Destaque
O que dizer de alguém que se submete a carregar o peso daquela infinidade de paetês, brocados, lantejoulas e outros materiais brilhantes ao mesmo tempo em que é obrigado a manter a ginga encarapitado no alto de estreitas plataformas ambulantes? O destaque é exatamente isso: mistura de manequim com equilibrista, pavoneando-se no alto do carro alegórico. A própria denominação do personagem – destaque – já aponta para Leão. Brilho é palavra leonina, com certeza, assim como são de natureza solar aqueles estranhos objetos que o destaque carrega nas costas, geralmente enormes e de forma circular – os resplendores. O destaque ocupa o ponto mais alto do desfile, aquele de máxima visibilidade, o que leva a pensar também na casa 10.
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Enredo e samba-enredo
O enredo pode ser entendido como o desdobramento do tema do desfile, o eixo organizador da história a ser contada. No passado, o enredo tinha características narrativas, apropriando-se, às vezes, dos recursos do drama teatral, com um protagonista, seus antagonistas, uma intriga claramente definida e um desenvolvimento temporal, com princípio, meio e fim. O último grande enredo deste tipo foi Os Sertões, da pequena escola de samba Em Cima da Hora, em 1973, que narrava toda a saga de Canudos. Nos últimos anos, vêm predominando os enredos puramente descritivos, que se apresentam como mosaicos um tanto desconjuntados.
O principal veículo de apresentação do enredo é o samba-enredo, que apresenta (ou deveria apresentar) todos os elementos necessários à compreensão do tema. A era de ouro dos grandes sambas foi do final dos anos quarenta ao início dos setenta, sendo Silas de Oliveira, do Império Serrano, o compositor das obras mais representativas do gênero. A partir dos anos setenta, a comercialização dos discos de sambas-enredo, gerando lucros para os compositores, transformou as escolhas dos sambas em acirradas competições dentro das quadras, normalmente resolvidas mediante uma solução salomônica: o samba-frankenstein, obra coletiva formada a partir de trechos dos sambas de diversos concorrentes, colcha de retalhos que na maioria das vezes resulta numa letra desconexa e numa melodia pobre e cheia de clichês. Em termos puramente musicais, o samba-enredo é um gênero em vias de esgotamento.
O enredo, em si, componente mais abstrato e racional do desfile, é regido por Mercúrio. Já o samba-enredo responde à dupla regência Mercúrio-Vênus. É como o libretto da ópera.
Puxador de samba-enredo
O puxador do samba é mais do que um cantor: é um animador, que tem a obrigação de manter elevado o moral da escola. É dele que partem os gritos de guerra que, ainda na concentração, antes do desfile, acendem os ânimos e contagiam todos os integrantes. Alguns puxadores são verdadeiros especialistas em apelos emocionais, aproveitando o aquecimento na concentração para trazer a lembrança das raízes e das tradições da escola. Sua função lembra um pouco a dos líderes militares capazes de inflamar a tropa, apelando para o patriotismo e o brio dos soldados. E, em verdade, o desfile é visto como uma batalha, razão pela qual hesitamos em atribuir a esta figura os tradicionais significadores dos cantores: Touro e seu regente, Vênus. O puxador de samba é um clarim de guerra. É Áries, aquele que sai na frente guiando a escola.
Há casos raros de puxadores de samba que correspondem ao arquétipo de Vênus em Touro. Um exemplo foi Jamelão, veterano puxador da Mangueira, cuja voz consistente e melodiosa já virou um mito. Jamelão, aliás, detestava a denominação puxador, preferindo considerar-se intérprete. A maioria, porém, está mais próxima da estridência de Vênus em Áries.
Carnavalesco
É o responsável pela concepção do desfile. Em algumas escolas é também o responsável pela escolha do enredo. Em outras, parte de um enredo previamente escolhido e desenvolve sua expressão visual. Ao longo do processo de preparação do desfile, costuma assumir também a responsabilidade de coordenar os trabalhos do barracão (a oficina cenográfica da escola). A rigor, seu trabalho termina no momento em que a agremiação entra na avenida. Muitos carnavalescos, porém, são figuras carismáticas, exercendo forte liderança sobre a escola, a ponto de assumir, durante o desfile, a função de “regente” da orquestra.
É quase impossível estabelecer um significador comum para todos os carnavalescos. No caso do carnavalesco-cenógrafo, normalmente oriundo do meio teatral e cujo trabalho concentra-se na concepção plástica de fantasias, carros alegóricos e adereços, pode-se pensar numa tripla regência Netuno-Mercúrio-Vênus. Temos aí o artista que cria ilusões visuais, que transforma materiais baratos em fantasias opulentas, que responde, enfim, ao arquétipo da estesia visual representado por Netuno em Gêmeos no Ascendente do Rio de Janeiro em quadratura com a Lua em Peixes. Nesta categoria, podem ser enquadrados o pioneiro Arlindo Rodrigues e seus seguidores Nilson Lage (Mocidade Independente) e Rosa Magalhães (Imperatriz Leopoldinense).
