Para entender o o papel do Senado Federal no Brasil de hoje, é preciso ir às origens. Como toda instituição, o Senado responde a um mapa de nascimento – que corresponde, no caso, ao de sua primeira sessão. De acordo com Carlos Eduardo Barata, autor de Presidentes do Senado no Império, eis como tudo começou:
Criara a Constituição de 25 de março de 1824 o Senado, Câmara vitalícia de cinquenta membros, cada qual de livre escolha da Coroa, dentro de uma lista de três nomes constituída pelos candidatos mais votados nas eleições realizadas para a Câmara dos Deputados.
A 22 de janeiro de 1826 foram escolhidos por D. Pedro I os primeiros senadores.
6-5-1826 – Primeira sessão da primeira legislatura, no edifício do Senado, assim inaugurado (edifício da Faculdade Nacional de Direito). Nesta ocasião, foi feita a segunda Fala do Trono.
Temos aí os dados suficientes para traçar uma carta solar do Senado Federal e verificar o papel desta instituição na vida brasileira, assim como investigar os motivos de suas seguidas crises de credibilidade junto à opinião pública.
Marte dá as cartas no Senado Federal
6 de maio de 1826 foi dia de Lua Nova, que se tornou exata apenas às 23h19 LMT, certamente após o término da sessão. Mas, de qualquer forma, Sol e Lua já se encontravam em conjunção desde as primeiras horas da manhã, o que valoriza sobremaneira o signo em que tal aspecto ocorreu, Touro. Esta conjunção Sol-Lua está em oposição a Marte em Escorpião, planeta muito significativo tendo em vista que, qualquer que seja o esquema de regências que utilizemos, clássico ou moderno, Marte avulta como o dispositor final e planeta mais destacado da carta, o que se verifica facilmente:
- Urano e Netuno estão em Capricórnio, signo de Saturno;
- Sol e Lua estão em Touro, signo de Vênus;
- Vênus e Saturno estão em Gêmeos, signo de Mercúrio;
- Júpiter está em Virgem, outro signo de Mercúrio;
- Mercúrio e Plutão estão em Áries, signo de Marte;
- Marte está em Escorpião, um de seus domicílios.
Marte controla assim, direta ou indiretamente, todos os demais planetas. Além disso, o mapa apresenta uma distribuição conhecida como ampulheta, com os planetas distribuídos em dois blocos que, grosso modo, opõem-se um ao outro. A oposição de Marte a Sol-Lua corta exatamente pelo centro estes dois grupos, funcionando como eixo organizador de toda a carta. Oposições sempre têm uma conotação libriana e, consequentemente, venusiana. Como Sol e Lua estão num signo de Vênus, pode-se considerar este planeta como o segundo em importância no mapa do Senado.
O eixo Touro-Escorpião é o mais fixo, o mais possessivo e o mais passional do zodíaco. Além de fixos, tais signos são femininos, tendendo à estabilidade da forma e à permanência. Soma-se a isso o fato de que cinco dos dez planetas estão em signos de Terra – o mais estável dos elementos – e que, considerando-se órbitas bem elásticas, há um Grande Trígono entre Júpiter, Netuno e Sol, sendo o Grande Trígono a mais estável de todas as configurações. Este acúmulo de fatores faz do Senado uma instituição conservadora, de metabolismo lento, resistente a mudanças e, de certa forma, introvertida. Que não se esperem do Senado decisões muito impensadas ou um papel de liderança na condução de mudanças radicais. A própria concepção arquitetônica do edifício do Congresso Nacional, em Brasília, já revela a vocação do Senado: enquanto a Câmara dos Deputados é o “prato” voltada para cima, como se estivesse aberto para captar os anseios do eleitorado, o Senado é o “prato” convexo, emborcado, fechado ao mundo e voltado para si mesmo.
O conservadorismo da instituição não se confunde, porém, com placidez. Marte em oposição a Sol e Lua é um aspecto de conflitos, e conflitos de longo curso, que não se resolvem com facilidade. Contribuem para isso a rigidez e a teimosia dos signos ocupados, no eixo Touro-Escorpião. Por outro lado, a quadratura Urano-Mercúrio, assim como o próprio fato de Mercúrio estar em Áries, garante discussões agressivas, aquecimento da temperatura dos debates, destemperos e descontroles verbais. Some-se a isso a quadratura de Vênus em Gêmeos a Júpiter em Virgem e temos o retrato do Senado em seus mais de 180 anos de existência: discursos inflamados, conflitos à flor da pele, torneios verbais esmerados, retórica brilhante e pouca disposição real para mudar as coisas de lugar.
