Lydia Vainer foi uma astróloga com vocação para a pesquisa. Suas palestras em congressos e encontros astrológicos, sempre num peculiar estilo low profile, eram oportunidades para apresentação de investigações singulares, inéditas e contributivas para a ampliação do repertório da plateia. Nos eventos de que participava, era um prazer encontrá-la pelos corredores e fazer a mesma pergunta de sempre: “E então, Lydia, alguma pesquisa nova?” Invariavelmente a resposta era positiva.
Sabia da importância do método e formulava suas hipóteses de trabalho com rigor. Sabia também que amostras muito reduzidas podem conduzir a conclusões enganosas, e não tinha medo de mergulhar em grandes quantidades de mapas, de forma a chegar a resultados consistentes. Foi assim com a pesquisa que identificou fatores comuns em pacientes com câncer de mama, talvez a mais lembrada de todas. Foi assim com a pesquisa sobre o que havia de comum nas cartas de nascimento de generais da Alemanha nazista – com resultados chocantes até para ela mesma.
Lydia constatou que o traço em comum nas cartas de um significativo percentual de generais era a proeminência de Júpiter, normalmente em destaque na carta (angularidade seria uma destas situações) e formando aspectos fluentes com outros planetas. Segundo ela, aspectos que a maioria dos astrólogos consideraria como benéficos – Júpiter no Meio do Céu em trígono com o Sol, por exemplo – poderiam contribuir para a banalização do mal, que gerou monstruosidades como os campos de concentração e o Holocausto.
Para ela, a manifestação fluente de Júpiter na carta, especialmente quando não contrabalançada por um Saturno forte, poderia levar a uma hipertrofia das próprias certezas e convicções, assim como à sensação de que todas as ações podem ser justificadas quando a serviço de uma ideologia previamente aceita – mesmo que as consequências das decisões guiadas por estas crenças fossem as piores atrocidades.
Uma astróloga no contrafluxo
Enfim: Lydia Vainer não tinha nenhum pudor de nadar contra a corrente. Descobria constantes astrológicas em mapas que ninguém imaginaria que tivessem algo em comum. Foi assim que encontrou nexos inesperados nos mapas de Allan Kardec, Charles Darwin e Karl Marx, numa abordagem tão instigante quanto transgressiva.
Em sua última participação no Simpósio do Sinarj, em 2016, o tema dominante era a dicotomia determinismo x livre arbítrio, e quase trinta palestrantes defenderam que o indivíduo sempre tem livre arbítrio diante dos desafios colocados por sua carta. Lydia foi a palestrante do contra que – com riqueza de exemplos, alguns deles impressionantes – fez a defesa do determinismo, para espanto da plateia.
Já em 2003, também no Simpósio do Sinarj, Lydia Vainer homenageara a música popular brasileira analisando vários mapas de compositores contemporâneos particularmente inspirados por Netuno: novamente a preocupação de encontrar o fator comum, o traço distintivo que explica o comportamento de um grupo, uma categoria profissional ou mesmo um povo inteiro.
Em 2014 gravou um depoimento para o Museu da Pessoa, que assim a apresentou:
Lydia Vainer nasceu em São Paulo em [30 de outubro de] 1955. Filha de pais judeus fugidos das guerras na Europa, Lydia passou sua infância na região dos Jardins, em São Paulo. Interessou-se por astrologia ainda na adolescência. Cursou Psicologia e iniciou o curso de Artes Plásticas que não chegou a concluir. Recém-casada, aos 20 anos foi morar com o marido na Índia. Morou lá durante um ano e onde teve o primeiro filho. Ao voltar para o Brasil nasceram as filhas gêmeas. Ao terminar o curso de Psicologia começou a trabalhar com astrologia, fazendo mapas astrais. Atualmente é muito conhecida no meio, participando de programas de televisão e atendendo uma clientela de celebridades e políticos. (site do Museu da Pessoa).
Lydia Vainer vinha enfrentando um câncer no pâncreas, vindo a falecer em 19 de janeiro de 2020. Resgatamos as sinopses de suas duas últimas palestras no Simpósio do Sinarj, em 2015 e 2016, que podem ser baixadas em formato PDF:
Apresentamos a seguir os depoimentos de George Ferreira Jorge, diretor da Escola Santista de Astrologia, e de Maurice Jacoel, astrólogo e constelador paulista hoje radicado em Brasília. Acrescentamos também algumas preciosidades: textos e links de videos que permitem conhecer um pouco melhor o trabalho desta astróloga original.
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Maria Helena de Mello Elizardo diz
Não tive o prazer de conhecer a Lydia Vainer, mas só de saber que ela estudou e trouxe à debate o tema “determinismo e livre arbítrio” , me identifiquei de cara. Sendo uma super libriana como sou, tive alguns momentos na vida de dificuldade para realizar escolhas, chegando a desejar que o destino me desse uma mãozinha e determinasse por mim…
Deixo aqui minha gratidão a Lydia , mesmo tardiamente, mas de todo meu coração!
Maria Helena Elizardo