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PLUTÃO, HADES E DIONÍSIO

Loucura e Despedaçamento

Marcelo Cronos Brasil

 

Violentos ritos de passagem

Uma imagem perturbadora: uma jovem de Hiroshima, quatro dias após a explosão da primeira bomba atômica, sofre o despedaçamento de seu corpo, que, literalmente, se rasga em tiras. Hiroshima traz para a experiência coletiva o sentido de aniquilamento atribuído a Plutão.

Observando em diversas mitologias, vemos os 'criadores' de Sol Negro. Desde Loki que precipita morte de Balder, o Sol, para que ele vá para os reinos de Hel. Seth, que mata Osíris e o torna senhor infernal. Hera, que praticamente mata Sêmele. Ou até os titãs que despedaçam Dionísio para o nascimento de Zeus Zagreus. Esses criadores são deuses ligados à iniciação de deuses, função completamente saturnal, de ritos de passagem divinos e violentos. Senhores de esferas não compreensíveis, pois estão além de qualquer consciência interpretativa.

Dionísio/Hades, como podem ver, não é um deus de significados fáceis. Podemos ficar a vida toda a estudá-lo. Porém é uma absoluta perda de tempo. Dionísio nos chama para experiência dele. Seu culto era perseguido e sua figura expressava uma profunda vingança. Destruía completamente seus perseguidores, lançando-os aos pedaços, como em sua própria iniciação (narrada no mito helenizado dos mistérios de Osíris). Era algo muito semelhante aos poderes das bruxas tessalianas, conforme Apuleio, que despedaçavam os homens e os juntavam novamente. As brumas de Dionísio existiam para todos que não pertenciam a sua iniciação. Seu culto era secreto e proibido a qualquer leigo. E a punição pelos sacrilégios era o despedaçamento, normalmente pelas bacantes enlouquecidas. Dionísio é o senhor da alma feminina. É o sedutor e eterno amante, o homem cheio da mais profunda luxúria que todas sonham e ao mesmo tempo nunca irão encontrar. Pois ao encontrarem serão seduzidas e levadas ao Sabá eterno. O criador e iniciador das bruxas.

Dionísio se expressa em toda a idade medieval pelo Sabá das feiticeiras, onde se veste de preto. É o Homem Negro do Sabá, que cativa seus bruxos pelo juramento de sangue. Ele e a grande feiticeira, a rainha do Sabá. Todos perante o Bode Obsceno, no beijo ao ânus do senhor de todo o poder da bruxaria e do êxtase da realização de todos os desejos. E o método de encontro passa pelo Vinus Sabbati, o ungüento das feiticeiras. O Sabá, a bacanal das feiticeiras, onde crianças seriam despedaçadas e devoradas.

Podemos encontrar esse senhor da dissolução espalhado por toda a humanidade. É o ego do inconsciente, reino de Posseidon. O senhor da Sombra, a Pantera Negra, o devorador. É o deus que anda pela terra, que aqui a tudo domina e que quer sempre e sempre mais poder e mais poder. Não se lhe pode resistir. É impossível de ser controlado. Tem controle absoluto. É um dos mais perigosos de todos os deuses. Contatá-lo é difícil, pois temos de entrar em seu êxtase, em sua dissolução. É ele quem cria os seres finais, que abre as portas do apocalipse individual, o senhor da Revelação, do Julgamento. Mas ele sempre chega, mais cedo ou mais tarde, e não gosta de ir embora, com todo trânsito plutoniano.

Encaro Plutão como um planeta de limites entre o sistema solar e a galáxia, como um elemento de dissolução final, um devorador, um homem que quer domínio. É por essa ação que ele age, sem que percebamos. Planejou com Zeus o rapto de Perséfone, sua sobrinha, rainha infernal, que em alguns mitos é a despedaçada. A experiência plutoniana é do despedaçar, do rasgar, do não ser possível conter. É o fluxo de poder que tira a razão e leva ao impulso puro. Enquanto o domínio de Saturno sobre o consciente é real e perceptível, Plutão não pode ser encontrado em vias racionais e estruturadas. Ambos são mestres em conter e obter forças ao libertar. E a libertação dionisíaca, aquela que era pregada pelos órficos, é pela purificação máxima. Destruição daquilo que nos faz reais e conscientes, pela integração entre consciência e inconsciência, dissolvendo-as. Nesse caso Plutão não é um senhor da morte. Ele é aquele que Kerenyi associou com a palavra grega Zoé, vida plena e eterna, em contraparte com Bios, vida física.

Dionísio é o Cristo Negro, o Logos que desce para a mansão dos mortos. O Cristo após o sacrifício de morte, despedaçamento e desaparecimento total. Pronto para o renascer e transcender estados. Quando o Sol da Meia-Noite passou no meio das presas da Grande Serpente (ou quem sabe, o Pássaro, ou quem sabe, o Dragão) que cria a ilusão do mundo. Viver a experiência dionisíaca é ser o Sol nascente, onde, segundo os gregos, estava Lúcifer, a estrela da manhã. E o Sol do despertar, ou Abraxás.

Dionísio é tão sedutor e traiçoeiro quanto o próprio caminho da humanidade. Absorvê-lo é ser como Shiva. É trilhar o caminho de Shiva. É ser o Louco na beira do abismo. É saltar nele como se salta em um buraco negro, passar pelo lado desconhecido do universo e se tornar um buraco branco radiante, criador de galáxias, ou como Shiva, de universos.

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