No artigo Quíron, Peixes e a ferida aberta dos anos sessenta mostramos que o diretor Guillermo del Toro é libriano, mas foi através de sua porção Peixes que criou o poético e lírico A Forma da Água. Também contextualizamos a época em que se passa a história: um período em que Urano e Plutão em Virgem formavam oposição ao asteroide Quíron no signo de Netuno. Se você leu aquela introdução, agora é possível começar a entender o filme.
A Forma da Água é repleto de elementos piscianos
A Forma da Água é marcado do início ao fim por simbolismos piscianos – além da violência do pior uso de Plutão e Urano – em diversos elementos e detalhes.
A começar por sua protagonista, Elisa. A jovem é muda como um peixe. É assim porque sofreu violência precoce quando bebê (a crueldade já citada como uma das marcas dos filmes de Del Toro). Sua laringe foi cortada violentamente e a neném foi encontrada na beira de um rio, lugar associado a Peixes. Marcada pela violência e por um rio, novamente irá encontrar ambos mais tarde. Vida que se repete, como a de todos nós.
Apesar de não falar, seu mundo é cheio de colorido e ritmo, conforme mostra a parte inicial do filme. O melhor amigo dela é um pintor, profissão pisciana (bem como ser músico, artista, fotógrafo etc). Juntos, eles assistem à produção cultural hollywoodiana, com seu glamour, romances, sapateados, em momentos de deleite altamente ligados ao décimo-segundo signo (se você, como a autora, ama cinema, tem um pé em Peixes ou Netuno em destaque). Elisa tem um coração boníssimo, e todas as manhãs prepara ovos cozidos para levar para o seu lanche e também presentear o pintor, um sujeito simpático, solitário e à margem do sistema.
Peixes rege os pés, e a protagonista ama belos sapatos, que espia nas vitrine. Ela é órfã (pessoas com fortes marcas piscianas muitas vezes se sentem desta forma), trabalha como faxineira (serviços de limpeza são regidos por Virgem, signo complementar a Peixes) e sua melhor amiga é uma colega que a protege e para quem o mutismo de Elisa é perfeito, pois fala pelos cotovelos, sempre reclamando do marido ou de qualquer outra coisa. A amiga seria a sua contraparte virginiana, reclamona, eficiente, mas prestativa.
Ambas trabalham em um grande laboratório, mantido por militares. Locais secretos pertencem ao 12º signo. Nele está sendo mantido um grande aquário que abriga uma criatura com traços humanizados que consegue respirar fora da água por algum tempo, mas que precisa voltar sempre ao seu habitat.
A época é a da corrida espacial e da guerra fria, e cogita-se, assim, enviar a exótica criatura para a Lua. Há um cientista russo infiltrado fascinando por estudar um ser tão diferente. Mas a criatura, contudo, se torna a diversão do cruel chefe de segurança, que começa a provocá-la e maltratá-la. O chefe é um homem totalmente desprovido de empatia (assim como o capitão de “O Labirinto do Fauno”), frio, violento e abarrotado de preconceitos. Acha ser o topo de linha do que seria um ser humano superior e enxerga pessoas de origem africana, empregados, criaturas fantásticas, portadores de alguma deficiência ou quem quer que esteja à margem do sistema como seres de segunda ou terceira categoria.
A doce protagonista pisciana
Musical, silenciosa, leve e esperançosa, Elisa vive uma vida normal. Ela coloca um toque de prazer na sua rotina, que inclui seu momento de masturbação na banheira, a preparação de seus ovos, a visita a seu amigo pintor. Vivendo um pouco no “mundo na Lua” (característica pisciana também), chega sempre atrasada no trabalho, mas sua colega e amiga a deixa passar na frente dela para bater o ponto, o que, é claro, não agrada quem está na fila.
Apesar de levar uma vida normal, a moça sabe que não é considerada assim. Tem consciência de que está à margem, condição associada ao simbolismo de Peixes (signo dos loucos, doentes, frágeis, sensíveis, pobres, mas também dos gênios, artistas, santos, poetas, criadores etc.). É assalariada, muda, órfã, sem marido e filhos e trabalha como faxineira. Mas nem por isto é infeliz. Ela sabe como criar um mundo interno próprio muito rico e especial, em um dom secreto que também pertence a seu signo.
Quando descobre que há uma criatura exótica no laboratório, ao invés de temer, ela procede como nativa do elemento Água (Câncer, Escorpião e Peixes): tenta se aproximar. Teria tudo para ficar longe do que poderia ser um monstro, visto que presencia o resultado do que teria sido um embate sangrento entre ele e o chefe de segurança. Este último, em uma cena no banheiro do local, onde encontrou Elisa e sua colega fazendo a limpeza, já tinha mostrado toda a sua carga de preconceitos e arrogância.
Acostumada a ser socialmente preterida, a moça não trata o ser do aquário desta forma, e tenta iniciar uma terna amizade, oferecendo seu presente predileto: ovos cozidos. O ser está enfurecido por ser cutucado, maltratado, machucado e tripudiado, mas aos poucos percebe que a suave jovem não tem medo dele, e que tampouco pretende ou pode machucá-lo. Começa, então, uma silenciosa e delicada interação entre os dois, quando Elisa passa a gostar de visitar secretamente a criatura.
