O tabu do individualismo
O processo de rejeição quanto a signos
solares é talvez uma das maiores ilusões de quem estuda
Astrologia. De uma forma ou de outra aquela expressão arquetípica
não reconhecida e não integrada ressurgirá
na forma de alguém que tem o regente daquele signo em grande
evidência no mapa. Pode acontecer de evitarmos quaisquer pessoas
cuja sinastria mostre o tal regente em condição aflitiva
com algum fator de nosso mapa. Não adianta. Aquilo estará
presente no trabalho, na família, nos filhos e até
andando na rua. Vamos vivenciar o arquétipo de qualquer maneira.
É possível, então, que a melhor solução
seja compreendê-lo e assimilá-lo nos períodos
em que ele precisa estar presente, mas sem jamais recalcá-lo.
A sociedade também tem expressões arquetípicas
na organização social - o "bom" e o "ruim"
- sob a ótica do preconceito. Um ótimo exemplo é
a prostituição. Somos preconceituosamente levados
a crer que toda e qualquer prostituição é um
mal e que as pessoas que a isso se prestam na verdade não
prestam. Quão hipócrita é nossa sociedade,
isto é, todos nós! A prostituição só
existe porque muitos senhores e até senhoras distintas a
alimentam, mesmo quando a criticam após terem dela se utilizado.
Seja de forma direta, no contato carnal, seja de forma indireta,
nos vídeos e revistas. Muitos tabus sociais, aliás,
fazem parte do simbolismo da casa 8 e de Escorpião. Tudo
o que se relaciona com a excreção e com o sexo precisa
ficar entre quatro paredes, escondido, considerado perverso e nocivo.
A saliva, quando sai do corpo, é "nojenta", mas
enquanto permanece dentro da boca é normal. A prostituição
e a sexualidade, enquanto relegadas ao "submundo", estão
ilusoriamente separadas do restante da sociedade. Entretanto, a
prostituição faz parte da sociedade, por mais que
se deseje segregá-la. Não deve ser pequeno o número
de pessoas que criticam programas eróticos, mas que se excitam
ao vê-los. O que se depreende disso? Que há necessidade
de um meio-termo. Que nem defendermos fanaticamente a prostituição
nem rejeitá-la é a solução.
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A guilhotina na Revolução Francesa:
exemplo de como ideais de fraternidade podem gerar dor quando
aplicados de forma incompleta. |
Outro tabu muito bem disfarçado é o
do individualismo, tão condenado nas sociedades modernas,
onde o indivíduo, no sentido sociológico do termo,
"não pode existir". Relacionado a este tabu está
o signo de Áries e o planeta Marte. Agir isoladamente significa,
para este paradigma, egoísmo e falta de consciência
social. A sociedade reage quando alguém deseja agir por si.
Quão egoísta é a sociedade (nós), que
impede o indivíduo isolado de realizar-se em suas necessidades
pessoais e só aceita o que ela crê estar dentro de
seu escopo! Contudo, palmas para a sociedade, que é a base
do desenvolvimento individual. Que paradoxo!
Astrologia é uma prática limitada a
um círculo de elite. Poucos são os astrólogos
que se dignam a dedicar esforços a comunidades carentes e
a pessoas que realmente precisam de orientação, mas
não podem pagar. Gostamos de ver a nós mesmos como
idealistas e altruístas. Um símbolo bastante aquariano,
diga-se de passagem. Se somos tão altruístas e desinteressados,
então por que nós, incluindo quem tem o Sol em Aquário,
não estamos empenhados, todos, em projetos humanitários?
A resposta talvez seja: porque somos humanos e também somos
limitados. Isso vai imediatamente ao encontro dos gravíssimos
problemas sociais do Brasil e do mundo que todos nós insistimos
em não perceber ou acreditamos não ter meios para
mudar. Para mudar, não basta apenas compaixão (Peixes)
e idéias (Aquário), é preciso organização
(Virgem-Capricórnio) para aplicá-la. Não basta
apenas organização, é preciso coragem (Áries-Leão-Escorpião)
para iniciá-la. Não basta apenas coragem, é
preciso bom senso para não sermos injustos (Libra). Não
basta apenas bom senso, é preciso conhecer cada contexto,
núcleo social, linguagem e sociedade para não explodirmos
em conflitos culturais (Sagitário-Câncer-Gêmeos).
