NOTA EXPLICATIVA DO EDITOR
Fernando Fernandse
Em 2002, depois de estudar as peripécias da vida deste personagem histórico, levantei uma carta especulativa de Francisco Gomes da Silva, mais conhecido como Chalaça, braço direito de D. Pedro I. Na época, o interesse pelo Chalaça estava em alta, pois sua biografia servira de base (com muitas deturpações) para o personagem do mesmo nome na minissérie O Quinto dos Infernos, produzida pela Rede Globo.
De tempos em tempos a personalidade do Chalaça desperta a atenção dos roteiristas. Ele está presente em todos os filmes e minisséries sobre a vinda da família real para o Brasil e sobre o reinado de Pedro I. Trata-se de uma das figuras mais peculiares do movimentado período da história brasileira que vai da chegada da corte de D. João VI ao fim do reinado de D. Pedro I. Na TV, na versão de 2002, o Chalaça foi retratado como um simpático e amoral Don Juan, incapaz de resistir aos encantos das dezenas de mulheres que o perseguem. Mas esta é apenas uma parte da verdade.
Sabe-se que nasceu em Lisboa, em 22 de setembro de 1791. O horário é desconhecido, mas, com base nos fatos de sua vida, levantei o mapa especulativo para as 17h42 LMT. Para testar a eficácia do mapa, resolvi enviá-lo a outro astrólogo – Carlos Hollanda – sem qualquer indicação adicional além do fato de tratar-se de um homem de vida bastante conhecida. Junto com o mapa, seguiram sete perguntas. Carlos Hollanda aceitou o desafio e, duas horas depois, mandava de volta o mapa acompanhado do artigo que se segue.
Leia o artigo e confronte-o depois com a história real deste intrigante personagem, no artigo Afinal, quem era o Chalaça?
Uma análise no escuro
CONSTELAR – Como seria a personalidade deste homem?
CARLOS HOLLANDA – Com Saturno na casa 1 ele tem aquela característica laboriosa, normalmente motivada por um desejo de respeitabilidade. Era crítico e analítico, como um bom virginiano, mas profundamente afetado pelo relacionamento com o outro. Aquela montanha de planetas na casa 7 e em Libra é indicativa de uma personalidade mediadora, voltada para valores como a lei e a paz. Mercúrio, o dispositor do Sol, também está em Libra, o que reforça esta tendência. Mas, contraditoriamente a esta disposição primordial, ele tem uma dificuldade extrema em lidar com autoridades. É possível que tenha-se envolvido em algum conflito territorial e político, como mostra a oposição entre Júpiter e Saturno e as quadraturas de sua Lua. Ele pode ter desenvolvido um sentido universalista (ver as condições em que Netuno se encontra neste mapa), mas as necessidades de defesa de si e dos seus (Saturno na 1 e Lua em Câncer) podem ter prevalecido. Peixes no Ascendente e a prevalência de Netuno em Libra junto com Mercúrio e Vênus são análogos a um comportamento bastante escorregadio. A combinação entre Saturno na 1, Peixes no Ascendente e a ênfase libriana pode tê-lo tornado um estrategista capaz de dissimular intenções como ninguém. Peixes é difícil de mostrar-se totalmente.
Vênus, dispositor de quatro planetas do mapa, está conjunta a Netuno, mas está em Escorpião, o que reforça a tendência às “cortinas de fumaça”, aos engodos e dissimulações que visam à percepção de falhas de terceiros e, por conseguinte, a obtenção de controle sobre outras pessoas. Isto se deduz da configuração em si, não de cada fator isoladamente.
CONSTELAR – Como teria sido sua relação com os pais?
CARLOS HOLLANDA – Ele foi adotado, por acaso? Este mapa me sugere um processo de adoção. Mercúrio, o dispositor da casa 4, em Gêmeos, está retrógrado, conjunto a Netuno e em quadratura com a Lua em Câncer. Esses indicadores apontam para possível dissolução do lar ou distanciamento involuntário da família. É provável que algo desse tipo tenha ocorrido com ele. Talvez a perda dos pais numa guerra ou algo assim.
CONSTELAR – Como seriam as relações deste homem com autoridades, com figuras de poder?
CARLOS HOLLANDA – Como disse, ele tendia a ter dificuldades com autoridades. Ele nasceu sob duas oposições cruciais: Saturno-Júpiter e Urano-Plutão. O eixo da primeira é o do ego e inimigos declarados (casa 1-casa 7). A Parte da Fortuna está em Capricórnio e na casa 11. O eixo das casas 5-11 é o que normalmente move sindicatos e órgãos públicos contra o poder central ou contra a elite dominante. Com a Parte da Fortuna em Capricórnio e com Saturno na primeira casa, reitera-se a tendência à atuação política, talvez como eminência parda, mas causas coletivas devem ter tido alguma preponderância na vida deste homem.
