Em 24 de março de 1999 as forças da OTAN iniciaram o bombardeio contra a Iugoslávia, cujo governo vinha-se recusando a cumprir as exigências de interromper os atos de violência contra a população de origem albanesa da região de Kosovo. A violência fazia parte de um projeto de limpeza étnica, que incluía o desalojamento forçado de populações, torturas e execuções sumárias. O líder máximo da Iugoslávia de então era Slobodan Milosevic, que, explorando o sentimento nacionalista da etnia sérvia, já levara seu país a três conflitos de graves proporções: as guerras da Croácia (1991-1995), da Bósnia (1992-1995) e contra a província autônoma de Kosovo (1998-1999). Durante dez anos a Iugoslávia virou sinônimo de conflitos raciais e guerra civil.
Quais as causas desses conflitos que ensanguentaram a Europa nos anos 90 e colocaram em risco a paz de todo o continente? E quem foi realmente Slobodan Milosevic, um dos maiores genocidas do século XX?
As causas do conflito em Kosovo, em 1999, são as mesmas do que já atingira anteriormente a Bósnia, com destaque para as dificuldades de convivência de etnias diferentes e rivais, divididas basicamente em três grupos:
- os sérvios, povo eslavo de religião cristã ortodoxa e alfabeto cirílico;
- os croatas, católicos com forte influência da Europa Ocidental, especialmente da Áustria, e que utilizam o alfabeto latino;
- os muçulmanos, parcela da população que adotou a religião e a influência cultural do Islã durante os quatrocentos anos de dominação turca.
Além desses grupos principais, há ainda as minorias albanesa, grega e também – já bastante reduzidas desde os genocídios da Segunda Guerra – cigana e judia. Nenhuma delas se identifica com a maioria sérvia, nem pode ser considerada de etnia eslava. No caso específico de Kosovo, a população de origem albanesa desta província sempre desejou a autodeterminação, tendo declarado uma independência unilateral em relação à Iugoslávia.
- Mais sobre este tema em Saturno-Plutão e os fantasmas da velha Iugoslávia
O FIM DE MILOSEVIC – Após o bombardeio da antiga Iugoslávia pelas forças da OTAN, em 1999, o país foi ocupado e seus dirigentes, destituídos do poder. Nos anos seguintes a Macedônia também transformou-se num país independente, o que completou o processo de esfacelamento da velha Iugoslávia. Tendo em vista as pesadas acusações que pesavam contra Slobodan Milosevic e muitos de seus auxiliares diretos, constituiu-se um tribunal especial instalado em Haia, na Holanda. O julgamento começou em 26 de setembro de 2002 e arrastou-se de forma não conclusiva até 2006 em virtude de diversas manobras jurídicas, além de constantes problemas de saúde de Milosevic, que sofria de hipertensão. Milosevic foi acusado de genocídio, assassinatos, perseguições e deportações em massa, destruição de mesquitas e igrejas católicas, um cerco de 43 meses à cidade de Sarajevo, capital da Bósnia, massacre de 8.000 pessoas na cidade de Srebrenica e até mesmo o assassinato de doentes no hospital de Vukovar. Faleceu na prisão, em 11 de março de 2006, vítima de um enfarte do miocárdio.
Esta longa introdução permite entender com mais clareza o mapa do presidente Slobodan Milosevic, um dos protagonistas da guerra que se desdobrou em 1999 entre as forças da OTAN e do governo sérvio.
O mapa de Milosevic
Slobodan Milosevic, ex-homem forte do regime iugoslavo e defensor intransigente da política de limpeza étnica, era um indivíduo teimoso: cinco planetas (Sol, Lua, Mercúrio, Plutão e Saturno) estão em signos fixos, assim como o Ascendente.
A ênfase em Leão dava a Milosevic uma tendência a agir em grande estilo, um toque imperial, um caráter centralizador e uma vocação para a ação dramática.
A conjunção aplicativa Saturno-Urano na casa 1, da identidade, torna Milosevic um porta-voz dos valores do ciclo iniciado pela conjunção exata destes dois planetas, ocorrida em maio de 1942 no último grau de Touro, poucos meses depois do nascimento do líder sérvio. Este ciclo, que se prolonga até 1988, caracterizou-se em todo o mundo por uma forte dose de protecionismo econômico em que a palavra de ordem era a substituição das importações, com o consequente fortalecimento das economias nacionais. Tal tendência pode ser verificada no Brasil, por exemplo, através da criação de indústrias de base, como a Companhia Siderúrgica Nacional, no primeiro governo de Vargas, e a Petrobras, no segundo governo, assim como pela implantação da indústria automobilística no governo Juscelino.
