Copa do Mundo: um polvo dá de dez nos astrólogos

Paul foi o único polvo na História a protagonizar uma coletiva de imprensa. A bizarrice aconteceu em 2010, às vésperas do jogo Alemanha e Espanha na Copa do Mundo.

Nenhum astrólogo jamais chegou perto dessa marca: acertar o vencedor de uma série de oito partidas na Copa do Mundo, e tudo isso sem dizer uma palavra ou levantar qualquer mapa. O autor desta façanha foi um polvo chamado Paul – em homenagem ao personagem Der Tintenfisch Paul Oktopus, do autor alemão de histórias infantis Boy Lornsen. Será que o mapa de Paul pode nos ajudar a entender por que exatamente ele, dentre milhões de outros animais, tornou-se subitamente famoso com seus fictícios dons?

Paul nasceu em algum momento de janeiro de 2008, no Sea Life Centre de Weymouth, Inglaterra (em 26 de janeiro, segundo a Wikipedia, mas sem fontes fidedignas). Depois foi transportado para outra instituição da mesma rede, o Sea Life Centre de Oberhausen, na Alemanha. A rede de TV americana CNN chegou a dar espaço para uma mulher que supostamente o teria capturado em abril de 2010 ao largo da ilha de Elba, no Mediterrâneo, mas, ao que tudo indica, trata-se de uma impostora. Mais provavelmente o polvo é um espécime nascido em cativeiro e legítimo cidadão britânico.

Tornou-se conhecido no mundo inteiro por “prever” corretamente os resultados da Seleção Alemã no Mundial de 2010, na África do Sul. Antes dos jogos, Paul era colocado perante duas caixas com mexilhões, que é o alimento da espécie: uma com a bandeira alemã, outra com a bandeira da seleção oponente. A caixa escolhida para se alimentar era interpretada como uma previsão do vencedor do confronto. Na Copa do Mundo de 2010, Paul previu a queda da seleção Alemã nas semifinais e a conquista do terceiro lugar, tendo acertado todos os palpites da campanha (7 jogos). A previsão sobre a derrota para a Espanha foi seguida por cerca de 20 estações de televisão internacionais.

Também acertou o palpite para a grande final, entre Espanha e Holanda: novamente apostou nos espanhóis, que ficaram com seu primeiro título mundial. Paul morreu de causas naturais em 26 de outubro de 2010 enquanto descansava. (Wikipedia)

O misterioso mapa do polvo

Jamais saberemos o mapa de Paul, cujo Sol pode estar no final de Capricórnio ou em Aquário. Contudo, observando as efemérides para janeiro de 2008, é fácil constatar que o aspecto dominante naquele período, presente no céu durante o mês inteiro, foi a oposição entre Marte no final de Gêmeos e Plutão na passagem de Sagitário para Capricórnio. Janeiro de 2008, é bom lembrar, foi o mês da primeira entrada de Plutão em Capricórnio, tema que motivou, na época, uma grande quantidade de artigos astrológicos. O aspecto Marte-Plutão caracteriza seus portadores como pessoas com muita energia – às vezes chegando a extremos de violência – e com uma dose de turbulência que precisa ser descarregada de alguma maneira. Não é raro, pois, encontrar Marte em aspecto com Plutão em indivíduos ligados ao esporte.

Outra configuração muito comum em atletas e em indivíduos ligados a atividades de risco – esportes radicais e aventuras, por exemplo – é a presença de aspectos tensos Marte-Júpiter. Se Paul nasceu nos primeiros dias de janeiro de 2008, seu mapa ainda apresenta uma conjunção Plutão-Júpiter, com ambos recebendo a oposição de Marte. Júpiter é também um clássico significador de profetas e gurus. Paul exerce seus supostos dotes premonitórios enfiando os oito tentáculos em reservatórios de comida adornados com bandeirinhas dos países em disputa. Tentáculos têm analogia com braços, e nada mais natural do que esperar que um “polvo-profeta” com Marte em Gêmeos se comunique utilizando uma parte geminiana do corpo (Gêmeos rege braços e mãos, no sentido literal e figurado).

É claro que Paul foi uma grande brincadeira da mídia. Mas seu desempenho não deixa de causar espanto, já que a chance de acertar em sequência o resultado de oito partidas de futebol é de apenas 0,65%. Astrólogos que passam anos aperfeiçoando técnicas preditivas não chegam a tanto.

Como se explica que um polvo esfomeado tenha conseguido um resultado melhor do que a maioria dos astrólogos do planeta? A resposta é simples: ao contrário de outras aplicações da Astrologia, a investigação de resultados esportivos ainda é uma “terra de ninguém”, com poucos trabalhos estatísticos e pouca investigação consistente. A maioria dos astrólogos ainda insiste em utilizar cartas nacionais (o mapa da Independência do Brasil, por exemplo) para prognósticos de competições esportivas, mas quem garante que uma equipe de futebol reaja em consonância com o mapa de seu país? Muitos astrólogos – inclusive este que agora escreve – já caíram do cavalo por causa dessa conexão enganosa. Outros, que trabalharam não com a carta nacional, mas com o mapa do técnico e dos principais jogadores, chegaram a resultados melhores, se bem que também não conclusivos. A verdade é que nós, astrólogos, ainda estamos longe de um consenso nesta área, o que acaba transformando a previsão esportiva numa espécie de mergulho em águas turvas. E, convenhamos, de águas turvas o polvo-profeta entendia bem mais do que nós!