Um
olhar brasileiro em Astrologia
Edição 94 :: Abril/2006 :: - |
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ASTROLOGIA E CULTURA BRASILEIRAVênus brasileira, uma dama
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Valeria Bustamante |
Além
de reger as casas IV (as raízes do povo) e IX (o estrangeiro),
a orgulhosa e individualista Vênus em Leão ocupa, no mapa
da Independência do Brasil, a casa significadora do serviço
público. Essa "rainha empacada na casa do serviço"
ajuda a entender algumas das crises éticas que sacodem o país
- como a que vivemos agora.
Em 2005, fatos cotidianos me deixaram frente a frente com a Vênus em Leão do mapa da Independência do Brasil. Ela sempre esteve lá, mas eu nunca havia sentido raiva dela, ou vontade de compreendê-la. Só quando a enfrentei, tomada por um misto de fúria e espanto, pude enxergar toda sua glória e sua dor, que, lamentavelmente, é também nossa dor.
A Vênus brasileira está no signo de Leão, hospedada na Casa VI. Estar em Leão confere a ela calor humano, generosidade, criatividade, musicalidade, grandiosidade, dramaticidade, orgulho, beleza, etc. Mas a casa cadente do serviço a deixa muito pouco à vontade: por isso, o termo "hospedada". O confronto que me levou a escrever deixou claro para mim que a Vênus da Independência do Brasil é perfeitamente incorporada por brasileiros de nobre cultura e fina estirpe que, por algum motivo político, assumem o papel de Servidor (Casa VI) público (trata-se do mapa de um país).
Além de uma quadratura separativa a Saturno, que fala muito de seu passado de terra explorada, nossa Vênus em Leão não faz aspecto ptolomaico com nenhum outro planeta, apenas quadratura à Fortuna em Escorpião e sextil ao Vertex em Gêmeos, considerado o horário das 16h30 para o grito do Ipiranga. Não tenho, até hoje, posição definida sobre esse horário, "acho" que o Brasil tem Ascendente Peixes, mas observar Vênus, brigar com ela, fez com que eu percebesse que ela é a regente de nossas Casas IV e IX. Como é geometricamente possível o Brasil ter ascendente Peixes e Casas IV e IX ainda regidas por Vênus, aplaco minha teimosia e vou ao que interessa: a deusa resplandecente que D. Pedro I condenou à solidão (Vênus quadratura Saturno) em acomodações ridiculamente simples (Casa VI) que ficam muito, muito, perto de um grande abismo - o Nodo Lunar Sul.
Independência do Brasil (hipótese de Ascendente em Peixes) - 7.9.1822, 16h44 LMT - São Paulo, SP - 23s32, 46w37. Para ter simultaneamente um Ascendente em Peixes, como defende Valeria Bustamante, e também Vênus na 6 regendo as casas 4 e 9, é necessário que a Independência tenha ocorrido entre 16h43 e 16h45. A maioria dos astrólogos do país defende um Ascendente em Aquário, se bem que haja uma minoria significativa que proponha o Ascendente em Peixes. Nota: ilustram este artigo reproduções de aquarelas de Jean-Baptiste Debret, pintor que chegou ao Brasil em 1816, com a missão artística francesa, e documentou a vida da sociedade brasileira durante os governos de D. João VI e D. Pedro I. |
A conjunção ao Nodo Sul dificulta a expressão mais positiva das características leoninas de Vênus, e beleza pode virar vaidade, magnanimidade pode se tornar autoritarismo, etc. Por outro lado, muito da veia criativa do povo brasileiro pode ser explicada pela conjunção Vênus/Nodo Sul em Leão, assim como a exuberância de nossas riquezas naturais, já que Vênus rege a nossa Casa IV. O problema com o Nodo Lunar Sul é que, embora funcione como um reservatório de talentos e tesouros inatos, sempre pressupõe que esses talentos sejam usados na construção de um caminho até o Nodo Lunar Norte. Caso contrário, ele se torna um sorvedouro de vida, um desperdício, uma desolação.
Sempre existe, em quem tem o Nodo Sul em Leão, um "(...) excesso de preocupação com o impacto que acha que deve produzir nos outros"[1] . mas isso não implica, necessariamente, que a pessoa não consiga explorar e usufruir essa mina de ouro leonina. No caso do Brasil, porém, o Nodo Sul está na Casa VI, ele deve ser posto a serviço de todos, ou seja, é preciso que aprendamos a deixar o brilho leonino passar e fluir fartamente, como quem serve à humanidade (Nodo Norte em Aquário), com as próprias mãos, um banquete régio. Vênus em Leão não gosta nada disso, ela quer se sentir parte importante e indispensável de qualquer processo criativo, e é difícil para ela abrir caminho para uma glória que não seja a dela. Trabalhar de garçonete cósmica, então, nem pensar!
Uma vez personificada e empossada, Vênus começa a ter que lidar com essa cobrança cármica e passa a achar "(...) o mundo físico exaustivo (...)" "as condições intoleráveis (...)", e aquele que a personifica sempre se sente "(...) depreciado por tudo o que tem para oferecer(...)" [2]. Seu posicionamento determina que, para ser grande, é necessário servir e acatar o fluxo da grandeza alheia (no caso, do povo brasileiro), mas a maioria de nossas Vênus prefere fingir que é apenas responsável pela Casa IX, a cultura erudita que busca no exterior para elevá-la e distanciá-la do povo.
