A pesquisa de astrologia contemporânea se faz necessária para que não se perca o registro do que ocorreu em nossa comunidade astrológica antes da internet. Com o advento do mundo digital, a divulgação do que é realizado ficou mais a nosso alcance. Mas o que não teve essa repercussão, se perderá. Se os dados dos trabalhos realizados não forem publicados e marcados, eles serão esquecidos, visto que estão guardados apenas na memória das pessoas. Na verdade, talvez muito já tenha sido perdido.
Trata-se de um registro difícil de ser feito porque depende do depoimento de pessoas que passem as informações pertinentes. Estamos falando de um tipo de história oral. Depois da coleta de dados, há a fase da escrita e de publicação. Fotos e papéis (folders, comunicações, programas, por exemplo) devem ser juntados. Eles são denominados arquivos na terminologia técnica e têm papel relevante para a adequada identificação historiográfica do contexto. Somente depois dessas tarefas é que poderá ocorrer a interpretação do que significam tais dados para uma história da Astrologia.
Aos poucos fui tendo noção de todas essas fases enquanto desenvolvia a pesquisa que começou em 2011 a respeito da história da Astrologia em São Paulo. Fui teimosamente por esse caminho respondendo às perguntas que me eram feitas: Por quê? Para quê? Eu tinha a intenção de mostrar às pessoas a necessidade dessa tarefa em que eu acreditava muito.
À medida que eu delineava o projeto, tinha mais noção de funções mais amplas que ele poderia incorporar. Quais?
O descaso com a memória brasileira
Depois do incêndio do Museu Nacional (RJ) em setembro de 2018 que comoveu o Brasil e o mundo, nos demos conta de forma contundente de que o repertório cultural brasileiro não recebe a devida atenção. Esse incêndio trágico foi apenas mais um entre inúmeros outros, infelizmente, contabilizando grandes perdas na área cultural de nosso País.
Se fizermos uma reflexão individual a que conclusões chegaremos? Não tenho certeza de que nós, astrólogos, damos importância à manutenção da memória que nos cabe. A tragédia desse incêndio reacendeu o debate e pode ter o valor de um chamado à nossa responsabilidade individual em relação à memória relacionada à Astrologia.
Fui me surpreendendo com as perspectivas que foram se abrindo, que eram insuspeitadas no início. Os desdobramentos foram indicando novos significados que essa investigação poderia reunir.
A motivação inicial foi a busca de registro de trabalhos realizados por gerações anteriores à nossa. Esse foi o mote principal. Mas, apareceram outros aspectos relacionados à natureza cultural da astrologia, que carrega marcas temporais e, portanto, sinais a serem levantados e interpretados.
Dessa forma, o que é produzido pelos astrólogos poderá apresentar elementos que nos conduzam à reflexão de uma prática da Astrologia ao longo das décadas. Como ela era? Como é atualmente? Como podemos observar, houve ampliação com motivos que dizem respeito a patrimônio e identidade cultural. Não se trata, portanto, apenas de registro de dados e preservação de fotos e documentos. O trabalho de resgate desses elementos nos dará elementos para um diálogo entre o passado e nosso presente.
O reconhecimento desse passado, o desenho dessa memória pode nos conduzir à resposta a uma indagação de como se tem desenvolvido a Astrologia no Brasil. Qual é a cara da nossa Astrologia? Ou seja, a memória poderá colaborar para sabermos quais são as características de nossa produção astrológica.
Com a continuidade deste trabalho de pesquisa, juntando mais dados a esse repertório, em algum momento futuro, teremos condições de construir o desenho da astrologia brasileira com mais precisão e justiça para todos aqueles que nos antecederam com seu conhecimento. A partir daí, poderemos saber, então, como se caracteriza a Astrologia nacional, ou seja, qual é a marca de nossa identidade.
Por que começou em São Paulo
Comecei em São Paulo porque é o local onde desenvolvi minha carreira como astróloga desde 1981. Durante esse tempo tenho convivido com colegas em eventos, cursos e palestras, o que facilitou minha busca por possíveis fontes de informação. Entrei em contato com alguns Estados do Brasil para convidá-los à participação, visto que havia a ideia de escrever um livro (ou um site) como produto final. Uma visão geral que viesse dos outros Estados abrangeria um contexto mais adequado ao conjunto de uma Astrologia nacional, na qual estaria incluída a paulista.
Dessa forma, o repertório deste projeto já conta com dados cedidos por colegas da Bahia (Alexey Dodsworth Magnavita, Ariane Freire e Gicele Alakija), de Minas Gerais (Mônica Matta Machado Auler) e do Paraná (Adriane Fayet).
Os dados coletados até agora são parciais, tanto os de São Paulo como os dos outros Estados. Seria bom que este trabalho fosse desenvolvido em todo o território nacional. Aposto na hipótese de mais informações chegando a qualquer momento. Na verdade, é isso o que se espera. Está feito o convite para que astrólogos de todo o Brasil se juntem a esta tarefa em cada um dos Estados.
Uma frase do historiador e astrólogo Rui Sá Silva Barros cabe neste momento: “O grupo que não cultiva memória e reflexão será definido por pesquisadores externos, no caso da Astrologia quase sempre com prejuízo.”
A plataforma de Constelar receberá uma descrição de tudo o que tem sido feito desde 2011 e abrigará o material que está pronto e em desenvolvimento relacionado a essa história em São Paulo. Acredito ser o local apropriado para acondicionar essa visão astrológica dando visibilidade a quem tiver interesse de conhecer. Cuidar da Astrologia brasileira: isso é o que a Constelar tem feito há muito tempo com competência e mérito.
Metodologia e conceitos
Ao observar tudo o que deveria ser registrado percebi que há sete áreas a serem pesquisadas: escolas e instituições (locais de instrução, formação e associação dos profissionais); livrarias e editoras (locais responsáveis pela divulgação dos conhecimentos astrológicos); eventos (variada natureza por sua configuração e contexto em que se realizaram); a mídia, ou seja, rádio, TV, impressa –jornais, revistas –, internet (veículos de contato com o público); programadores (programas de cálculos); personalidades (astrólogos com papel significativo em seu contexto de atuação).
Como vemos, são muitas as áreas a serem pesquisadas. Enquanto algumas são de fácil busca, outras nem tanto. Mas, fazer o trabalho requer sustentar o esforço e empenho. Desde o início deste projeto, já foram recuperados registros representativos em algumas áreas como a educação e os programas de cálculos.
Foi necessário o estabelecimento de uma metodologia para o trabalho. Alguns requisitos que organizassem o desenvolvimento dos temas, com algumas normas sugeridas tanto para as entrevistas como para a escrita dos textos.
Por outro lado, são aceitas todos as teorias astrológicas e profissionais visto que a Astrologia se constitui de múltiplos caminhos. Essa imensa diversidade teórica deve ser sinal da grandeza da Astrologia.
O projeto passou por várias fases, com interrupções de tempo. É um trabalho voluntário sem remuneração. Todos os que têm colaborado o fizeram por doação à Astrologia de São Paulo e do Brasil. Atualmente, Clarissa de Franco e Rui Sá Silva Barros estão formando comigo uma equipe para esta fase do projeto que pretende ser final em relação ao que foi proposto de início. A eles e a todos que têm dado seu tempo a este projeto (e que serão oportunamente citados) meu emocionado agradecimento.