O lápis contra a metralhadora. Je suis Charlie. Estas são as novas palavras de ordem após o ataque terrorista de um grupo ainda não identificado à redação do jornal satírico Charlie Hebdo, em Paris. Os mapas da fundação do jornal, em 1970, e do massacre de seus principais cartunistas, em 7 de janeiro de 2015, destacam conexões entre Saturno, Netuno e Plutão. Ao analisar as cartas, percebemos que a morte de George Wolinski e seus colegas não é um ato isolado, mas um episódio de um processo histórico tão antigo quanto o mundo ocidental.
Eis um resumo dos fatos marcantes da vida do jornal, publicados no site www.ladepeche.fr:
- 16 de novembro de 1970 – Na edição seguinte à morte do General De Gaulle (9 de novembro de 1970), o semanário satírico Hara-Kiri faz algumas brincadeiras de mau gosto associando o falecimento do herói nacional da França com os 146 mortos no incêndio de uma danceteria. Resultado: os admiradores do velho general se escandalizam e o Ministro do Interior proíbe a circulação do Hara-Kiri.
- 23 de novembro de 1970 – Uma semana após o fim do Hara-Kiri, a equipe de cartunistas resolve fundar um novo jornal: o tabloide semanal Charlie Hebdo. Charlie seria uma homenagem ao general Charles De Gaulle, mas na verdade trata-se de uma brincadeira com outra publicação, o Charlie Mensuel, que publicava as historietas de Charlie Brown na França. Por causa do mau desempenho de vendas, o jornal para de circular em 1982. Em 1992 volta às bancas, com forte campanha publicitária e nova direção (já incluindo vários dos cartunistas assassinados no atentado de 2015).
- 8 de fevereiro de 2006 – Charlie Hebdo publica uma série de caricaturas do profeta Maomé, em solidariedade a um jornal dinamarquês que fizera o mesmo e vinha recebendo ameaças terroristas. Processado pela Grande Mesquita da França, pela União das Organizações Islâmicas Francesas e pela Liga Islâmica Mundial, o jornal obtém uma vitória na Justiça e continua a circular.
- 2 de novembro de 2011 – Por ocasião da entrada em vigor da Charia (lei islâmica) na Líbia recém-libertada da ditadura de Khadafi, o Charlie Hebdo muda de nome, temporariamente, para Charia Hebdo. Os fundamentalistas islâmicos retaliam provocando um incêndio criminoso na redação e hackeando o site do semanário, que passa a exibir uma foto de Meca e versos do Alcorão.
Destas informações, temos, portanto, três dados importantes: o mapa solar da fundação do Charlie Hebdo e os dois momentos de máxima tensão em sua existência.
Os dois luminares, Sol e Lua, formam, cada um, fechadas conjunções com os dois planetas geracionais mais lentos e distantes (ao menos até a descoberta de Éris e outros planetas anões). Netuno e Plutão têm um ciclo de longuíssima duração, formando uma conjunção a cada 500 anos, aproximadamente. A penúltima conjunção, em 1398, corresponde à emergência do novo paradigma cultural do humanismo e do renascimento, em que a ortodoxia religiosa começa a dar lugar a uma cosmovisão mais antropocêntrica. Já a conjunção mais recente, na última década do século XIX, coincide com o surgimento dos meios de comunicação de massa, como o rádio, as grandes cadeias jornalísticas, o cinema e as histórias em quadrinhos. O ciclo Netuno-Plutão rege, portanto, a indústria cultural e todo o seu poderoso impacto na educação difusa das massas e na formação de uma opinião pública mais qualificada e exigente.
Se a primeira história em quadrinhos voltada para o consumo de massa surge exatamente sob a conjunção Netuno-Plutão em Gêmeos, o mapa de fundação do Charlie Hebdo, com o Sol em conjunção com Netuno em Sagitário (signo oposto) e a Lua conjunta a Plutão, mostra uma publicação com potencial para tornar-se um ícone em sua categoria e para vincular-se, de uma maneira ou de outra, aos grandes processos históricos relacionados ao ciclo desses dois geracionais.
Na data da publicação das charges envolvendo Maomé, em 2006, Sol e Netuno encontravam-se em conjunção, tal qual na carta de lançamento do jornal. Ambos recebiam uma forte quadratura de Júpiter, indicando um ato de exagero, excesso, transbordamento. Literalmente, o Charlie Hebdo mexeu num vespeiro que acabou se transformando na causa direta da condenação dos cartunistas pelos ativistas radicais, nove anos depois. Lua e Plutão não estavam em conjunção na carta de 1970? Na publicação das charges de Maomé, os dois planetas estão numa fechada oposição, completando a ressonância. E mais: Saturno – sempre ele – avança para uma oposição a Netuno, que se tornaria exata meses depois, no período em que o mundo desabava sobre o jornal, exigindo seu fechamento.
No mapa do atentado de 7 de janeiro de 2015, Saturno em trânsito ativa exatamente a conjunção Sol-Netuno da fundação do jornal e forma também uma quadratura com Netuno em trânsito, em Peixes. O duplo contato Saturno-Netuno exige que se recorde o padrão de interação entre estes dois planetas ao longo da história europeia. O ciclo Saturno-Netuno está ligado ao comportamento defensivo, à consciência da necessidade de formação de estruturas de proteção coletiva contra um mundo exterior visto como perigoso e hostil. Nos períodos de conjunção, quadratura ou oposição entre estes dois planetas, há uma tendência para o reforço do nacionalismo, do isolacionismo cultural, da xenofobia e dos sentimentos coletivos de vitimização (como ocorre neste exato momento com a França). É uma dinâmica algo semelhante a de Saturno-Plutão, se bem que com menos ódio visceral e violência explícita e mais fanatismo e “depressão coletiva”. Com Saturno-Plutão – o “ciclo do terror” – o diferente é demonizado e abertamente combatido; com Saturno-Netuno, as fronteiras sociais e culturais tendem a congelar. Basta pensar em meia dúzia de processos históricos, reais ou fictícios, que se iniciaram ou tiveram seu momento de maior exacerbação sob momentos críticos Saturno-Netuno:
- a Guerra Fria.