Outro traço típico do período é a emergência de grandes blocos políticos e a divisão do mundo em áreas de influência ideológica: finda a guerra, surgem de um lado a OTAN, reunindo os Estados Unidos e os países da Europa Ocidental, e do outro, o Pacto de Varsóvia, agrupando os países socialistas da Europa Oriental sob influência soviética. Se bem que a Iugoslávia sempre tenha tentado exercer no cenário internacional o papel de país não alinhado, é inegável que o regime forte do Marechal Tito e a proximidade com os outros países do Pacto de Varsóvia funcionaram como entraves para a desagregação da unidade iugoslava.
A nova conjunção Saturno-Urano de 1988 marca o início do colapso do império soviético: nos três anos seguintes, desaparecerem a própria União Soviética, o Muro de Berlim e a unidade do Pacto de Varsóvia. O clima de fragmentação cria as condições para um novo surto de nacionalismo, que dá origem a uma série de países independentes, como as repúblicas Tcheca e Eslovaca, a Ucrânia, a Croácia e a Eslovênia. Toda a crise iugoslava, incluindo a guerra civil na Bósnia, desdobra-se neste quadro de relações internacionais inaugurado com a conjunção Saturno-Urano.
É interessante notar que esta conjunção de 1988 cai na cúspide da casa 9 de Milosevic (uma casa relacionada com leis, religião, ideologias e relações internacionais) e ativa por quadratura Vênus, regente do Ascendente taurino do ex-líder sérvio, no último grau de Virgem.
A impessoalidade e a frieza com que Milosevic conduziu o desalojamento e o extermínio de minorias étnicas no território da antiga Iugoslávia têm a ver diretamente com a conjunção Lua-Plutão em Leão, que forma quadratura quase exata ao Ascendente. Esta conjunção ocupa a casa 4, da ancestralidade, sendo a Lua a própria regente desta casa (Fundo do Céu em Câncer). Em consequência, Milosevic traduz de forma dramática (Lua em Leão) o orgulho étnico de sua condição de Yug (eslavo do sul), resgatando do passado remoto a visão de uma Sérvia forte, guerreira e unificada. Plutão, por sua vez, dá a este sentimento um toque arcaico, irracional e selvagem: é como se, através de Milosevic, irrompesse outra vez a horda dos bárbaros eslavos que saíram das profundezas das estepes no início da Idade Média para desestabilizar e destruir a refinada presença bizantina nos Bálcãs.
Saturno, regente do Meio do Céu e posicionado na casa 1, em Touro, complementa o quadro de rigidez, fazendo quadratura com a conjunção Sol-Mercúrio em Leão. É um aspecto de dogmatismo e inflexibilidade, que esconde um toque de insegurança pessoal (Saturno na 1) sob o disfarce do uso teatral e totalitário do poder.
Do ponto de vista da teoria dos modelos planetários, o mapa natal de Milosevic é uma taça, ou seja, um padrão de distribuição onde os dez planetas apresentam-se concentrados em aproximadamente metade da mandala, enquanto a outra metade permanece vazia. O ponto focal deste modelo é o chamado planeta-guia, aquele que “puxa” os demais no sentido horário. Em outras palavras, o primeiro do grupo de dez a atravessar o Ascendente na data do nascimento. No caso, quem desempenha este papel é Marte, não apenas enfatizado por ser o planeta-guia como também por ser o único a ocupar o hemisfério Sul (acima do Ascendente), o que lhe dá um destaque excepcional.
Marc Edmund Jones e Robert Jansky definem como elementos constitutivos da psicologia da taça um alto grau de autossuficiência, um sentido de missão e de defesa de causas, a percepção da própria importância, um bom senso de timing e de oportunidade, uma grande capacidade para agir sob situações de tensão e um comportamento de “tudo ou nada”. A taça tem uma característica de tensão e de resistência que encontra analogia nos signos fixos, exatamente os que predominam na carta de Milosevic.
Outra classificação possível é o leque, modelo de distribuição planetária em que nove planetas situam-se nos limites de um trígono enquanto o décimo ocupa algum lugar da área aberta. Este planeta – que é Marte, no caso de Milosevic – funciona como a haste que movimenta todo o restante do leque, ou o planeta-alavanca de onde partem as motivações e ações do indivíduo.
Tanto na taça quanto no leque, muitas características de personalidade, assim como o modelo de atuação do indivíduo, podem ser observados a partir da natureza do planeta principal (planeta-guia ou planeta-alavanca). Sendo Marte, temos o quadro de um homem combativo, agressivo, empreendedor e disposto a lutar pelos seus objetivos. É o protótipo do guerreiro.