Já no carnavalesco-carismático, estilo Joãosinho Trinta, que se comporta antes de tudo como o diretor geral do espetáculo e criador de conceitos impactantes, vemos em pleno funcionamento a conjunção Sol-Plutão em Peixes no Meio do Céu do Rio de Janeiro, com tudo o que significa em termos de controle, exercício de poder e afirmação ditatorial da própria genialidade.
Diretor de Harmonia
Em todo desfile há sempre, misturados aos foliões, uns sujeitos de aspecto tenso, cuja maior preocupação parece ser empurrar as alas daqui para ali, ora apressando-as, ora retendo-as de forma a permitir a aproximação de outra, mais atrás. São os diretores de harmonia, cujo compromisso é manter o bom andamento do desfile, seja no aspecto da cronometragem (a ultrapassagem do tempo máximo representa perda de pontos), seja quanto à distribuição das alas pelo espaço da passarela.
A função desses homens preocupados é eminentemente reguladora. Seu trabalho é manter a homeostase, evitando excessos. Exercem um papel libriano, portanto, se bem que seus métodos nem sempre lembrem claramente os atributos de Vênus (não é raro vê-los aos berros, empurrando foliões sem muita cerimônia). Pode-se pensar, talvez, no funcionamento de Vênus no estressado signo de Virgem.
Patrono
A maioria das escolas de samba cariocas tem um patrono, normalmente oriundo da contravenção. Muitos deles mantêm, inegavelmente, um forte vínculo com as escolas que ajudam a sustentar. Ao mesmo tempo, sua participação funciona como uma estratégia de marketing: transformando toda a comunidade em afilhada, o patrono garante uma certa popularidade e usa a agremiação como trampolim social. O carnaval sempre exerceu um papel nivelador, dando ao contraventor a oportunidade de estar lado a lado com o político em busca de votos e com a autoridade no camarote de honra. Permite a notoriedade e a exposição pública através dos meios de comunicação de massa. É uma relação utilitária, em que ganham a escola e seu patrono.
Patronos, quando praticantes de mecenato no sentido mais pleno, são comumente atribuídos a Júpiter e Vênus. Quando oriundos de atividades ilegais, contudo, são assunto de Plutão e Marte. O patrono da escola de samba é uma figura um tanto dúbia, mistura de protetor dos pobres com ditador (Plutão ou Urano). Algumas vezes, assume diretamente a presidência da escola. Outras, mantém-se à margem, enquanto a presidência é exercida por uma espécie de títere. No primeiro caso, uma associação com Júpiter-Plutão e casa 10 poderia ser adequada. No segundo, poderíamos pensar nas casa 8 ou 12, mais adequadas à condição de eminência parda. A dupla regência Júpiter-Urano ficaria reservada para os patronos mais extravagantes, que assumem abertamente a condição de “donos do pedaço” e comportam-se de maneira imprevisível. Dada a conotação de associação de interesses que define a simbiose entre patronos e escolas, a casa 8 parece ser, dentre todas, a mais acertada para indicá-los.
Jurados
Sendo o desfile de escolas de samba uma competição, é necessário que haja um juiz. Um não, vários! Seu trabalho não é dos mais divertidos: passam a noite inteira trancados em solitárias cabines, observando e atribuindo pontos, em função de alguns parâmetros de avaliação. O trabalho pode se tornar um tanto perigoso, pois já houve mais de um caso de jurado ameaçado de morte por ter tirado o pontinho precioso que daria o título a determinada escola. É uma atividade tão ingrata quanto a de árbitro de futebol e, tal como estes, é provável que jurados de desfile não tenham mãe, ou não liguem muito para a reputação das genitoras.
Júpiter e Sol são as melhores escolhas como regentes de juízes. Mas aqui não se trata de aplicação da justiça, e sim de apreciação estética (Vênus/Libra), de avaliação de desempenho de acordo com determinados critérios (Mercúrio/Virgem). Ficamos, assim, com a dupla regência Mercúrio-Vênus para os jurados de escola de samba, sem deixar de considerar uma leve participação de Urano, que é significador de árbitros e responde também pelo atrevimento de quem se arrisca a exercer tão perigosa atividade. Convenhamos: jurado de desfile carnavalesco só pode ser um sujeito excêntrico…
Passistas
O passista, na atualidade, é uma das poucas figuras da escola que ainda se define pelo “samba no pé”. Figura ágil, flexível, capaz de todos os movimentos vedados ao comum dos mortais, é um pouco de atleta ou acrobata (Marte), um pouco de dançarino (Netuno), um pouco de perito (Mercúrio). Netuno em Gêmeos no Ascendente da cidade encontra aqui uma de suas melhores expressões, assim como a nervosa manifestação de Marte em Aquário.
O passista masculino herdou muitos de seus movimentos da tradição da capoeira praticada desde o período colonial e utilizada com frequência pelos malandros para enfrentar a polícia (Marte em Aquário em oposição a Saturno em Leão no mapa do Rio). Já suas femininas parceiras exploram, antes de tudo, as conotações eróticas da dança, o que nos permite relacioná-las também com a intensidade de Vênus em Escorpião.