Não basta tudo isso. É preciso continuar a tentar
indefinidamente (Touro).
É muito importante que cada um, dentro de
suas limitações, faça sua parte. Igualmente
importante é saber que tudo se desenvolve e que os limites
de hoje podem ser os alicerces de amanhã. A junção
de todos os atributos considerados no par[agrafo anterior é
o esforço para alcançar uma expressão verdadeiramente
mais humana. Não estou fazendo uma convocação
para todos largarem tudo e se dedicarem aos pobres, mas para que
todos tenham consciência de que é preciso fazer sua
parte. Todos somos responsáveis pelo mundo em que vivemos.
Dentro das Possibilidades Amorosas da Astrologia
está seu potencial para a distribuição de conhecimento
acerca do ser humano. Isso seria a partilha de percepções
que podem, algum dia, melhorar nosso processo de vida neste planeta
já tão maltratado por nossa ânsia de sobrevivência
e por nossa compreensível ignorância. Também,
em se tratando das possibilidades amorosas, no sentido mais amplo
do termo, a Astrologia, como estudo transdisciplinar, pode ser utilizada
em paralelo com as ciências sociais, sobretudo com a Antropologia
Cultural. Conhecer as motivações dos indivíduos
de acordo com suas culturas pode ser mais fácil se dispusermos
da disciplina astrológica de traçar correspondências
entre realidades aparentemente isoladas. Como astrólogos,
podemos aventar a hipótese de um dia termos chegado ao ponto
de elevarmos a Astrologia à categoria de estudo importante
para a sociedade. O potencial conscientizador de nossa arte talvez
contribua para uma vida menos sofrida não por eliminar o
sofrimento, mas por levar o Homem a compreender sua função
e terminá-lo tão logo possível.
Ama a teu próximo
como a ti mesmo
Talvez uma das melhores contribuições
da Astrologia para o desenvolvimento de uma consciência de
fato amorosa, no sentido mais completo da expressão, seja
a percepção do processo de total-inclusão.
Mas como chegar a uma atitude todo-inclusiva? Não
sei dizer ao certo. Sei que faz parte de um processo gradativo e
que a cada passo somos mais capazes de unificar fatores. Cada passo,
aliás, não livre de muitas crises e dores, diga-se
de passagem. Isso faz lembrar da psicologia junguiana, que parece
ter uma das chaves para a total-inclusão quando demonstra
a projeção da sombra inconsciente em pessoas e circunstâncias.
A sombra nada mais é que algo que faz parte de nossa totalidade
inerente, mas que não reconhecemos e segregamos. Como o universo
é todo-inclusivo, e como somos análogos a ele, os
processos interiores e exteriores ao Homem se refletem e se interinfluenciam
mutuamente numa total interdependência. Dentro desta visão
todo-inclusiva, não parece haver dissociação
entre os eventos factuais e a vida interior humana, chamemo-la psíquica,
mental ou espiritual.
Levando tudo isso em conta, não seria estranho
dizer que "amar o próximo como a si mesmo" significa
entender que tanto aquela pessoa que nos incomoda quanto aquela
que nos dá prazer são partes de nossa própria
totalidade esquecida. São reflexos do que está dentro
de nós. Mais ainda: aquela expressão externa não
pode ser eliminada, pois equivaleria a eliminar a nós mesmos
(a típica relação entre Jeckill e Hyde). Não
importa que rejeitemos a presença de uma pessoa, que a segreguemos
e nem que ela seja morta. Aquele mesmo aspecto sempre ressurgirá
vestido com as roupagens mais variadas de acordo com nosso momento
de vida. Acontece assim porque não se trata apenas de uma
circunstância externa, mas de uma expressão de partes
de nossa totalidade das quais não estamos conscientes. E
assim continuará acontecendo até que nos tornemos
conscientes de que é preciso "incluir", ou seja,
amar. Felizmente ou infelizmente, não sei, o processo de
inclusão pelo amor é gradativo. É através
das experiências cruciais ou extremas que tomamos consciência
de seus anversos. Não podemos esquecer: somos limitados.
Nossa consciência percebe a Realidade (com "R" maiúsculo)
através dos contrastes, da dualidade. Como diz o cantor e
compositor Lulu Santos numa de suas músicas:
Não existiria som se não houvesse o
silêncio
Não haveria luz se não fosse a escuridão
A vida é mesmo assim
Dia e noite, não e sim
Restrição: um ato
de amor
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