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CONGRESSO
Astrologia, Liberdade e
Transformaçã
o

São Paulo,
22 e 23 de março

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ASTROLOGIA DO CONFORMISMO X ASTROLOGIA DA TRANSFORMAÇÃO

Astrologia Pocotó
(pocotó, pocotó)

Alexey Dodsworth

Parte 1
 

Faz parte da natureza humana o imenso desejo de acreditar em algo, seja lá o que for, pagando o amargo preço que lhe seja cobrado, contanto que isso atenue ou até mesmo elimine o desenvolvimento de uma visão mais crítica e apurada do ambiente circundante e de si mesmo. Sendo mais sucinto e talvez até mesmo correndo o risco de ser um pouco cruel, posso dizer que as pessoas querem ser enganadas. E esta tendência, justamente por ser intrínseca ao gênero humano, não é limitada a esta ou aquela classe social, povo ou sexo. Nasce, sobretudo, do profundo cansaço de viver, e é compreensível. Termina sendo preferível apegar-se a algo que prometa um mundo encantado do que cansar-se lutando por um mundo melhor. E, dentro desta perspectiva, todo o conhecimento que existe neste mundo pode ter duas faces: o lado que ilumina, desperta, imprime desenvolvimento e ampliação da consciência, e o lado que ilude, que anestesia e entorpece. E com a astrologia não é diferente.

Para os familiarizados em linguagem astrológica, Netuno - um dos três planetas transpessoais - é o representante arquetípico desta "força" que tanto ilude quanto desperta. De certo modo, como é sabido, o que diferencia o veneno do remédio é tão simplesmente a dose, e não é à toa que a palavra "álcool" significa "espírito", e que "éter" seja um termo utilizado para designar tanto uma esfera superior da existência quanto aquela substância que os seres humanos apreciam aspirar no carnaval. E membros ativos do universo dito "alternativo" sorvem do mesmo oceano netuniano que pode nos conduzir à entorpecência ou à iluminação. O éter que ilumina ou que dopa, nos conferindo alguns segundos, minutos ou dias de felicidade não é apenas inerente aos ditos "seres humanos normais", mas é amplamente vivenciado - sobretudo, diria eu - por aqueles dedicados a uma forma menos cartesiana do saber.

Do mesmo modo que a eguinha pocotó tanto agrada a ponto de virar parada de sucesso, a astrologia do "fale de mim" existe porque reflete a qualidade da maioria da massa humana. A astrologia que se vende não aprofunda, apenas descreve e fascina: falso brilho que entorpece e nada muda.

E os astrólogos, não menos vítimas das ilusões netunianas do que qualquer outro ser humano, se equivocam em sua fantasia de que a astrologia é "menos esotérica" do que o tarô ou um jogo de búzios simplesmente porque seu saber envolve cálculos matemáticos e uma ilusão de mecanicismo. Ocorre que, via de regra, estes mesmos representantes da arte de ler o céu esquecem-se de que, sendo a astrologia simbólica, simplesmente não pode ser factual, e que não precisa ser "científica" - dentro de um sentido meramente cartesiano - para funcionar. O alfabeto dos astrólogos compreende letras cujas frases permitem múltiplas possibilidades, mas todas com o mesmo sentido, e esta é a beleza da astrologia: ao mesmo tempo que indica a tendência, abre um universo de possibilidades superiores e primitivas de manifestação de cada arquétipo. Num mundo sem sentido, confuso, praticamente entupido de informação não essencial, a astrologia vem a ser a estranha e fascinante forma de imbuir uma experiência de significado. Para quem conhece astrologia, um fato jamais estará livre de sentido, e dois fatos podem ser similares em termos de ocorrência, mas serão totalmente diversos no que tange ao significado. Duas perdas afetivas significarão coisas diferentes a depender do espírito do momento - espírito este que é o objeto de estudo do astrólogo.

Podemos então dizer que um dos grandes papéis do astrólogo consciente não é necessariamente o de antever fatos, e sim o de demonstrar o significado por trás das ocorrências. Não é prioritário ou necessariamente válido "adivinhar" que uma relação terminará entre setembro de 2003 e março de 2004 - até porque o mesmo aspecto que poderia significar isso pode significar muitas outras coisas, dentro de um limite mais ou menos preciso de possibilidades. Mais importante ainda é desvelar o sentido da experiência de estar vivo entre setembro de 2003 e março de 2004. Se é uma separação o que irá ocorrer, ou mesmo o fim de uma "forma" de se viver uma relação, o que importa não é o fato em si, mas o que ele tem a ensinar.