Marte está em Áries, seu signo de domicílio, na casa 12 do inconsciente, do comportamento que pode ser antissocial e da sintonia com as grandes correntes coletivas subliminares. Com este Marte, é como se Milosevic pudesse estabelecer uma sintonia com a agressividade latente no nacionalismo sérvio, uma espécie de patologia social que se traduz por séculos de sentimento de anulação e de limitação, e que acabou por explodir nos anos 90 num exercício exacerbado de afirmação do próprio poder.
Milosevic e a batalha de Kosovo
Outra abordagem digna de atenção é a comparação do mapa de Milosevic com os trânsitos dos planetas lentos em 1389, ano em que os turcos iniciam a conquista da península balcânica através da batalha de Kosovo – exatamente o mesmo palco do conflito de 1999. A batalha teve lugar no dia 15 de junho de 1389. Mas como foi parte, na verdade, de um longo enfrentamento, podemos considerar as posições gerais dos planetas mais lentos naquele ano e compará-las com o mapa de Milosevic.
Saturno transitava pelos últimos graus de Leão, mesmo signo da conjunção Sol-Mercúrio de Milosevic; Urano entrava em Escorpião, em oposição ao Ascendente do líder sérvio e em quadratura com sua conjunção Lua-Plutão; Plutão, no ano da batalha, cruzava os últimos graus de Touro, em conjunção com o Saturno de Milosevic e em quadratura com seu Sol; já o Netuno de 1389 avançava por Touro, próximo ao Ascendente do líder sérvio.
Verifica-se, portanto, uma ressonância entre os dois momentos astrológicos, como se o mapa de Milosevic representasse a cristalização de um conflito de mais de seiscentos anos entre o povo sérvio e o que este considera como sendo os inimigos, os invasores, os obstáculos à autonomia e à unidade nacional.
Se considerarmos em conjunto os dois mapas – o de 1389 e o de Milosevic – temos uma notável concentração planetária em signos fixos, especialmente Touro e Leão. Em Touro, uma questão central é a da vinculação ao solo, a materialização do poder mediante o controle territorial. É um signo aquisitivo e retentivo. Já Leão é um signo centralizador e personalista, presente com frequência na carta de líderes políticos com pretensões imperiais. Outra coincidência digna de atenção é o fato de que, em 1389, Saturno encontrava-se em Leão e Plutão em Touro; na carta de Milosevic, tais planetas trocam de signo, com Plutão em Leão e Saturno em Touro.
Fontes astrológicas para entender a guerra da Iugoslávia
Nenhum evento coletivo pode ser compreendido a partir de um único mapa. No caso da guerra da Iugoslávia da década de 1990, o processo de interpretação deveria levar em conta, pelo menos, as seguintes cartas, várias delas sujeitas a retificação:
1. A carta do início de um conflito militar sempre pode dar indicações sobre as possibilidades de desenvolvimento do conflito e da situação de força ou fraqueza de cada um dos oponentes. Sabemos que o resultado do ataque das forças da OTAN à antiga Iugoslávia foi a derrota das pretensões sérvias e a destituição de Milosevic do poder. Milosevic acabou preso e submetido a julgamento por uma corte internacional, em Haia. Contudo, há quatro hipóteses para o início do ataque da OTAN, baseadas em depoimentos conflitantes sobre o momento do disparo do primeiro míssil:
- 24.3.1999, 18h51 GMT (hora de Londres), Pristina, Iugoslávia, 021e10, 42n39. O Ascendente é 27°43′ de Libra;
- Os mesmos dados, mas com os horários de 18h58, 19h08 ou 19h14 (sempre hora de Londres), cujos Ascendentes seriam, respectivamente, 29°04′ de Libra ou ainda 1°00′ ou 2°09′ de Escorpião (nos dois últimos casos, em oposição ao Ascendente de Milosevic).
Em todas as hipóteses, o único planeta na casa 1 é Marte, retrógrado, em Escorpião, em oposição a Vênus em Touro na casa 7 (dos conflitos) e em quadratura com Urano em Aquário na 4 (da ancestralidade e das raízes étnicas). Portanto, três planetas domiciliados em signos fixos, que tendem a indicar processos de longo prazo.
Caso o Ascendente esteja nos últimos graus de Libra, seu regente, Vênus, encontra-se na casa 7, enquanto o regente da 7, Marte, está na 1. Esta troca de posições em mapas de conflitos (o Ascendente representa o local onde onde o conflito ocorre e a parte atacada, enquanto o Descendente representa o atacante – no caso, as forças da OTAN) costuma indicar, segundo William Lilly, que nenhum dos lados conseguirá prevalecer. Qualquer que seja o horário correto, o posicionamento de Netuno no Fundo do Céu é um indicador de uma situação com desdobramentos e final confusos (a casa 4 representa o resultado final da situação – no caso, a guerra). A propósito: Raul V. Martinez lembra que Kosovo está muito próximo do meio da linha central do eclipse “nostradâmico”, que ocorreu em 11 de agosto de 1999.