- a criação, no ano de 1128, e a condenação, duzentos anos mais tarde, da poderosa Ordem dos Templários, os monges guerreiros da Idade Média.
- a Revolução Russa e seus desdobramentos.
- James Bond, criado em livro sob uma ativação Saturno-Netuno e lançado no cinema sob outra.
- o processo de independência da América Latina, cuja autoimagem comporta até hoje um forte componente de vitimização frente à exploração ibérica e ao imperialismo americano.
Analisar o mapa do Charlie Hebdo à luz dos trânsitos atuais traz à tona, portanto, estes dois temas, sempre presentes na história do Ocidente nos últimos séculos: a questão da liberdade de expressão, relacionada ao lento emergir da sociedade da informação (Netuno-Plutão), e a rigidez dogmática no trato com as culturas não europeias. Considerando uma perspectiva histórica mais ampla, a liberdade de expressão enfrenta retrocessos ocasionais e ainda não é uma conquista plena, mas o saldo, da Idade Média até nossos dias, é altamente positivo. Já o dogmatismo presente nos confrontos civilizatórios parece ter raízes bem mais profundas, sendo facilmente reavivado a cada nova crise. O grande risco nos anos que virão é que a ação de grupos radicais, como o que conduziu o massacre na redação do Charlie Hebdo, desencadeie uma nova onda de repulsa aos “diferentes”, especialmente as minorias muçulmanas na Europa. Minoria, aliás, que não se conta aos milhares, mas ao milhões, constituindo uma percentagem cada vez maior da população de países como França, Alemanha e Itália.
Wolinski, o gênio irreverente
A mais ilustre vítima do atentado à redação do Charlie Hebdo foi o cartunista Georges Wolinski, de 80 anos, cujo estilo de humor transgressivo “fez a cabeça” de centenas de desenhistas do mundo inteiro, inclusive no Brasil. Wolinski, um tunisiano de origem judaica, nasceu em 28 de junho de 1934, com Sol em Câncer e três planetas na casa 8, tradicionalmente associada à morte.
Wolinski morreu com Saturno em trânsito sobre seu Ascendente e Netuno em trânsito na casa 3 (que rege as redações de jornais), em quadratura com o Ascendente. Parecem avisos do que vem por aí: aumento, na Europa, da xenofobia e do sentimento de autoproteção contra riscos reais e imaginários. Saturno-Netuno é um aspecto depressivo, até mais do que Saturno-Plutão. Esta é a sensação que a morte do gênio irreverente deixará na Europa, não apenas entre os cristãos mas talvez principalmente entre os milhões de muçulmanos que desejam a integração. Sobre o mapa de Wolinski, manifestaram-se diversos astrólogos na internet:
Regente da 10 na oitava conjunto a Plutão – tristemente, ele provavelmente ficará mais conhecido pela sua morte do que pela sua obra. (Pedro Ribeiro)
E ele tem uma quadratura T natal Lua-Urano-Plutão. (Edi Cavalcante)
Urano, regente da 3, mostra a escolha irreverente de comunicação, que para ele é natural. A quadratura T de Lua-Urano-Plutão-Mercúrio tem, na verdade, dois aspectos a considerar. Os signos envolvidos são compatíveis entre si, Câncer, Capricórnio, Touro, todos femininos. Portanto, mostram como ele se sentia à vontade na autoexpressão; já os graus das órbitas formando a quadratura podem indicar carma no sentido de destino, 4 graus Lua-Urano, 23 graus Urano-Plutão/Mercúrio e 3 graus Lua-Plutão/Mercúrio. Parece que, no subconsciente mais profundo, ele conhecia a possibilidade de enfrentar as consequências extremas da sua irreverência natural, mas não se importava com isso, talvez porque os signos envolvidos, todos femininos, se ajudassem e complementassem. Lua interceptada, no exílio, é corregente da casa 8. Todos os planetas na 8 interceptados, inclusive Mercúrio, o próprio regente da 8. Tem muita informação nesse mapa. Ainda se pode pensar em Urano em trânsito, a 12 graus de Áries, em sextil ao Nodo Norte, trígono ao Nodo Sul, talvez reforçando mais ainda a naturalidade com que ele encara a excentricidade de manifestação pessoal. Dá a impressão de que ele gostava muito mesmo do próprio jeito irreverente de se expressar, parece que se divertia com isto. E Júpiter, regente do mapa, em trânsito pela casa 9 dele em oposição a Saturno…. ele podia ser excêntrico, mas monótono não era mesmo, estava habituado a ser popular, uma personalidade de manifestações muito ricas em conteúdo e intensidade… (Maria Teresa Nevares)
Saturno é o primeiro dos “Grandes” a entrar em Sagitário, signo conectado não somente a questões religiosas, mas internacionais, desde que Plutão esteve aí… Eu particularmente esperava algo para quando a Lua, como ativadora, fizesse conjunção a Saturno. Refiro-me ao Plutão em Sagitário (1995-2008) justamente por tudo o que vimos acontecer por conta do fundamentalismo. (Leonardo Lemos)
Nota: as cartas do lançamento do Charlie Hebdo e do atentado de 7.1.2015 foram calculadas por Soraia Bonassar (Portugal).