A vocação para o corte cirúrgico
Sol e Lua em Touro mostram onde está a verdadeira identidade do Senado. Touro é um signo ligado à terra e aos seus valores. Durante todo o período imperial e a República Velha o Senado foi, antes de tudo, o reduto dos grandes produtores rurais, aí incluídos os barões do café, os reis do gado, os senhores do cacau e da cana-de-açúcar. Aos poucos, juntaram-se a estes os financistas do Império, os banqueiros da República, aqueles, enfim, que representavam a outra face da moeda taurina: os bens móveis, o grande capital, o mercado financeiro. É claro que o Senado sempre acolheu também representantes de todos os outros segmentos sociais, mas sua tendência dominante é conservadora. Sempre que encontramos Grandes Trígonos no mapa de uma instituição, encontramos também uma dinâmica de fortalecimento do corporativismo, algo para o qual apelou o senador Antonio Carlos Magalhães na crise de 2001, quando justificou seu silêncio sobre a violação do sigilo do painel de votação com o argumento da “necessidade de preservar o Senado”. É exatamente este espírito de autopreservação, indicado pelo Grande Trígono em Terra, que contrabalança o potencial de conflito interno simbolizado pela oposição Marte-Sol.
Se Sol e Lua em Touro mostram a essência mesma desta instituição, Marte em Escorpião é seu modelo de operação, ou a forma como o Senado se mobiliza e concentra energias para atingir objetivos. Em Escorpião, seu domicílio tradicional, Marte está à vontade: é explosivo, agressivo, intenso, se bem que capaz de agir com discernimento e disciplina. Uma boa imagem para este posicionamento é a águia que, após enxergar do alto sua presa correndo na campina, mergulha em grande velocidade para capturá-la num bote certeiro. Se necessário, Marte em Escorpião age com precisão cirúrgica, promovendo a extirpação daquilo que atrapalha seu caminho.
Este Marte do Senado está retrógrado, o que permite aplicar a definição de Raul Martinez:
Astrologicamente, o andar para trás pode ser ligado à necessidade de repetir, rever, revisar, recuar e a voltar, até no sentido de renascer. São associações que envolvem atenção, concentração de esforços, preocupação e sacrifício, na busca de aperfeiçoamentos e de soluções mais adequadas, ligadas aos significados dos retrógrados da carta astrológica.
Em outras palavras: a condição retrógrada talvez torne este Marte da carta do Senado menos evidente em seu funcionamento. Ainda será capaz de agir cirurgicamente quando necessário, mas apenas após um penoso esforço de investigação sobre que ações são realmente necessárias e inadiáveis. Foram precisos 174 anos para que o Senado expurgasse o primeiro de seus membros – o ex-senador Luiz Estevão, em julho de 2000, por envolvimento no escândalo de superfaturamento de obras na sede do TRT de São Paulo. Menos de um ano depois, outros três senadores foram levados à renúncia para escapar da cassação, Antonio Carlos Magalhães e José Roberto Arruda por envolvimento com a quebra de sigilo do painel eletrônico de votações e o Jáder Barbalho – presidente do Senado na época – por suspeitas de envolvimento com o escândalo de desvio de verbas da SUDAM.
Na época, Marte progredido chegava à conjunção com Netuno radical, o que, por um lado, exprimia a disposição para “futucar” situações nebulosas ou escandalosas, mas, por outro, revelava também um risco de ações imprecisas, ilusórias e sem objetividade. Netuno é um símbolo de falta de transparência, e cabia ao próprio Senado decidir se faria a correção cirúrgica (Marte) ou continuaria navegando às cegas em águas turvas (Netuno).
Suspeitas sobre o Ascendente do Senado
Tratamos a carta do Senado exclusivamente como carta solar, sem tentar uma especulação sobre o horário em que se iniciou sua primeira sessão. Contudo, em O Brasil sem Retoque, volume I, o jornalista Carlos Chagas lembra que as sessões da Assembleia Constituinte, que precedeu o Senado, iniciavam-se muito cedo, por volta das 7h da manhã. Se o Senado manteve o mesmo hábito, seu Ascendente pode ser o próprio signo de Touro e, neste caso, Vênus também estaria em Touro, nos seus últimos minutos. A entrada deste planeta em Gêmeos ocorreu apenas às 9h52 (hora local). Uma suspeita tentadora é de que o Ascendente do Senado esteja por volta de 15º de Gêmeos, o que corresponderia a uma abertura dos trabalhos em torno de 8h40 da manhã. Neste caso, Plutão em trânsito teria feito oposição ao Ascendente por volta de 2001, enquanto Urano transitaria pelos primeiros graus da casa 9. Esses aspectos podem ser associados a uma crise ética que, entre altos e baixos, ainda não se resolveu. Mas é apenas uma entre muitas possibilidades.