Do mesmo modo, o importante não é "acertar" que uma pessoa é romântica, ou mais ácida, ou se ela gosta de viajar ou se prefere ficar em casa vendo TV. Astrologicamente falando, o mais importante seria entender as razões deste comportamento e, mais do que isso, mostrar que existem outras formas de viver um mesmo arquétipo. Afinal de contas, Lua em Câncer significa muito mais do que uma pessoa emocionalmente suscetível.

Entretanto, numa sociedade cada vez mais fast em diversos sentidos - fast foods, fast relationships, fast sex -, o que agrada não é a astrologia que faz pensar. O que move as massas e também infelizmente muitos astrólogos que aceitam de bom grado este ridículo papel é a chamada "fast astrology", meramente descritiva, totalmente desprovida de algum sentido além do papel de dizer que Dona Fulana é comunicativa e que o Senhor Beltrano é muito hábil na arte de catar erros ortográficos.

Mas, sinceros sejamos, não adianta reclamar dos astrólogos que se limitam a este patamar de leitura, que apenas descreve e - pior - cria a justificativa perfeita para que a pobre criatura continue em sua cansativa jornada de "ser ela mesmo", estufando o peito com resignado orgulho e apelando para a falácia do "eu nasci assim, eu cresci assim". Desculpa típica dos incompetentes na arte da guerra, que envolve vencer antes de tudo, acima de tudo e além de tudo a si mesmo. Não adianta reclamar do astrólogo cujo trabalho se resume a dizer se você é uma pessoa extrovertida ou se é demasiadamente racional e que nada oferece além disso. Do mesmo modo que a eguinha pocotó tanto agrada a ponto de virar parada de sucesso e hino deste carnaval de 2003, da mesma forma que alguns atores fazem sucesso não por sua verve representativa, mas pela aparência que lhes permitiu exímio alpinismo profissional, a astrologia do "fale de mim" (seguida de olhos arregalados e bocas escancaradas - mas nada muito além disso) existe porque reflete a qualidade da maioria da massa humana - que, ainda entalada numa fase egocentrada, ocupa-se simplesmente em ver na astrologia algo fascinante que revela nossos comportamentos superficiais ou até mesmo se gostamos de sexo convencional ou em cima da pia, como vi certa vez num famoso talk show. A astrologia que se vende não aprofunda, apenas descreve e fascina: falso brilho que entorpece e nada muda.

As pessoas não gostam do que faz pensar. Elas querem apenas o que lhes permita fazer um pocotó neural.

A culpa pelo sucesso de abjeta música não pode ser atribuída, portanto, às pobres éguas, que são lindos e fortes animais - diferentes dos referenciais femininos de beleza, que nada têm do viço das poderosas éguas - , nem muito menos podemos dizer que culpado é o pobre indivíduo que pensa que é artista mas é apenas famoso, e até mesmo questiono se de fato é "mal intencionado" o astrólogo que diz que se você tem Vênus em Escorpião, seu namorado tem que tomar cuidado com o seu mortal ciúme e possessividade e, dizendo tal pérola numa consulta que a isso se resume, acha que é astrólogo.

Se existe a humana eqüinizada - uma ofensa às éguas - é porque o espírito de um povo assim o pede, compra esta CD, dança quando isso toca. E aí voltamos ao início do nosso vicioso círculo, apontado no início deste texto: as pessoas não gostam do que faz pensar. Elas querem apenas o que lhes permita fazer um pocotó neural. A solução destes problemas não é nem a censura, nem declarar-se negro ou pardo apenas para passar no vestibular, nem colocar astrólogos na fogueira porque eles se limitam a uma astrologia descritiva boba. É tudo uma questão de formação e informação. Qualquer outra solução que aparente ser rápida será fruto da mesma cultura fast que cria mau gosto musical, idiossincrasias raciais e estupidez astrológica.

Assim sendo, se você quer ganhar muito dinheiro e ser um astrólogo famoso (observação importante: não estou falando de ser um astrólogo artista, coisa cansativa e fastidiosa, falo de ser apenas famoso, o que exige apenas uma boa dose de maquiagem), fique atento às regras necessárias para eqüinizar a astrologia:

Regras para eqüinizar a astrologia


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