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COLUNISTAS
Astrologia:
uma questão de imagem (e de diferenças)
Segundo o editor de Constelar, meu último
artigo para esta coluna só perdeu em número de acessos para
o mapa do Roberto Jefferson e para o artigo sobre o incêndio do
edifício Joelma. Considerando que os dois artigos que me sobrepujaram
são ambos incendiários, e a minha intenção
é totalmente piromaníaca, creio que estou quase chegando
lá.
"A diferença nos
unge,
a diferença nos fará imunes ao contágio totalitário"
(Tetê Catalão)
"O contrário em
tensão é convergente;
da divergência dos contrários, a mais bela harmonia"
(Heráclito)
Ainda neste primeiro semestre de 2005,
o astrólogo paulistano Robson Papaleo me convidou para integrar
uma mesa-redonda com outros colegas, objetivando discutir a astrologia
enquanto uma questão de imagem. Papaleo é geminiano e, como
todo bom filho de Mercúrio, aprecia o contraponto e o estimula
como uma forma de fortalecer as virtudes do pensamento. Fizeram parte
desta mesa, além deste que vos escreve e do próprio Robson,
os astrólogos Carlos Fini, Márcia Bernardo,
Maurício Bernis e Paulo de Tarso. Fomos mediados
por George Ferreira Jorge, da Escola Santista de Astrologia. Curiosamente,
nos vimos diante de uma platéia imensa, atenta, composta por astrólogos
atuantes. Uma das coisas mais raras em congressos de astrologia é
presenciar colegas assistindo conferências de outros colegas. A
maioria - com louváveis exceções - apenas aparece
para dar seu showzinho particular e sai correndo. E sim, se você
freqüenta congressos de astrologia, sabe que eu não estou
falando nenhuma mentira. Se você não é destes, meus
parabéns. Seu risco de esclerosar e ficar fazendo a mesma palestra
repetidamente, ano após ano, será bem menor!
Debate na Gaia. Da esquerda para a direita:
George Ferreira Jorge,
Robson Papaleo, Paulo de Tarso, Maurício Bernis, Márcia
Bernardo,
Carlos Fini e Alexey Dodsworth.
Logo de cara, me chamou a atenção o fato de
que versar sobre a astrologia como uma questão de imagem tem um
duplo sentido. O primeiro, mais sutil, diz respeito ao fato de que a astrologia
é, antes de tudo, uma questão para as imagens. O
objeto de estudo do leitor dos céus são as imagens geométricas
produzidas pelos astros em sua dança. Este leitor, o astrólogo,
lança questões para estas imagens, o que no final das contas
é sempre uma questão de aparências, uma vez que lidamos
com o que nos parece, com o nosso olhar diante da singularidade de uma
geometria.
Seria este olhar um olhar objetivo? Como nos relembra Mauro
Ceruti, objetividade é "acreditar que as características
do observador não interferem nas descrições de suas
observações". Deste modo, as questões lançadas
para as imagens, por parte do astrólogo, têm por conseqüência
a criação de universos, de perspectivas, de verdades sempre
multânimes. O astrólogo, ao ler uma imagem, cria um
universo e se torna co-responsável pela conversão do símbolo
de seu cliente numa manifestação dinâmica - a qual
podemos chamar de "destino".
Enquanto prática perspectivista, a astrologia
admite o ponto de vista do observador (o astrólogo) que toma os
céus como um cenário através do qual a alma se derrama,
e os significados - que não vêm prontos, mas são criados
- podem ser construídos em muitos níveis diferentes. Se
você pensa que o que estou dizendo é muito complicado, faça
uma experiência: faça seu mapa com três astrólogos
diferentes. Eles não cairão em contradição,
mas fornecerão visões diferentes para os mesmos símbolos
astrais. Todas estas visões estão certas, mas nenhuma delas
pode assumir status de "A Visão". Quem está no
centro do seu mapa é você. Assim é se lhe parece.
A leitura do seu mapa, por parte de outro, tratar-se-á sempre de
um olhar a partir de outro céu. Como poderíamos, então,
imaginar objetividade por parte de qualquer pessoa que tenha a pretensão
de ser "objetiva"?
Esta "forma de sentir, de ver, de pensar" a astrologia
não é lá muito tradicional - o que não lhe
retira o mérito. Os puristas do astral apostam na existência
de uma "verdade", de uma "interpretação certa"
para as imagens astrológicas. É apenas no florescimento
do Romantismo que se abrem as portas de uma filosofia da subjetividade,
fundada em Kant, que termina por se desenvolver numa mutação
do pensamento, um constante "construir" de perspectivas que
se baseiam na verdade do sujeito, assunto de constantes investigações
por parte de Hegel, Kierkergaard, Schopenhauer, Nietzsche, Freud, Jung,
Sartre, Marx, Hegel, Einstein, dentre tantas outras grandes mentes que,
ainda que não necessariamente "conhecedoras da astrologia"
(com exceção, talvez, de Jung, que passeou pelo assunto),
trouxeram à baila aquilo que a astrologia nos ensina há
milhares e milhares de anos: o real é o que nos parece.
Afinal de contas, o céu estudado é aquele que se vê,
e não o "céu real". No final das contas, a astrologia
é mesmo uma questão de imagens. Todos os pensadores relacionados,
ainda que ignorantes em astrologia, podem ter suas percepções
reduzidas a dois elementos fundamentais: todos versam sobre o espaço
e o tempo - os dois elementos fundamentais da astrologia que, combinados,
criam a "cruz" dinâmica que chamamos de carta astrológica.
Uma imagem permanentemente mutante, apresentando não uma, mas múltiplas
verdades.
O pensamento perspectivista, uma questão de imagem,
nos apresenta à possibilidade de uma nova transcendência,
ou melhor dizendo: uma transcendência inversa, onde não
há um sistema absoluto de medidas, de certezas, de verdades, nada
"uniforme" que abarque e pasteurize os elementos numa "mesma
coisa". Ao absoluto, o luto.
Enquanto desejar-se viabilizar a astrologia por intermédio
da estatística (esta fascinante forma de tortura em que se espremem
os dados até que os números confessem aquilo que queremos
ouvir), do céu pouco ou nada entenderemos. E antes que suponham
que falo contra a ciência, cito Dante Galeffi, que em sua obra "O
Ser-Sendo da Filosofia" anuncia:
Epistemologicamente falando, não há
modelo possível capaz de unificar o campo das ciências humanas.
A única saída, ainda que utópica, seria a ética.
No caso, é a ética que poderia instaurar a possibilidade
da intercomunicação entre as várias humanidades.
Mas, isto só poderá vir a acontecer na medida em que as
várias ciências do homem não pretendam, cada uma por
seu turno, cair na ilusão fatal de que oferecem a mais perfeita
e avançada verdade possível ao homem (...)
Dito isso, façamos uma pausa para a meditação.
Respire fundo. De novo. Ah, não custa respirar de novo e mentalizar
um globo azul. Vamos à parte 2 deste artigo.
Astrologia,
mídia e relações de poder
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