Plutão parece ativar a carta da Venezuela mesmo bem antes de ser descoberto, no início dos anos 30. A revelação da existência deste planeta é antecedida de poucos anos pela “revelação” da riqueza ignorada até aquela época. Na verdade, a exploração comercial do petróleo praticamente coincide com o anúncio da existência de Plutão e com uma mudança de direção de vastas consequências na economia venezuelana e em sua projeção internacional.
É Plutão também que define o traço mais forte da sinastria entre o presidente Hugo Chávez e seu país.
Hugo Chávez nasceu em Sabaneta, Venezuela, no dia 28 de julho de 1954. Calculando seu mapa solar (sem levar em conta as casas), destaca-se o stellium em Câncer, que é também o signo solar da Venezuela. Júpiter de Chávez está em conjunção com o Sol do país, indicando uma fácil identificação dos venezuelanos com seu dirigente. O stellium em Câncer também mostra Chávez como alguém capaz de alimentar o sentimento nacionalista ou nativista de seus conterrâneos.
O mapa de Chávez é um Leque onde nove planetas concentram-se no espaço de um trígono e Marte, único planeta isolado, exerce a função da alavanca, ou do cabo que move o leque. Assim, esse Marte em Sagitário assume grande importância, exercendo um papel determinante. Marte é significador essencial de militares (Chávez era oficial do exército). Sagitário é um signo de aventuras e grandes ideais, expressando bem o ousado projeto de reformar todo a estrutura política e econômica do país a partir de uma uma nova constituição elaborada por uma assembleia soberana. Se lembrarmos que Sagitário é o significador da ordem jurídica, é fácil entender porque Chávez insiste tanto na tese de que “o poder constituinte é a vontade primária e soberana do povo que se manifesta na criação de uma constituição”.
Quando Urano e Netuno em trânsito ainda ativavam por oposição o Sol radical da Venezuela, em 1991 e 1992, Chávez tentou assumir o poder mediante um golpe de estado. Acabou preso e, no cárcere, escreveu um documento intitulado Como sair do Labirinto, com propostas para uma renovação política de seu país. Em 6 de dezembro de 1998 chegou ao poder pelo voto, numa eleição cujo mapa apresenta quatro planetas em Sagitário, todos ativando a casa 1 do mapa da Venezuela. O sentido é claro: o país queria mudar a imagem que tinha de si mesmo (Ascendente) e experimentar um reinício. Foi também um voto de raiva e de protesto da população mais pobre, descontente com a desigualdade social (Marte da eleição em quadratura exata com a Lua na casa 2 da Venezuela).
A crise de abril de 2002, passo a passo
Eleições marcadas por quadraturas Lua-Marte podem resultar em governos que agem com precipitação e chegam a confrontos abertos com setores oposicionistas. Chávez, desde os primeiros meses, tomou medidas que a oposição considerou antidemocráticas e golpistas. Concentrou poderes, esvaziou instituições tradicionais e fez instalar uma nova assembleia constituinte. O permanente confronto de Chávez com grandes empresários, que controlam os meios de comunicação, e a insatisfação da classe média, prejudicada pela condução da economia, levaram o país praticamente à guerra civil desde o início de 2002. A tensão cresceu aos poucos e explodiu em grandes mobilizações de rua em abril. Vejamos o que aconteceu, passo a passo:
10 abril de 2002, 19h15 – A partir da convocação da Confederação de Trabalhadores da Venezuela inicia-se uma greve geral por tempo indeterminado para desestabilizar o governo de Chávez e exigir sua saída.
O Ascendente do início da greve é o primeiro grau de Escorpião. Os dois regentes deste signo estão tensamente aspectados: Plutão está em conjunção com o restritivo Nodo Sul, enquanto Marte forma quadratura com Urano. Marte está em Touro, em oposição ao Ascendente da Venezuela. Urano em trânsito está no Fundo do Céu do país, indicando um período de grande agitação popular e um desafio aberto ao poder constituído.
11 de abril de 2002, das 14h30 às 18h – 500 mil pessoas se envolvem em grandes manifestações em torno do palácio presidencial. O enfrentamento entre partidários de Chávez e seus oponentes deixa 24 mortos e 110 feridos.
Sol e Lua estão no guerreiro signo de Áries. Quando as mortes começam, o Ascendente é Leão e a quadratura Marte-Urano está nos ângulos da carta do país.
12 de abril de 2002, 1h10 – Informa-se que Chávez entregou-se a militares rebeldes (mais tarde esta versão seria negada). Às 4h da madrugada Chávez já está na prisão.
O Ascendente agora é Capricórnio. Netuno é o único planeta na casa 1, simbolizando a situação confusa e enganosa: Chávez não se entregara, mas fora sequestrado por militares que, arrependidos, seriam os primeiros, no dia seguinte, a manifestar lealdade ao presidente deposto. Urano, ainda em quadratura com Marte, está na cúspide da casa 2, mostrando que as causas do golpe eram fundamentalmente econômicas.
12 de abril de 2002, 17h39 – Pedro Carmona Estanga, presidente da Fedecámaras, assume como presidente e fecha o Legislativo e o Judiciário, prometendo eleições em um ano.
