Aforismos Vênus-Saturno
Segundo Charles Carter, astrólogo inglês, há uma grande incidência de suicidas portadores de contatos entre Vênus e Saturno.
A despeito de haver uma lógica nesta afirmação, haja vista a tendência autodestrutiva e eventualmente depressiva do indivíduo, assim como uma autoestima prejudicada, este é o tipo de afirmação que deve ser melhor investigada. Geralmente quando um astrólogo diz que há “grande incidência”, ele está dizendo isso fundamentando-se em sua experiência de pesquisa, que não envolve muitos mapas, na maioria das vezes, e sim apenas “uma boa quantidade”, o que, convenhamos, é um número por demais subjetivo.
As afirmações restantes de Carter sobre os aspectos Vênus-Saturno são um verdadeiro filme de terror. Há certamente fundos de verdade nas afirmações abaixo, mas procurem observá-las com espírito crítico, considerando que dizem respeito a indivíduos que não se trabalham e permanecem num nível de consciência mais infantil e ordinário. As afirmações são as seguintes:
- Caráter exigente e egoísta, dado a um ciúme mesquinho que invariavelmente leva os outros ao aborrecimento.
- A pessoa teme tanto ser abandonada, pensa nisso tanto que termina fazendo acontecer. Via de regra, quanto mais Vênus-Saturno ama, mais sofre pela possibilidade de um dia vir a perder o objeto amado.
- Manifestações sociais de insensibilidade (a despeito de toda a sua sensibilidade interna) e expressões súbitas e inesperadas de severidade e antipatia (estilo “respostas cortantes”).
- Podem ser, entretanto, especialmente devotados e fiéis a algumas poucas pessoas que conquistam seu afeto.
- Fixação em um dos pais, que é mantido como refém inconsciente: por mais que o indivíduo reclame de um dos pais, nunca se desliga dele.
- Este aspecto retarda a felicidade afetiva. A pessoa só é feliz no amor quando envelhece. Na juventude: amores não correspondidos, atrações que trazem infelicidade.
- Via de regra, ou a vida é excepcionalmente triste, com muitos infortúnios que poderiam ser o roteiro de uma novela, ou então os revezes normais são vividos como desgraças anormais.
- A pessoa insiste em ser infeliz.
A visão de Aubier é mais branda para o aspecto:
- Pessimismo amoroso: a pessoa é muito sensível a situações de abandono e rejeição, e não lida com isso bem.
- Imagina sempre que as coisas “vão dar errado” ou “não vão durar”. No fundo, é tudo fruto de algum traumatismo originário da infância.
- A avidez afetiva e a tendência a ficar constantemente reivindicando atenção sugerem um espírito inquieto, que duvida sempre do sentimento dos outros, quando na verdade, se fosse sincero, perceberia que não pode ter certeza nem mesmo a respeito dos próprios!
- Tendência a moralizar o comportamento sexual e afetivo dos outros, com ares de falso moralista, mas só faz isso quando não está amando e sendo amado.
Por fim, devo dizer que este é, de fato, um dos mais difíceis aspectos que alguém pode apresentar num tema astrológico. Costumo dizer que a pessoa que apresenta este posicionamento está vivendo uma espécie de “intensivo de aprimoramento da alma”, de modo que, quando Vênus-Saturno opera num mapa, é imprescindível que o indivíduo realize alguma espécie de terapia, caso contrário será sempre vítima de si mesmo.
Anna Becker, astróloga e ex-presidente da Associação Bahiana de Astrologia (falecida em 2009), costumava fazer uma comparação interessante. Segundo ela, os aspectos de Saturno são como “erros de programação” em nosso HD da alma. Estas “falhas”, que fazem nossa tela mental ficar toda azul com o aviso de erro-erro-erro são, entretanto, preciosas, pois são elas que nos fazem querer investigar nosso HD. A falha de programação de Vênus-Saturno é pensar imediatamente, quando ama: “vai acabar”.
