Uma estonteante morena de cabelos e olhos negros e covinhas no rosto: pelo menos quanto à aparência física há concordância. No mais, a Marquesa de Santos já foi chamada de tudo. Para alguns, foi uma patriota e inspiradora das melhores decisões de D. Pedro I; para outros, a simples oportunista que só se aproximara do imperador em busca de prestígio e enriquecimento pessoal. Onde estará a verdade? Certamente era uma mulher ambiciosa, ousada e competente. E passava longe da moral da época, que reservava ao sexo feminino um papel secundário e afastado da vida pública.
Nascida em São Paulo em 27 de dezembro de 1797, Domitila de Castro – chamada pelos íntimos de Titila – foi uma mulher de ação, o que já se revela pela presença de cinco planetas em signos cardinais. Não apenas tinha o Sol em Capricórnio, mas também em oposição a Saturno, o que fazia dela, antes de tudo, um “animal político”. Vários fatores na carta revelam necessidade de poder e um ímpeto de ascensão na escala social. Além do aspecto Sol-Saturno, havia também a conjunção Vênus-Plutão em Aquário, que, somada à conjunção Marte-Netuno em Escorpião, contribuía para dar-lhe uma personalidade dominadora, que se impunha pelo uso da sedução e de uma boa dose de sex-appeal.
Domitila: um Ascendente Leão?
Sendo Pedro I um príncipe da casa real, teve o horário de nascimento registrado com razoável precisão, o que permite que saibamos que seu Ascendente estava por volta de 23º de Libra. Para explicar a atração que o uniu a Domitila de Castro durante seis anos, é preciso que haja pelo menos um forte interaspecto entre os mapas de ambos, indicador de paixão e atração física. Se Domitila nasceu entre o final da manhã e o início da tarde, teria sua Lua por volta de 18º ou 19º de Áries, em oposição ao Sol do Imperador; mas se nasceu à noite, já por volta de 22 horas, teria a Lua na cúspide da 7 do Imperador, em oposição ao Ascendente deste. E mais: o Ascendente de Domitila seria Leão e seu Sol estaria na casa 5; Plutão e Vênus estariam no Descendente e Urano ocuparia a casa 1. É um mapa puramente especulativo, mas bem adequado para a favorita do Imperador, que foi rainha na prática e impôs-se à sociedade da época como um modelo precursor de comportamento assertivo e independente.
Vênus em Aquário é um dos indicadores clássicos de propensão para o amor livre, despreconceituoso, e também de uma certa tendência para socializar as relações afetivas, usando-as como ponto de partida para a ampliação do círculo de conhecimentos e amizades. Vênus em conjunção com Plutão é sempre um sinal de falta de medida, já que agrega a intensidade e compulsividade plutoniana à expressão do desejo e do afeto. Numa mulher, este aspecto tanto pode se manifestar por um comportamento amoroso semelhante a um furacão quanto pelo seu oposto, qual seja, a repressão da entrega ao parceiro e o uso intencional dos encantos pessoais para fins manipulatórios. Ambas as alternativas poderiam ser motivação suficiente para o romance escandaloso de Domitila com D. Pedro. E, com Júpiter e Lua em Áries, é claro que os atos desta mulher sempre tinham um toque de impulsividade e arrebatamento.
Alguns de seus biógrafos a veem como uma mulher calculista e aproveitadora, que se teria mancomunado com sua verdadeira paixão, o Chalaça, para obter o máximo proveito da relação com D. Pedro I. Verdade ou não, o fato é que não se contentou em ser apenas a companheira de alcova do Imperador, imiscuindo-se com frequência nos negócios de Estado e interferindo em nomeações e demissões de ministros. Sua influência sobre D. Pedro contribuiu para despertar ódios e torná-lo cada vez mais impopular. Após a morte da Imperatriz Leopoldina, a esperta e ambiciosa Domitila esperava que o caminho estivesse livre para casar-se com o Imperador. Não foi o que aconteceu: após presenteá-la com uma generosa fortuna, D. Pedro despachou-a de volta para São Paulo e mandou buscar uma nova mulher na Europa. A segunda esposa, D. Amélia de Leuchtenberg, era jovem, bonita e charmosa o suficiente para acalmar um pouco os arroubos de promiscuidade do fogoso marido. Domitila não demorou muito tempo para encontrar outro amor na figura de Tobias de Aguiar, um dos homens mais ricos de São Paulo. Viveram como amantes por mais de dez anos e casaram-se em 1842.
Em São Paulo, a marquesa transformou sua casa num ponto de reuniões de grupos maçônicos (o que significa dizer: um foco de permanentes debates políticos) e promovia constantes festas carnavalescas e reuniões literárias. Na velhice, dedicou-se à beneficência, auxiliando, por exemplo, dezenas de estudantes pobres. Faleceu em 1867, deixando 14 filhos (três deles com D. Pedro I).
O traço que, em nossa opinião, merece mais destaque na carta de Domitila é a dominante saturnina formada pelos quatro planetas em Capricórnio-Aquário e pela oposição Sol-Saturno. Neste ponto, lembra Maria Quitéria, a mulher do povo que se vestiu de homem para lutar nas guerras de independência na Bahia. Maria Quitéria era leonina com uma quadratura Sol-Saturno. Domitila era uma capricorniana com provável Ascendente em Leão. Ambas rejeitaram o confinamento ao ambiente doméstico e partiram corajosamente para uma participação ativa na vida pública, cada uma a seu modo e com as armas de que dispunham. Um exemplo mais recente de mulher que também construiu um espaço político pela união com um homem poderoso é Evita Perón, mais uma a apresentar uma quadratura Sol-Saturno.
Leia a série completa sobre as personalidades que levaram o Brasil da Colônia à Independência:
- Do Quinto dos Infernos ao Novo Mundo
- Carlota Joaquina, quase rainha da… Argentina
- D. João VI, apenas um comedor de coxinhas?
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- O dia em que a família real fugiu para o Brasil
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- Chalaça, o homem do Chupa-Chupa
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