Um ciclo entre dois planetas é o intervalo de tempo que medeia entre a repetição de dois aspectos da mesma natureza. O aspecto mais importante é a conjunção, por sua função de ponto de partida, ou momento-semente a partir do qual novos processos históricos têm lugar. Os ciclos particularmente importantes do ponto de vista da Astrologia Mundial são aqueles que põem em contato os quatro planetas mais lentos, a saber:
- Saturno-Urano
- Saturno-Netuno
- Saturno-Plutão
- Urano-Netuno
- Urano-Plutão
- Netuno-Plutão
Cada ciclo carrega consigo uma atmosfera singular e implica um distinto conjunto de possibilidades. E, se bem que mudem as circunstâncias históricas, os acontecimentos concomitantes com a faixa de ocorrência de determinada conjunção de planetas lentos sempre guardarão correspondência analógica ou ressonância temática com os acontecimentos concomitantes com outras ativações do mesmo ciclo, em momentos diferentes. É o que veremos numa sequência de artigos que alinhavam diversos momentos históricos e construções ficcionais cujo fator comum é o contato dinâmico entre Saturno e Netuno. A escolha não é casual, pois, além de estar evidenciado em 2016, em função de diversas quadraturas exatas, o ciclo Saturno-Netuno é também de crucial importância para a compreensão da História da América Latina.
O que Saturno e Netuno têm a ver conosco?
A Independência das antigas colônias ibéricas é um longo processo político e militar que se estendeu de 1808 a 1826 e afetou todas as regiões entre a Patagônia e o México, dando origem aos modernos estados independentes.
A primeira fase do movimento independentista, entre 1808 e 1814, é caracterizada pela atuação das Juntas (assembleias) constituídas nas principais cidades coloniais. Sem romper, num primeiro momento, com a autoridade real, essas Juntas aproveitam a desorganização da Espanha frente à ameaça napoleônica e reivindicam maior autonomia e participação na administração local. Aos poucos as posições se radicalizam e levam aos primeiros movimentos de ruptura. Na segunda fase do processo, a partir de 1814, a Espanha, já livre de Napoleão, tenta recolonizar suas antigas possessões, levando a um clima de guerra aberta que motivou confrontos militares generalizados por todo o continente.
Astrologicamente, a Independência da América Latina se organiza em torno de três conjunções de planetas geracionais, a saber:
CONJUNÇÃO | ATUANTE ENTRE [1] | EXATA EM |
Saturno-Netuno | 1808-1811 | 1809 (Sagitário) |
Saturno-Plutão | 1818-1820 | 1819-20 (Peixes) |
Urano-Netuno | 1818-1824 | 1821 (Capricórnio) |
Basta observar alguns momentos-chave deste processo:
- 1808 – Com a fuga da Família Real portuguesa para o Brasil, o Rio de Janeiro transforma-se de facto (e depois também de direito) em capital de um império ultramarino. É a primeira e única ocasião na História em que uma cidade latino-americana torna-se capital de um império europeu. Longe de reforçar os laços com a metrópole, a instalação da capital no Rio contribui para criar as pré-condições para a Independência do Brasil.
- 1808, setembro – A primeira Junta se constitui em Montevidéu. Artigas combate as tropas realistas.
- 1809 – No Alto Peru (Bolívia), as Juntas de Chuquisaca e La Paz iniciam o processo de autonomia.
- 1810, abril – A Junta de Caracas proclama Independência da Venezuela.
- 1810, julho – A Junta de Santa Fé (Colômbia) depõe o Vice-Rei. Independência.
- 1810, maio – Criação da Junta em Buenos Aires, origem da independência do país.
- 1810, setembro – Revolução de Hidalgo leva à independência do México, reprimida de forma sangrenta.
- 1810, outubro – Independência do Equador, depois revertida pelos realistas.
- 1811, maio – Independência do Paraguai, com Francia.
- 1811, julho – Carrera assume o poder no Chile, apoiado por O’Higgins.
É muito significativo que todo esse despertar continental ocorra sob a faixa de atuação de uma conjunção Saturno-Netuno, exata em 1809.
No período de 1814 a 1816, a Espanha reage e neutraliza militarmente boa parte das regiões que haviam declarado sua independência nos anos anteriores. No Brasil, D. João VI eleva a colônia à condição de Reino Unido, também numa tentativa de neutralizar o impulso autonomista.
A partir de 1817, começa o confronto em larga escala entre patriotas e potências ibéricas. É a época das grandes batalhas que consolidarão o movimento iniciado sob a conjunção Saturno-Netuno. Ao sul do continente, as tropas do General San Martin começam a efetiva libertação dos países andinos do Pacífico. Correspondendo ao sentido de radicalização e endurecimento do ciclo Saturno-Plutão, o auge desse período é o ano de 1819, quando, à força das armas, o revolucionário Bolívar logra a formação da República da Grande Colômbia.
Mas a segunda onda de declarações de independência, desta vez com efeitos definitivos, deve ser creditada não à ferocidade de Saturno-Plutão, e sim à renovação ideológica e política que ocorreu em sincronia com a conjunção Urano-Netuno em Capricórnio. Se bem que exata apenas em 1821, esta conjunção já pode ser considerada atuante desde 1818 (ainda em Sagitário), e mantém seus efeitos até 1824, quando o Império do Brasil aprova sua primeira Constituição.
Assim, são associáveis a Urano-Netuno as independências do Peru (julho de 1821), México (agosto de 1821), Brasil (setembro de 1822) e Províncias Unidas da América Central (1823).
Dentre os países de maior destaque no continente, o único que consolida sua independência fora da faixa de atuação dessas conjunções é a Argentina, com a formação das Províncias Unidas do Rio do Prata em julho de 1816. Contudo, o vínculo do país ao grande movimento continental já estava definido desde 1810, num mapa em que a conjunção Saturno-Netuno aparece ativada fortemente por Marte e Lua.
Considerando que a conjunção Urano-Netuno de 1821 ocorre em Capricórnio, o que lhe dá uma conotação semelhante a uma tripla conjunção Urano-Netuno-Saturno, temos que contatos Netuno-Saturno diretos ou indiretos estão por trás de todos os movimentos importantes da constituição da identidade latino-americana. Se é possível falar de uma “alma latina” em contraposição ao modo particular de ser da América anglo-saxônica, da Europa desenvolvida ou mesmo do mundo latino europeu, há que estudar em detalhes esse componente Saturno-Netuno. Mas o que significa realmente a conjugação da energia desses dois planetas? É o que veremos no artigo O desencanto diante do mundo hostil.