O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso nasceu no Rio de Janeiro, no dia 18 de junho de 1931, aos quinze minutos da madrugada (0h15). Uma característica interessante de sua carta é que as casas praticamente coincidem com a sequência natural dos signos: o Ascendente está no primeiro grau de Áries, o Meio do Céu no primeiro grau de Capricórnio, e assim por diante (Raul V. Martinez levanta a possibilidade, com base em graus simbólicos e na aparência física do presidente, de que seu Ascendente esteja, na verdade, no último grau de Peixes).
Dependendo do sistema de casas que utilizarmos, alguns signos podem estar interceptados. Com o sistema topocêntrico, por exemplo, o último grau de Áries ocupa a cúspide da 2, deixando Touro interceptado nesta casa (o mesmo ocorrendo com Escorpião na oposta casa 8, naturalmente).
FHC tem três planetas em Gêmeos, na casa 3: Vênus, Mercúrio e Sol. Como Netuno e Marte estão conjuntos em Virgem no início da casa 6, Mercúrio assume um papel preponderante, já que está em domicílio por signo e por casa e é dispositor de quatro planetas. É um Mercúrio quase sem aspectos, já que forma apenas uma quadratura extremamente aberta com Marte (órbita de oito graus) e uma conjunção ainda mais aberta com Vênus (órbita de nove graus). Na prática, podemos considerá-lo quase como um Mercúrio “solto”.
Esta ênfase em Gêmeos e na casa 3 já explica algumas habilidades de Fernando Henrique: a palavra fácil, rápida, fluente, a riqueza vocabular, a lúcida concatenação de ideias, a disposição para o debate e o prazer com que a ele se entrega. FHC construiu sua reputação como intelectual, professor e escritor. Durante as campanhas eleitorais de que participou – para o senado, a prefeitura de São Paulo e a presidência da República – sempre impressionou o eleitorado pela argumentação articulada, pelo domínio conceitual e pela capacidade de transitar sem embaraços pelos assuntos mais diversos. Tudo isso é Gêmeos, Gêmeos, Gêmeos.
Por outro lado, esta mesma ênfase nos mercurianos signos de Gêmeos e Virgem torna FHC um tipo pouco emocional e com baixa capacidade de estabelecer um vínculo de empatia com as massas. Fernando Henrique parece um tanto frio e distanciado do mundo real. Em alguns momentos, tais características de personalidade representaram um trunfo político; em outros, um verdadeiro fardo. O planeta-chave, aqui, é Mercúrio, e é interessante observar que ativações estavam presentes na carta de Fernando Henrique em alguns momentos cruciais de sua vida política.
A carta do presidente apresenta Vênus na cúspide da casa 3, em quadratura quase exata a Netuno e Marte em Virgem, no início da casa 6. Contatos tensos Vênus-Marte normalmente indicam alguém ansioso para realizar rapidamente os próprios desejos. Já Vênus em quadratura com Netuno é um aspecto que pode levar ao idealismo mas também à baixa capacidade de discriminar qual a escolha acertada entre várias alternativas. Vênus rege a casa 7 do presidente, a do cônjuge, dos associados íntimos e dos compromissos. Netuno rege a 12, das negociações de bastidores e dos assuntos que ficam velados à vista do público. Contatos entre os regentes da 7 e da 12 podem indicar várias possibilidades: negociações com adversários, acordos que resultam em traições, compromissos secretos, conchavos ou ainda alianças com indivíduos ou instituições preocupados com problemas sociais e com grupos marginalizados.
Este aspecto tem forte relação com a área acadêmica escolhida por Fernando Henrique: a Sociologia e, dentro dela, a preocupação com o tema da exclusão social. Seu livro de maior sucesso foi exatamente Capitalismo e Escravidão no Brasil Meridional, publicado em 1962. O aspecto ajuda a entender também o casamento de FHC com Ruth Cardoso, uma intelectual sensível e originária do mesmo ambiente universitário. Como o planeta Vênus no mapa de um homem é significador de um certo tipo de mulher que o atrai, FHC gosta de mulheres cultas e inteligentes (Vênus em Gêmeos na 3) mas também sensíveis e discretas (Vênus aspectando Netuno regente da 12).
FHC: sedução netuniana e ambição saturnina
Não se pode esquecer que Marte é o regente do Ascendente de Fernando Henrique (considerando o Ascendente oficial em Áries), ou pelo menos está em conjunção com o regente do Ascendente corrigido (considerando a hipótese Peixes). De qualquer forma, trata-se de um planeta essencial para a compreensão de seu modelo operacional básico. Marte conjunto a Netuno e em quadratura com Vênus é o perfeito retrato do sedutor. No caso, a sedução se dá pelo uso da palavra (casa 3, Gêmeos) e pela capacidade de impressionar o interlocutor com o conhecimento técnico e domínio dos detalhes (Virgem). FHC é também fascinado pela perspectiva de colocar em prática (casa 6, Virgem) esquemas vastos, abstratos e às vezes fantasiosos ou irrealistas (Netuno). Alguma razão têm, neste ponto, os críticos que diziam que o presidente enxergava um Brasil que não era o mesmo da gente da rua.