CONSTELAR – É possível dizer algo sobre seus talentos, ou sobre as atividades que exerceu para sobreviver?
CARLOS HOLLANDA – É possível que tenha sido formado em Direito e Filosofia, mas provavelmente exerceu suas capacidades no campo político. Tendia a preocupar-se com reformas e com o bem-estar coletivo, como mostra sua Parte da Fortuna na casa 11 e Urano na casa 6. Mas o dispositor da Parte da Fortuna, Saturno, está em Áries e com aquela oposição fumegante. Pode ter-se dedicado àquelas situações de conflito de que falei. Outra coisa: pela quantidade de planetas na 7, ele atuou bastante como consultor, conselheiro (o que não deixa também de ser atributo da 11), mas sempre preocupado com questões sociais. Se ele aparecesse hoje pedindo uma análise vocacional eu sugeriria Ciências Humanas, mais especialmente Direito e Antropologia. Talvez ele também tenha tido interesse em História.
CONSTELAR – Como esse homem se comunicava?
CARLOS HOLLANDA – Sedutoramente, embora tenha precisado, durante a juventude, fazer um bom esforço para dominar a tendência à dispersão e à confusão entre vários assuntos correlatos (Mercúrio retrógrado, em conjunção com Netuno e quadratura com a Lua). Mas o trígono com Plutão pode tê-lo tornado um baita orador, ou um escritor capaz de encantar as massas e de argumentar friamente sobre assuntos com os quais tinha um relacionamento de paixão. Evocando o passado e as tradições, ele visava a modificar o presente para trazer um futuro mais promissor. A retrogradação de Mercúrio costuma estar presente em mapas de pessoas que se esforçam muito para compensar um sentimento de inabilidade na comunicação. Por isso não raro aparecem bons oradores com esta característica. São pessoas altamente refletidas e que dificilmente agem por impulso, mas que subvertem a ordem pensante da coletividade expondo suas contradições.
Este homem deve ter sido bom em analogias e metáforas, mas deve ter sofrido um bocado. O que aponta isso são as condições de Mercúrio, que, em função da interceptação ocorrida no eixo 1-7, rege também a casa 3.
CONSTELAR – Como foram suas relações com o sexo oposto?
CARLOS HOLLANDA – Com uma chuva de planetas na casa 7 ele pode até ter casado várias vezes. Com a Lua e Marte na casa 5, e ainda formando quadraturas com Vênus, Netuno e Mercúrio, ele pode ter apresentado um comportamento lascivo com relação às mulheres da época. Pode também ter agido como um verdadeiro Casanova, tal é a intensidade da aspectação nos fatores que regulam o relacionamento e a sexualidade.
CONSTELAR – Era um homem que agia às claras? Era do tipo franco, direto, transparente e assertivo?
CARLOS HOLLANDA – A resposta é não. Não pode ser. Não com um mapa com combinações como estas. Talvez, se vivesse nos dias de hoje, com todo um aparato de conhecimento psicológico à disposição, ele passasse a questionar suas próprias ações. Mas nos séculos XVIII e XIX esse tipo de preocupação com assertividade e transparência ainda estava começando a dar o ar de sua graça. Sua tendência principal, portanto, era justamente o contrário.
Peixes no Ascendente, com o dispositor em Libra; Sol em Virgem, com o dispositor em Libra; Lua em Câncer, conservadora e de comportamento lateral, intimista. Saturno na casa 1, os planetas na 7… tudo isso sugere que ele tinha muita capacidade de fazer com que outros lutassem no lugar dele, que, na medida do possível, os conflitos fossem travados de um modo que ele não saísse perdendo nem com a honra manchada. Ele provavelmente esperava que o outro se denunciasse através de uma ação comprometedora, ou que pudesse ser enrolado com uma bela conversa mole. Dificilmente encararia um desafio face a face, como o faria alguém de índole mais marcial.
Agora, os fatos: quem era o Chalaça
Leia a série completa sobre as personalidades que levaram o Brasil da Colônia à Independência:
- Do Quinto dos Infernos ao Novo Mundo
- Carlota Joaquina, quase rainha da… Argentina
- D. João VI, apenas um comedor de coxinhas?
- Marquesa de Santos, a Titila do Imperador
- O dia em que a família real fugiu para o Brasil
- Chalaça, a sombra danada do Imperador
- Afinal, quem era o Chalaça?
- Chalaça, o homem do Chupa-Chupa
- Chalaça e PC Farias, estranhas semelhanças
- Dom Pedro I e Fernando Collor: a história se repetiu?