo que Che sabia fazer uso de uma retórica poética para embelezar e dar profundidade aos seus discursos. Vênus está em trígono com o Meio do Céu, um aspecto favorável à popularidade, ao charme e que dá visibilidade no meio feminino. Vênus recebe um sextil exato da Lua e isto permite deixar as mulheres fascinadas e à vontade, ainda mais pelos signos em que ambos se encontram [Touro e Peixes].
A Lua está em trígono com Plutão, proporcionando uma intensidade emocional que aumentava consideravelmente o seu magnetismo. Este aspecto é capaz de criar uma atmosfera de excitação em torno de si. Como as casas envolvidas são a IV e a XII, essa natureza torna-se ainda mais potente. Mercúrio, que está em conjunção ao Nodo Norte e domiciliado, aplica sextis a Urano e ao Ascendente, dando uma lábia original e assertiva. Finalmente, Júpiter em trígono exato a Netuno, nas casas I e V, dava um poder de sedução incrível.
É evidente que Che, com toda a importância histórica e a enorme coragem que demonstrou ao longo de sua breve vida (e muitos mitos sexuais tendem a permanecerem “vivos” em função disso), sendo ademais um homem bonito, tinha tudo para continuar a exercer esse fascínio mesmo após a morte.
Este artigo é o último de uma sequência de três. Já leu as partes iniciais?
1 – Che Guevara, os primeiros anos
2 – Che Guevara, o mapa e o mito