Quando vemos as imagens da queda da agulha da Catedral de Notre-Dame, imagens semelhantes ocorrem à memória: o atentado ao World Trade Center, sob outra ativação Saturno-Plutão; ou mesmo o arcano 16 do tarô, que mostra uma torre fulminada, em perturbadora analogia com o que ocorreu ao templo parisiense. A conjunção Saturno-Plutão em Capricórnio, signo de Terra e significador de estruturas, fala exatamente disso: o desmoronamento de estruturas arcaicas, obsoletas, que já não servem ao propósito para o qual foram criadas. Mas, no caso de Notre-Dame, qual era exatamente este propósito? A História nos dá a resposta rapidamente.
Uma catedral para a potência em ascensão
A construção da Catedral de Notre-Dame inicia-se em 1163, mas a decisão já estava tomada desde o ano anterior, quando o bispo Maurice de Sully, com apoio do rei Luís VII, manda demolir a basílica de St. Etienne, que já existia no mesmo local. O projeto era substituir o templo acanhado e pouco atraente por uma construção impactante, cuja grandiosidade exaltasse a o poder da Igreja e do reino. A configuração celeste mais importante do período 1162-1163 é a oposição de Saturno em Sagitário a Plutão em Gêmeos (por coincidência, os mesmos planetas e a mesma polaridade de 2001, quando ocorreu o atentado ao World Trade Center).
Notre-Dame é a contraparte religiosa do projeto de consolidação da França como a grande potência da Europa medieval. Este projeto já está latente ao longo do século XII, mas se acelera fortemente sob o governo do rei Filipe Augusto, filho de Luís VII. Filipe sobe ao trono em 1180, e necessitará de quase duas décadas para consolidar seu poder, anexando feudos rebeldes, combatendo na Terceira Cruzada e recuperando aos poucos as possessões francesas do rei inglês Ricardo Coração de Leão. Feito isso, inicia o período áureo de seu reinado, quando transfere definitivamente a sede do reino para Paris e começa a investir na urbanização e enriquecimento da nova capital. Esta fase corresponde a duas importantes conjunções de planetas geracionais: Urano-Plutão em Câncer, em formação desde o final do século XIII, e Saturno-Netuno em Peixes. Urano-Plutão, um aspecto de rolo compressor, tem a ver com o processo de fortalecimento do poder real, enquanto Saturno-Netuno fala bem claramente de consolidação de estruturas religiosas.
Notre-Dame: a catedral que cresce junto com Paris
Não é casual que as obras de Notre-Dame, iniciadas no governo de seu pai, tenham ganhado a máxima velocidade sob Filipe Augusto. O novo rei quer dotar a França de um símbolo incontestável da autoridade religiosa, que é, também, um símbolo da autoridade política. Logo ao assumir, Filipe Augusto acelera as obras de tal forma que, na virada do século, sob as conjunções Urano-Plutão e Saturno-Netuno, a nave já está terminada e a catedral funciona a todo vapor. Simultaneamente, é implantada a Universidade de Paris e a capital ganha fortificações. A população salta de 25 mil para 50 mil habitantes em apenas uma geração.
Astrologicamente, Notre-Dame está ligada a estes três ciclos: Saturno-Plutão, do início da construção, e Saturno-Netuno simultâneo a Urano-Plutão, da inauguração da nave e do apogeu do reinado de Filipe Augusto.
Não há, portanto, como separar Notre-Dame da história política da França.
Quando consideramos o mapa do incêndio de Notre-Dame à luz dos ciclos astrológicos dos século XII e XIII, logo se destacam uma analogia e um interaspecto: a analogia diz respeito ao ciclo Saturno-Plutão, ativo tanto no início da construção (em órbita de oposição) quanto no incêndio de 15 de abril (a três graus da conjunção). Já o interaspecto é a oposição entre Saturno-Plutão em Capricórnio, de 2019, e a conjunção Urano-Plutão que se formava em Câncer em 1200, época da inauguração da nave da catedral e apogeu do governo de Filipe Augusto.
Das cruzadas medievais ao nacionalismo do século XXI
A França construiu Notre-Dame em plena época das cruzadas e do renascimento comercial e urbano: não exatamente por devoção a Nossa Senhora, mas como uma afirmação orgulhosa da nascente potência político-militar. É isso, muito mais do que os valores religiosos, que está em jogo neste momento.
Significativamente, enquanto Notre-Dame ardia, um outro incêndio de menores proporções fazia estragos na mesquita de Al-Aqsa, em Jerusalém, uma cidade dividida entre duas culturas. Em ambos os casos, as chamas parecem antecipar, no plano do simbólico, o dilema que se coloca diante das maiores potências: manter teimosamente os valores de civilizações baseadas no nacionalismo e na separatividade ou aceitar a realidade cada vez mais presente do multiculturalismo. Internet, migrações compulsórias e integração comercial já nos transformam, na prática, em cidadãos do mundo. Neste sentido, estruturas erigidas para afirmar a diferença entre cristãos e muçulmanos, ou para glorificar esta ou aquela dinastia de reis guerreiros, parecem condenadas a ruir, no sentido metafórico ou literal.