Segue-se a carta calculada para o horário das 20h14 (hora legal da Iugoslávia) ou 19h14 (hora de Londres):
2. Deve-se considerar a carta nacional da Iugoslávia, mas aqui cabe perguntar: qual delas? Numa perspectiva histórica, o núcleo organizador da Iugoslávia é a Sérvia, que apresenta pelo menos quinze possibilidades diferentes de carta!
3. Considerar também a carta da mal sucedida independência de Kosovo, sobre a qual Nicholas Campion assim se manifesta:
A república autônoma sérvia de Kosovo declarou sua independência como república de Kosovo em 1991. Um referendo ocorrido de 26 a 30 de setembro de 1991 aprovou a declaração de soberania e, em 19 de outubro de 1991, estabeleceu-se um governo provisório que teve, contudo, de permanecer na clandestinidade devido à vigilância sérvia. Não se buscou o reconhecimento internacional, sendo que apenas a Albânia reconheceu o novo governo. O reconhecimento da Comunidade Européia foi solicitado em 23 de dezembro de 1991 e recusado. A carta foi levantada para a capital Kosovo, na hora aproximada do fechamento das urnas em 30 de setembro de 1991. (CAMPION, Nicholas. Book of World Horoscopes.)
O Ascendente desta carta apresenta-se em 8°19′ de Gêmeos. A propósito, comentou a astróloga Nilsa Gorey durante a guerra do Kosovo, em 1999:
Nesse momento crítico para a pequena república que nunca teve sua existência reconhecida internacionalmente, Plutão transita a cúspide da casa 7 enquanto Urano transita o Meio do Céu, ambos formando uma quadratura paran! Essa matança dos kosovares (etnicamente albaneses) começou com a passagem de Netuno pelo Saturno radical do tema (00°13′ de Aquário), intensificando-se no final do ano passado quando Netuno passou definitivamente ao signo de Aquário. O horizonte em conjunção ao eixo Aldebaran-Antares não é prenúncio de vida longa para essa pequena república, a questão aqui é saber se esse conflito tem potencial de alastramento (creio que sim, os pobres kosovares tem Sol em conjunção com Vindemiatrix, aspecto considerado bastante maléfico por astrólogos medievais). O início do conflito tem Marte retrógrado em quadratura ao Meio do Céu radical, o que significa provavelmente que essa situação não será resolvida agora. O ataque da OTAN pode ser suspenso, mas deve voltar a ocorrer.
Observe-se que Nilsa faz, em sua análise, referências a três estrelas fixas. A primeira delas, Aldebaran, costuma ser associada a inquietação, conflito, dissensão, revolução e guerras civis. Antares, por sua vez, indica perigo provocado por explosões, fogo e outros fatores regidos por Marte. Vindemiatrix sempre teve fama de estrela maléfica e portadora da ruína, especialmente para indivíduos do sexo masculino. Quanto à referência à quadratura paran, o termo refere-se à posição angular simultânea de dois corpos celestes, sejam estrelas ou planetas: um deles está nascendo (Ascendente), culminando (Meio do Céu) ou pondo-se no horizonte (Descendente) enquanto o outro encontra-se em qualquer uma dessas três posições.
4. Seria necessário também analisar as outras possibilidades para o mapa de Slobodan Milosevic. A que utilizamos parece-nos a mais correta, em face do estilo que imprimiu na gestão da Sérvia e do desenrolar dos acontecimentos bélicos dos anos 90. É o horário que consta nos bancos de dados alemães, normalmente bastante minuciosos, e que vem sendo utilizada por astrólogos daquele país. Contudo, há outros horários possíveis que podem ser testados, sempre para a mesma data. A colecionadora de dados, Lois Rodden, citava os de 2h30, 3h20 e 22h (fuso horário da Iugoslávia, com uma hora de adiantamento em relação a Greenwich).
4. Considerar, finalmente, a carta da criação da OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte): Washington, DC, 4.4.1949, 11h42 (o fuso de Washington é igual a -4 em relação a Greenwich).
NOTA: a última seção deste artigo, referente à guerra, baseou-se em dados divulgados em 1999 em mensagens de Raul V. Martinez, Antonio Carlos Siqueira Harres e Nilsa Gorey para a lista Prometeu, de Astrologia Mundial, assim como em informações veiculadas na lista William Lilly, de Astrologia Horária. Na primeira seção, sobre as origens do conflito, utilizaram-se diversas fontes bibliográficas sobre a história da península balcânica e dos impérios bizantino e otomano.
- Mais sobre este tema em Saturno-Plutão e os fantasmas da velha Iugoslávia