Estamos vivendo o longo trânsito de Plutão em Capricórnio, que se estende de 2008 a 2023. Passados sete anos de seu início, já é possível ter uma perspectiva bem clara da nova tônica dos conflitos mundiais. Mesmo quando a questão do fundamentalismo religioso parece ser a linha-mestra, percebemos uma diferença qualitativa com relação à fase anterior, de Plutão em Sagitário: tanto na atuação do Estado Islâmico, no Egito e na Síria, quanto do Boko Haram, na Nigéria, o que vemos é violência desenfreada a serviço de projetos políticos autoritários e que não admitem qualquer espécie de pluralismo. Sob diversos aspectos, a intolerância política de Plutão em Capricórnio é bem mais brutal do que a intolerância religiosa do Plutão em Sagitário (1995-2008).
A astróloga argentina Silvia Ceres, uma das melhores referências na área de Astrologia Mundial, previu algumas dessas tendências em entrevista concedida a Fernando Fernandse, em 5 de dezembro de 2007, poucos dias antes da conjunção Plutão-Júpiter em Sagitário. O áudio da entrevista integrou o material do evento Presságios 2008 e seus trechos mais relevantes encontram-se aqui traduzidos. Silvia é editora do site Gente de Astrología e autora do livro Astrosociologia, publicado em 2004 pelo Editorial Kier de Buenos Aires.
FERNANDO – Qual o balanço que se pode fazer da passagem de Plutão por Sagitário, entre 1995 e 2008?
SILVIA – A conjunção Júpiter-Plutão de dezembro de 2007 funciona como uma espécie de cena final da passagem de Plutão em Sagitário, trazendo à tona e acirrando a questão das ideologias, do sectarismo e do fundamentalismo. Essas questões entraram em pauta, segundo alguns sociólogos, com os acontecimentos de 1978, um ano de ruptura, que marca o início do fundamentalismo em todas as religiões monoteístas. Foi, por exemplo, o ano da chegada ao poder dos aiatolás no Irã e da ascensão de um novo papa, João Paulo II. É um processo que chega agora a seu ápice.
A América Latina também se inclui nesse processo de radicalização fundamentalista através da idealização das raízes autóctones, algo que acontece com mais intensidade na Bolívia e no Equador. É como se fosse o resgate de um paraíso perdido.
O fundamentalismo também vem-se transportando para a própria Astrologia, com o fortalecimento de grupos que só admitem como verdade aquilo que tem raízes, por exemplo, na tradição helenística. Diante de um mundo que se modifica mais rapidamente que nossa capacidade de apreender as mudanças, o fundamentalismo representa uma segurança. É confortável pensar que todo o saber e todas as respostas estão contidos num livro sagrado, numa cultura autóctone ou no conhecimento dos gregos.
FERNANDO – Assim, o conceito de fundamentalismo se confunde, sob Plutão em Sagitário, com o conceito de arcaico?
SILVIA – Exatamente. É a tendência, sob Plutão em Sagitário, a buscar verdades definitivas. Não há mais nada o que discutir, o que buscar ou sobre o que opinar.
FERNANDO – Todavia, o simbolismo de Sagitário também comporta a ideia de elaboração de novas teorias, de novas formulações filosóficas. O que você defende é que Plutão em Sagitário “engessou” essa elaboração teórica?
SILVIA – Sim, Plutão aporta um toque de fanatismo ao processo sagitariano de abertura de novos horizontes.
FERNANDO – Com a entrada de Plutão em Capricórnio essa problemática tende a mudar, não?
SILVIA – Nas passagens anteriores de Plutão por Capricórnio, nos séculos XIII, XVI e XVIII, temos pontos em comum. No século XIII aconteceu a decadência das Cruzadas e a formulação da filosofia escolástica como um pensamento mais concreto, racional, além de uma visão política que propõe uma Europa unificada em torno de um governo forte – que ora poderia ser o Sacro Império Romano Germânico, ora o próprio Papado.
No século XVII temos a Reforma Protestante, que por um lado é uma resposta contra todo o mal-estar gerado pela decadência da igreja católica, com um clero envolvido na venda de bulas e indulgências, mas por outro lado também é a ideologia que mais se adequa aos valores da burguesia, do crescimento do comércio, do individualismo e da liberdade para competir.
O último trânsito de Plutão por Capricórnio trouxe o absolutismo político e foi também o momento em que Adam Smith elaborava o corpo teórico do pensamento econômico que defende o livre comércio, a competição, a lei da oferta e da procura. Começa a revolução industrial e ocorre a independência dos EUA, que vai inspirar toda uma série de outras revoluções democráticas.
Em síntese, o trânsito de Plutão em Sagitário atua principalmente no plano ideológico, enquanto, em Capricórnio, temos a transposição dessas ideologias para o plano mais palpável, dando lugar ao surgimento de sociedades novas.
FERNANDO – No Brasil e em Portugal, a passagem de Plutão de Sagitário para Capricórnio, em meados do século XVIII, corresponde ao momento em que os jesuítas são expulsos do reino e, na medida em que antes controlavam toda a educação, temos, a partir desse momento, uma educação laica. O mesmo ocorre na América Espanhola?
SILVIA – Não. Na Argentina, pelo menos, quando acontece a expulsão dos jesuítas a educação passa a ser controlada por outras ordens religiosas, como a dos salesianos. Assim, a educação continua sendo religiosa até a década de 1880, quando, sob a presidência de Sarmiento, enfim institui-se a educação laica, gratuita e obrigatória.
FERNANDO – Você defende que, de uma forma geral, Plutão em Capricórnio guarde correspondência com processos de laicização?
SILVIA – Entendo que sim. Sendo Capricórnio um signo terráqueo, é como se Plutão deixasse para trás o “céu” sagitariano e ganhasse uma perspectiva muito mais prática e materialista. No século XVI, por exemplo, a Reforma Protestante deixa para trás toda a parafernália católica de liturgia e culto aos santos para tornar a religião mais centrada no homem – ou, mais especificamente, na produtividade do homem.
FERNANDO – Em 1530, quando termina a fase mais aguda das guerras de religião na Alemanha, aprova-se o princípio do “tal príncipe, tal religião”, ou seja, os súditos deverão seguir a religião – católica ou protestante – da conveniência do príncipe. Isso ocorre exatamente sob Plutão em Capricórnio.
SILVIA – Sim, é verdade. Assim, há uma linha-mestra comum aos três últimos trânsitos de Plutão em Capricórnio: no século XIII, é a entronização da razão como princípio que prevalece sobre a fé, na filosofia escolástica; no século XVI, é a religião centrada no homem e em valores burgueses; no século XVIII, é a revolução industrial e a burguesa. Neste sentido, realmente todos os trânsitos de Plutão em Capricórnio caminham no sentido da laicização, e neste não será diferente.