A casa 6 rege trabalhadores, sindicatos, funcionários públicos – todo o pessoal subalterno, de uma forma geral. Netuno nesta casa pode dar a FHC uma certa dificuldade para entender a realidade do trabalhador comum, assim como trazer aborrecimentos relacionados a questões trabalhistas. O grande calcanhar de Aquiles de seu governo foi exatamente o crescente índice de desemprego, associado ao desgaste provocado pelo esforço (apenas parcialmente bem sucedido) de equacionar o déficit da Previdência Social mediante a supressão de diferenciações nos critérios de concessão de aposentadorias. FHC nunca foi muito popular entre funcionários públicos e líderes sindicais, o que não é estranhável se considerarmos seus aspectos tensos de casa 6 e a presença, aí, do regente da 12.
A configuração Marte-Vênus-Netuno também é responsável pela imagem de indecisão frequentemente associada ao presidente. Idas e vindas são normais num geminiano, um tipo com muitos recursos e muitas alternativas. Em parte, as oscilações do presidente são característica deste signo mutável, mais apto para discutir brilhantemente sobre hipóteses do que para transformá-las em realidade. Contudo, Netuno em conjunção com Marte agrega um toque de nebulosidade aos atos do ex-presidente, que tem, entre suas habilidades, a de fazer de conta que vai por um caminho enquanto prepara o terreno para tomar uma direção absolutamente diversa. FHC é hábil para seduzir enquanto ganha tempo, para desviar a atenção do público para alguma coisa enquanto faz outra. Esta configuração dá a Fernando Henrique qualidades e defeitos típicos da combinação Gêmeos-Peixes: adaptabilidade, instabilidade, versatilidade, uma certa superficialidade, encanto pessoal, características que às vezes o tornam semelhante ao mágico que tira coelhos da cartola e faz desaparecer lenços coloridos, ou ao dançarino que se sai bem em todos os gêneros musicais ao mesmo tempo em que consegue flertar com todas as moças da festa.
Porém, a configuração decisiva para entendermos o perfil de Fernando Henrique é a quadratura T formada por Saturno na 10, Urano na 1 e a tripla conjunção Plutão-Lua-Júpiter na 4. Saturno em Capricórnio é o único planeta acima da linha do horizonte, sendo também a alça de um Balde, o que lhe dá um destaque excepcional. O Balde é um modelo de distribuição planetária em que um único planeta se contrapõe aos outros nove, funcionando como a alça que puxa todo o recipiente. Saturno em Capricórnio como ponto focal do mapa – e na casa 10! – expressa claramente a ambição política, a familiaridade com o ambiente do poder, o estar à vontade no exercício de cargos executivos. FHC não é apenas o intelectual brilhante mas despreparado que muitos imaginavam antes de sua ascensão à presidência: é o animal político por definição, que precisa do poder e exerce-o com verdadeira paixão.
Paixão? Vejamos que planetas aspectam Saturno: o intenso Plutão, o expansivo Júpiter e a receptiva Lua, todos em Câncer, na casa 4. Esta é a casa das bases emocionais, do refúgio secreto, da verdadeira intimidade. No fundo, FHC precisa de segurança, uma segurança que é buscada com a tenacidade canceriana a serviço do impulso verticalizante de Saturno. A segurança está lá em cima, no poder, no cargo máximo, na ascensão solitária até o topo da montanha. A intensidade emocional de Fernando Henrique está um tanto velada pela discrição da casa 4, mas seus efeitos são visíveis. Basta observar Urano na 1, para onde convergem todos os aspectos da quadratura T. Urano, o reformador, rege a casa 11, das ideologias e dos projetos sociais, e está em Áries, o signo do pioneiro. Como FHC desejava passar para a História? Sem dúvida, como o presidente que promoveu as reformas de base no aparelho de Estado e integrou o Brasil no mundo moderno e globalizado.
Reformas e modernidade são assunto de Urano, e é exatamente aí que encontramos a grande contradição deste mapa. Urano na 1 identifica-se com a imagem do indivíduo aberto, de ideais democráticos e avançados, mas raramente se comporta assim na prática. Em primeiro lugar, porque Urano é impaciente e está tão ocupado em experimentar suas próprias ideias que não tem muito tempo para ouvir o outro; em segundo lugar, porque Urano é mentalmente intransigente, não desistindo com facilidade de seus pontos de vista. Some-se a esta característica a rigidez da conjunção Lua-Plutão e temos o retrato do homem que quer fazer mudanças para o benefício da sociedade, mas do seu próprio jeito. Neste ponto, surge uma inesperada proximidade entre FHC e políticos do estilo de Leonel Brizola, por exemplo: no fundo, FHC é um individualista pouco disposto a ceder a pressões e interferências. Todas as habilidades de negociação e de sedução política de que dispõe estão a serviço de uma profunda necessidade de proteger (Lua-Plutão em Câncer) sua autoridade (Saturno na 10) e seu projeto político pessoal.
Estas características não tornaram, por si só, Fernando Henrique melhor ou pior como ser humano ou como presidente. Apenas configuram um perfil, uma estrutura básica de personalidade que, em determinadas ocasiões, poderá ser exatamente a mais adequada para as necessidades do momento histórico, enquanto, em outras, poderá representar um obstáculo ao cumprimento do papel de dirigente máximo do país.