Surpreendentemente, o Ascendente é Libra e Júpiter ocupa o Meio-Céu em Câncer. À primeira vista, parece o mapa de um governo que chega para pacificar e durar. Mas Vênus, o regente do Ascendente, está em quadratura com Netuno na casa 5, regente da casa 6. O mesmo Netuno também está em quincunce com Júpiter no Meio-Céu. Era toda uma situação equivocada a aguardar uma correção, que não tardaria. A reação da massa não se faria esperar: no dia seguinte, 13 de abril, às 12h30, começam as manifestações de partidários de Chávez na capital. O Sol está no Meio-Céu, e a Lua, regente do Ascendente, acaba de entrar em Touro, seu signo de exaltação. A reação popular começada com a Lua transitando pela casa 10 mostra claramente que o povo (Lua) não tardaria a estar no palácio (casa 10).
13 de abril de 2002, entre 16h e 18h – Seguidas declarações de lideranças políticas e militares dão conta de que o novo presidente Carmona não tem com o apoio esperado. As manifestações pró-Chávez continuam.
13 de abril de 2002, 22h12 – Carmona renuncia à presidência, depois de um início de noite em que que partidários de Chávez tomaram o palácio presidencial e uma rede de televisão, enquanto conflitos de rua matavam mais nove pessoas.
O mapa da renúncia de Carmona não poderia ser mais significativo: Plutão está sobre o Ascendente. É um dos regentes do mapa da Venezuela e é, nesta carta de renúncia, o regente da 12, significadora dos setores excluídos da sociedade. Os miseráveis acabavam de derrubar as elites tradicionais (Saturno no Descendente).
Chávez de volta ao poder e a tensa relação com os EUA
14 de abril de 2002, 4h – Chávez, libertado, chega ao palácio e assume novamente como presidente, fazendo um discurso conciliador.
Agora, Plutão está no Meio-Céu, simbolizando o presidente que volta ao poder e reiterando a sinastria de Chávez com o mapa da Venezuela (Plutão do presidente no Meio-Céu do país).
Plutão é um símbolo de controle mas também de transformações profundas, radicais. O mapa do retorno de Chávez mostra que o homem que ocupa o poder na Venezuela é um extremista capaz de levar suas teses reformistas até as últimas consequências. Trata-se, todavia, de um extremista democraticamente eleito por um povo que exige reformas radicais. Se levará a bom termo seu projeto é uma questão interna venezuelana, e todo o restante da América Latina entendeu assim, rejeitando a tentativa de golpe de estado dos empresários liderados por Pedro Carmona. Por outro lado, os Estados Unidos apressaram-se a manifestar apoio ao golpe – inclusive quando Carmona anunciava o fechamento das instituições – repetindo, assim, comportamento semelhante ao de 1908, no apoio a Gómez. Os fatos ainda não estão totalmente claros, mas os repetidos contatos de Carmona com autoridades americanas nas semanas que antecederam o golpe, assim como a presença de navios americanos junto à costa da Venezuela, parecem apontar para um decidido apoio do governo Bush aos inimigos de Chávez. Os motivos são evidentes: Chávez mantém a Venezuela alinhada com a OPEP – o que significa dizer o mundo árabe – e mantém boas relações com tradicionais adversários dos Estados Unidos, como Fidel Castro.
Já vimos em outro artigo a importância dos trânsitos de Plutão em conjunção, quadratura ou oposição a Marte radical dos Estados Unidos. Sob ativações semelhantes, os americanos criaram sua doutrina de intervenção na América Latina e meteram-se em invasões e conflitos abertos com potências estrangeiras. No início do século XX, quando da conjunção, os Estados Unidos invadiram a República Dominicana e manipularam a política venezuelana de todas as formas. Agora, na oposição, desenha-se uma nova fase de interferência indesejável na América Latina.
O que há mais preocupante é que, quando os Estados Unidos vivenciam ativações de Plutão em trânsito a Marte radical, a sutileza diplomática vai por água abaixo. Tudo o que o país precisa é encontrar um inimigo para combater. Na quadratura de 1964-67, esse inimigo foi o Vietnã do Norte. Na oposição de 2001-04, já ocorreu uma invasão ao Afeganistão e Bush ameaça intervenções contra outros “países-terroristas”. O tom geral é de endurecimento.
NOTAS DE 2021 AO TEXTO DE 2002:
- Ao longo de 2019 Plutão em trânsito formou quincunce (um aspecto menor, mas igualmente tenso) ao Marte da carta natal americana. Tal como Bush entre 2001 e 2004 (invasões do Afeganistão e do Iraque), Trump endureceu o discurso contra inimigos e adversários dos Estados Unidos, inclusive o regime de Maduro na Venezuela.
- Nos últimos anos, a carta mais utilizada para o ex-presidente venezuelano Hugo Chávez indica um nascimento em 28.07.1954, em Sabaneta, Venezuela, por volta das 04:00 da madrugada. Seu Ascendente, portanto, encontra-se provavelmente em 6º de Câncer.
- A grande diferença entre 2002 e 2019-21 é que, em 2002, os governos da América Latina posicionaram-se em bloco contra o golpe que tentou derrubar Hugo Chávez. Já na crise inaugurada quando Juan Guaidó tentou formar um governo paralelo, a maioria dos países do continente negou apoio a Maduro.
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