O povo brasileiro é o único capaz de colher seus próprios talentos, e nosso povo é Terra. Tem alma no Ar (Lua), mas é Terra. O elemento Terra é capaz de muita coisa, mas não pega fogo de fora pra dentro, só de dentro pra fora. Isso entristece as personificações de Vênus. Como tutelar, direcionar, ter o orgulho de promover manifestações se elas só são boas quando são espontâneas? Como aceitar que excelentes idéias vindas do exterior e sofisticadas produções acadêmicas sejam tão ineficazes para enquadrar esse povo?
Por não saberem lidar com isso, nossas Vênus se afastam do povo, esquecem que são parte dele. Nesse processo, muitos se entregam à tentação irresistível de confundir o que vem do Nodo Sul com sua própria obra. Alguns, em condições extremas, até confundem acervo público com acervo pessoal e lidam com ele de modo voluntarioso ou irresponsável. Além disso, muitas vezes Vênus, que é a dispositora de Saturno, despreza e ceifa certas manifestações culturais por não compreender sua grandeza. E ao utilizar o Nodo Sul de modo individualista, contrariando as exigências do Nodo Norte, Vênus se exaure e, para sua desgraça, o Nodo Sul se tranca para ela. De um modo ou de outro, ela também acaba sempre sendo ceifada.
Eu desprezo essa rainha empacada na casa do serviço atrapalhando o fluxo de todos nós, mas reconheço que ser um servidor encarregado das nossas Casas IV e IX é a função mais difícil a ser assumida por alguém nesse país. Quase me comovo! Mas fico mesmo é indignada com o desfile infindável de posturas elitistas, preconceituosas, vaidosas e autoritárias assumidas posse após posse. São poucos os que escapam da repetição da fórmula de Vênus em Leão tão bem citada por Aniela Pratesi: "Eu amo melhor que os outros"[3] , apresentada numa versão menos fashion: "Eu sirvo melhor que os outros".
A solução mais usada pela Vênus da vez para provar que é ótima é empurrar de volta para o abismo ao lado (Nodo Sul) todas as idéias de seus antecessores e gastar o período do mandato descobrindo a pólvora. É fácil observar quantos sucumbiram à tentação de ignorar o plano de trabalho de seu antecessor, não importando quão eficiente ele fosse. O comum é que não tenhamos servidores na área da cultura, mas quimeras ("Monstro fabuloso, com cabeça de leão, corpo de cabra e cauda de dragão (...)" [4]. Reconhecem a figura?
[1] Les Noeuds de la Lune,
clés de l'interprétation, Atalane, Ed. du Rocher, 1987.
[2] Os Nódulos Lunares, Martin Schulman, Ed. Ágora,
Astrologia Cármica, v.1, 1987.
[3] extraído de http://www.universus.com.br/art151.htm, em janeiro
de 2006
[4] Dicionário Eletrônico Aurelio - Seculo XXI, Ed.
Nova Fronteira, 1999.
O tipo de atitude que caracteriza nossa Vênus foi recentemente privatizado. As ONGs brasileiras, independentemente de suas origens ou boas intenções, tornaram-se herdeiras desse modo de servir. A maioria segue modelos de organizações de países estrangeiros, o que as deixa sob a influência da Casa IX; e a maioria pretende, por algum motivo seu, servir à população, entrando pela porta da nossa Casa VI para chegar à Casa IV. Caem duas vezes em terreno venusiano.
Vênus adorou as ONGs! Está confiando que, até que enfim, tem a base nobre de um ideal e um capital estrangeiros, e pode agir à altura. E Vênus atacou: atualmente o Brasil possui um número exorbitante de ONGs, mas, infelizmente, em muitas delas continuamos apenas a reafirmar nossa dificuldade de atravessar a ponte Nodo Sul em Leão/Nodo Norte em Aquário.
"Segundo seus críticos, as ajudas internacionais repassadas para as ONGs brasileiras não estariam favorecendo o país e seu povo, mas sim causando "(...) o arrefecimento da tensão social gerada pelos programas de ajuste estrutural (...), alcançando apenas a satisfação de pequenas demandas da população mais afetada pelas reformas. Neste sentido, elas estariam tecendo um 'amplo e sutil colchão', capaz de amortizar os efeitos dos ajustes econômicos sobre os excluídos do modelo adotado, minando seu potencial convulsivo e evitando, assim, que se levantem para exigir seus direitos, o que iria desestabilizar o sistema (Villalobos apud FERREIRA, 2005)." "(...) Essa nova forma de gestão social, pautada na idéia do favor e da moral, contribuiria para a descaracterização da noção de direitos e da própria cidadania (...)" (Montaño apud FERREIRA, 2005). "(...)Outra crítica dirigida às ONGs considera que o seu crescimento representa uma estratégia do grande capital (...) de fomentar a política neoliberal de libertar as forças do mercado das amarras do controle dos Estados dos países subdesenvolvidos no momento em que esses começaram a passar por processos de redemocratização (...) (Souza, apud FERREIRA, 2005) [5]
[5] "ONGs no Brasil: um estudo Sobre Suas Características e Fatores que têm Induzido seu Crescimento", tese de doutorado de Victor Cláudio Paradela Ferreira, FGV, Escola de Administração Pública e de Empresas, Rio de Janeiro, 2005.
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