O culto a deuses guerreiros que portam armas de ferro seria uma exclusividade da civilização europeia de raízes greco-romanas? Uma rápida olhada no culto de orixás da Nigéria e do Benin mostrará que não.
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O fotógrafo e etnólogo Pierre Verger, que foi um dos maiores conhecedores da cultura afro-brasileira, afirma que Ogum é, provavelmente, a divindade mais popular e de culto mais difundido na África Ocidental. Pode ser considerado o orixá nacional do povo iorubano da Nigéria.
É apresentado em algumas lendas como filho de Iemanjá e Oraniã, enquanto em outras é o filho mais velho de Odudua, o fundador de Ifé (Odudua é um orixá masculino e seu culto quase desapareceu no Brasil, onde foi assimilado como um dos aspectos de Oxalá).
Ogum, o deus do ferro e o condutor de batalhas
Na condição de filho do rei, Ogum conduziu e venceu várias guerras contra os reinos vizinhos, tendo destruído a cidade de Ará e conquistado a de Irê, fato que é, aliás, tema de um ponto (cantiga litúrgica) cantado até hoje nos terreiros do Brasil.
Na África, Ogum é o deus do ferro e dos ferreiros, da guerra, da caça, da agricultura, e de todos os trabalhadores que utilizam instrumentos de ferro, como açougueiros, marceneiros e barbeiros. É fácil perceber sua identificação funcional com o Ares-Marte greco-romano e também, em parte, com o Hefesto grego.
Depois da popularização do automóvel, Ogum passou a ser cultuado como protetor dos motoristas e dos mecânicos, sendo comum, em algumas regiões da Nigéria, a prática de sacrificar um cachorro e verter seu sangue sobre o motor de um carro recém-adquirido, como proteção contra acidentes. Vemos aí um inesperado vínculo com o Ares-Eniálio de Esparta, a quem também se sacrificavam cães.
O número sete é associado a Ogum em função de uma lenda sobre a conquista de Irê, onde ele se teria dividido em sete partes para administrar as aldeias, em igual número, que circundavam aquela cidade. Por isso, os fetiches de Ogum (objetos mágicos que carregam a força do orixá) são sempre constituídos por instrumentos de metal pendurados em uma haste, em número de sete ou de seus múltiplos. Mais adiante veremos como isso também vincula os mitos iorubanos e gregos.
Outros símbolos do orixá são a espada e o Mariuô (do iorubano màriwò), saiote de folhas desfiadas do dendezeiro que, além de servir de vestimenta em determinadas cerimônias, pode ser também pendurado sobre as entradas da casa para proteger de más influências e espantar os eguns (espíritos dos mortos).
Os locais consagrados a Ogum normalmente situam-se ao ar livre (como ocorria também com o Ares grego), às vezes protegidos por uma cerca de plantas nativas chamadas peregun (Dracena), e são palco de sacrifícios periódicos de seus animais preferidos, o cão e o galo, acompanhados de oferendas de vinho de palma, feijão, inhame cozido e azeite de dendê.
Ogum, o que assa o marido no fogo e a mulher no fogareiro
De acordo com as lendas, Ogum teve uma vida amorosa bastante agitada. Entre suas mulheres, contam-se Oiá (Iansã), Oxum e Obá. O orixá Oxóssi às vezes aparece como um de seus filhos. Ogum é temido e respeitado pela violência e natureza guerreira: um juramento feito em seu nome é considerado o mais solene de todos e digno de absoluta confiança. Alguns oriki (cantos de louvação) falam com bastante eloquência do temor provocado pelo orixá, como estes recolhidos por Pierre Verger:
Ogum que, tendo água em casa, lava-se com sangue.
Ogum come cachorro e bebe vinho de palma.
Ele mata o marido no fogo e a mulher no fogareiro.
Ogum que come vermes sem vomitar.
As semelhanças com o Ares grego são bastante evidentes, especialmente no que diz respeito às explosões de fúria imotivada. Apesar de popular, Ogum é temido pela violência incontrolável e espantosa que é capaz de demonstrar quando provocado. As imagens que falam de sangue, de cães e de fogo também são inequívocas nas referências a características marcianas.
Ogum-São Jorge, oficial da Marinha do Brasil
Ogum é um dos orixás mais populares no Brasil. Perdeu, todavia, os atributos de protetor da agricultura e da caça, que passaram a ser identificados exclusivamente com Oxóssi, e tornou-se conhecido sobretudo como deus da guerra, sendo sincretizado na Bahia com Santo Antônio de Pádua e nos outros Estados, especialmente o Rio de Janeiro, com São Jorge.
Em função do sincretismo e da forte presença negra entre as tropas brasileiras, esses santos passaram a receber honras militares, o que incluía até mesmo patentes de oficial no Exército e na Marinha, com direito a soldo!
Cabe lembrar que os negros constituíam maioria entre os soldados e marinheiros que lutaram na Guerra do Paraguai. As tropas jamais deixaram de invocar a proteção de Ogum, seja diretamente ao orixá, seja na forma de São Jorge, o que talvez explique algumas expressões presentes nos pontos cantados, como Ogum jurou bandeira nos campos do Humaitá.
A hipótese se torna ainda mais forte quando lembramos que Humaitá é o nome de uma localidade onde ocorreu uma das mais importantes batalhas daquela guerra, sendo ao mesmo tempo o nome atribuído à região do mundo invisível — o orum — que se acredita seja a morada de Ogum.
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José Dagostim diz
Filho de Ogum
Lutei num campo sinuoso, onde o trajeto pedia a lei e a ordem, talvez, uma analogia com meu pragmatismo. Quando retornava da guerra, cansado e assustado das batalhas, abriu-se um expressivo portal, uma passarela. Caminhei assustado com o ambiente. No corredor cruzei com o arquétipo do aprendiz, acenei e segui em frente. Uma larga abertura no final do corredor deixava-me apreensivo, pois um lampejo me atormentava: será que morri? Na intenção de retornar ao corpo, impeli a porta, neste instante percebi a presença de uma energia negativa, recuei. A porta se abre e dela sai uma alma feminina, uma mulher de presença, serena e curadora. Com uma voz tranquilizante, fala-me: – Olá Filho de Ogum! O que você deseja? – Quero voltar para casa, respondo. – Então me siga! Acordei!
José Dagostim
Teresa Rivero diz
No candomble da Bahia,Sao Jorge e sincretizado com Oxossi,ocaçador.
consuelo pamplona diz
Que riqueza de informações. Sinceramente agradecida.