Comunicação poética de Peixes
A interação entre Elisa e criatura passa a se dar por gestos e olhares. Peixes rege toda linguagem não verbal, e, assim, não é à toa que a protagonista é muda. É o auge do arquétipo deste signo. Imagens e sons são elementos da arte pisciana. E, quando opta por palavras, prefere as letras de música e a poesia. Ele quer atingir a sensibilidade, o sentimento, a alma, e por isto guarda em si o sensível, o transcendente, o frágil e o mágico. A arte pisciana é feita para tocar diretamente o coração. Para a Astrologia, Netuno, o regente deste signo, abrange aquilo que é difícil de se colocar em palavras. A conexão com o Universo e o Divino, por exemplo, é representada por este planeta.
Começo de uma relação
E o amor entre Elisa e a criatura nasce do olhar. O olhar é o código dos enamorados. Mas quantas pessoas não se olham mais depois de estarem juntas? É um simbolismo para não enxergarem mais de fato. Quantas vezes o beijo, o toque e a delicadeza são esquecidos ao longo do tempo, da rotina e da repetição? Elisa, que sabe dar vida e cor a sua rotina simples, enxerga a alma da criatura, que, por sua vez, passa a ver a dela também.
Segundo o chefe da segurança, a criatura aquática era venerada e considerada um deus na Amazônia, onde teria sido capturada. No laboratório, porém, tornou-se um animal maltratado, enfurecido e perigoso, capaz de mutilar com sua enorme força. O traço cruel do ser humano muitas vezes gerando monstros que criam outros monstros.
Peixes: o signo que vê os que não são vistos
O décimo-segundo signo é o da empatia. Aquele que enxerga os que são ignorados, como a psiquiatra Nise da Silveira fez com os pacientes de casas de internação ao revelá-los através da pintura. Então, para o olhar de Elisa, há inteligência e ternura nos olhos no ser aquático. Eles se miram através de vidros grossos ou interagindo à beira do tanque. Apesar das mãos com garras cortantes e brutalmente afiadas, ele toca com leveza na frágil moça e aceita seus presentes.
Continue lendo: Amor de Vênus em Peixes: uma entrega profunda
Outros artigos sobre Astrologia e Cinema:
Luciana Sousa diz
É interessante, não? Também achei uma excelente produção. Michael Shannon fez um ótimo trabalho no filme. Eu vi que seu próximo projeto, Fahrenheit 451 será lançado em breve. Acho que será ótimo! Adoro ler livros, cada um é diferente na narrativa e nos personagens, é bom que cada vez mais diretores e atores se aventurem a realizar filmes baseados em livros. Acho que Fahrenheit 451 sera excelente! Se tornou em uma das minhas histórias preferidas desde que li o livro, quando soube que seria adaptado a um filme, fiquei na dúvida se eu a desfrutaria tanto como na versão impressa. Acabo de ver o trailer da adaptação do livro, na verdade parece muito boa, li o livro faz um tempo, mas acho que terei que ler novamente, para não perder nenhum detalhe. Vi os horários de transmissão em: br.hbomax.tv/movie/TTL711416/Fahrenheit-451 deixo o link por se alguém se interessar. Acho que é uma boa ideia fazer este tipo de adaptações cinematográficas.
Vanessa Tuleski diz
Agradecendo a cada um dos comentários, que me emocionaram (Peixes) muito! ♥ Abraço grande para todos!
Mariana diz
Sou capricorniana com ascendente em peixes e aspectos e com forte influência de Netuno no mapa. Estou verdadeiramente encantada com sua maestria em interpretar o filme à luz da astrologia. Nunca li um texto tão belo com essa analogia. Parabéns, de coração.
Magda von Brixen diz
AMEI, Vanessa! Perfeição sua interpretação desta obra prima… Era meu favorito para o Oscar e levou. Bom sinal: a emoção e o amor tocando os jurados neste 2018!
Ana Oliveira diz
Magistral a interpretação deste filme sob as lentes netunianas. Conheço muita gente de Peixes ou com Ascendente Peixes (hihihi) e com quiron em peixes em oposição a plutao (urano já está fora do esquema, a conj acontece mais tarde). Eu ainda não vi o filme mas à medida q lia perguntava-me se o final seria o inevitável (de q a maioria das pessoas está à espera). Depois percebi q Toro foi fiel a si mesmo… e adorei. Que maravilha Vanessa Tuleski! ♡ ☆☆☆☆☆
Solange diz
Muito boa a sua análise sobre este filme. Acho interessante também que para cada coisa existe uma associação astrológica. Por exemplo, sapato – peixes, faxina – virgem, etc.
Gostaria de saber se existe algum dicionário astrológico para estes termos , rsrsrs. Parabéns pela sua interpretação!!!
Vanessa Tuleski diz
Muito obrigada, Solange! Tem um livro, sim, sobre o que é de cada signo e até planeta, mas em inglês: “The Rulership Book – A Directory of Astrological Correspondences”, Rex. E. Bills (https://www.amazon.com/Rulership-Book-Directory-Astrological-Correspondences/dp/B0030T7GJG).
Solange diz
Muito obrigada pela dica.
Um grande beijo
Wanilda do nascimento diz
Minha cara Vanessa
Nem preciso dizer que a pisciana aqui amou de paixão a sua forma de descrever este filme.
Encantadora…
Lia Domingues diz
Vanessa, adorei…
Sua análise tem a delicadeza com que Del Toro trata os assuntos dos filmes.
Impressionante como os filmes refletem o momento dos céus!
Obrigada. 🙂
Beijocas!!
José Dagostim diz
Vejo muito de virgem neste filme não somente a limpeza/faxina, mas a rotina e a cura que está fortemente presente no arquétipo de Virgem. E Virgem é o CURADOR, Peixes o MESTRE, e quando o Curador encontra o Mestre o milagre acontece…