Vênus-Saturno é a mais séria “trava” de um HD da alma, pois costuma afetar o indivíduo por mais consciente que ele seja. A compulsão a negar o amor é tão poderosa que a pessoa percebe que está fazendo o jogo errado, mas insiste em fazê-lo, enquanto uma parte sua se desespera ao ver toda a coisa se repetir. No caso de Vênus-Saturno, a problemática é clara: quando está amando, quanto maior for este amor, Vênus-Saturno não cessa de pensar que vai acabar, que tudo findará, que tudo é impermanente etc. E, fixado no futuro possível, não vive o gozo do presente, ou o vive tristemente. Por isso mesmo, tende a ocorrer um destino comum para a maioria das pessoas com este aspecto (mas, felizmente, não para todas): um casamento com alguém que a pessoa não ama tanto, para que assim possa se sentir “em paz”.
O que a pessoa não percebe é que não é um “destino externo” que a conduz à infelicidade afetiva. É ela mesma. Vou contar a seguir uma história (verdadeira) que ilustra perfeitamente como pode funcionar a manifestação patológica deste posicionamento.
“Nunca vi alguém mais lindo em minha vida!”
Tenho uma colega psicóloga, uma mulher linda de quase 40 anos, que além de beleza é dotada de invulgar inteligência. De uma forma inesperada, como só mesmo o amor é capaz de fazer, ela se viu arrebatada pela paixão de um homem muito bonito, de pouco mais de 30 anos, que demonstrava estar completamente apaixonado por ela. Ele não apenas verbalizava que a amava, como demonstrava na prática, dando-lhe presentes e fazendo o que a pessoa Vênus-Saturno mais gosta que façam: não parava de elogiar sua beleza. Podem acreditar: não importa o quanto a pessoa Vênus-Saturno seja inteligente, espirituosa ou madura, tudo o que ela quer é que a achem linda. A expressão de um afeto puro, brincalhão e infantil é tudo o que uma pessoa com este aspecto mais necessita a fim de exorcizar seus fantasmas.
Entretanto, eis que após alguns meses de amor-de-filme, com direito a ela ser erguida no meio da rua na frente de todos pelo namorado, que gritava em altos brados: “Nunca vi alguém mais lindo em minha vida!”, o erro do HD começou a operar. Sua parte oculta sabotadora começou a catar cabelo em ovo:
“Ele é mais novo do que eu, e quando eu tiver 50 ele vai ter 40, vou ser corneada!” “Ele só está comigo porque vê em mim a imagem da mãe.” (Essa é ótima, é bem viagem de psicólogo…)
“Ele ontem me disse quatro vezes que me amava. Hoje só me disse uma. O amor dele está diminuindo.” (É a velha história do poço sem fundo Vênus-Saturno: não importa quanto ele receba, é sempre pouco, e se for muito ele estará sempre medindo, comparando, sem relaxar.)
Resultado: do nada, numa viagem que fizeram juntos, ela resolveu torpedear o namorado com “opiniões” que explanavam – convincentemente, diga-se de passagem – que ele na verdade não a amava, que era tudo uma ilusão, projeções e carências. Sabem o que aconteceu? Ela conseguiu! Foi tão convincente, cética e apontou tantos detalhes que colecionava, que ele terminou de fato colocando em dúvida o próprio amor que sentia!
Quando ela se tocou do que fez, e ciente que era do lado Vênus-Saturno que a habita, ficou arrasada. Mas serviu enormemente como um golpe, uma forma de perceber que a vida sempre dispunha o amor para ela. Ela é quem não aceita o amor e o afasta com suas cobranças, paranoias, com a evidente e escrachada demonstração de fragilidade quando ama. De uma forma positiva, entretanto, isso serviu para que ela tivesse uma consciência mais plena ainda de como funcionava esta falha em seu HD anímico.
Leia também os outros artigos da série de Alexey Dodsworth:
Cláudio Nélio diz
Excelente artigo! : )