A pitada final de loucura
Mas a pitada final de loucura veio quando jornais
e portais da internet fizeram - como fazem a todos os astrólogos
em ocasiões semelhantes - solicitações de análises
sobre as chances do Brasil. Um jornalista, em especial, insistiu
no pedido e ainda fez questão de especificar exatamente o
que eu deveria fazer: "O que a gente queria é que você
analisasse as chances falando do anjo de cada jogador de
acordo com o signo e dos talismãs que eles deveriam
usar para fazer os gols."
Anjos? Talismãs? O que mais eles queriam?
Um astrólogo de turbante? Para resumir, escrevi o artigo
já furioso, tentando utilizar o pretexto da Copa para falar
de nossa crise cotidiana - esta sim, altamente preocupante. O grande
erro foi fazer uma identificação pura e simples entre
o país e a seleção. Algo do tipo: enquanto
o país não superar suas mazelas, a seleção
não tem o direito de ganhar a Copa. Fiz um julgamento moral,
não um julgamento astrológico.
Astrólogos modernos tendem a associar a Astrologia
a Urano, mas seria muito mais correto vê-la como arte regida
por Mercúrio e Saturno. É preciso raciocínio
frio, abstrato, lógico, distanciado da situação,
para que possamos ter um julgamento astrológico claro e seguro.
Sem o bom senso e o raciocínio estruturado de Mercúrio
e Saturno, o astrólogo tende a perder o senso de ordem, de
proporção, de limite, extrapolando as possibilidades
interpretativas do símbolo e projetando nos fatos desdobramentos
que o mapa não autoriza de forma conclusiva.
Com base em pesquisas bastante consistentes, não
tenho dúvidas de que o trânsito de Plutão pelos
signos mutáveis, ativando Sol e Mercúrio da Independência,
é sempre um fator de acirramento e agudização
de tensões sociais. Por outro lado, Plutão também
é um significador importante em dois momentos difíceis
para o futebol brasileiro, que são a perda da Copa de 1950,
em pleno Maracanã, e o vexame na Copa da Inglaterra, em 1966.
Um fato fortuito - a coincidência da angularidade da oposição
Saturno-Plutão tanto no mapa da abertura ca Copa quanto no
mapa do assassinato do jornalista Tim Lopes - levou-me a delirar
de vez.
Todo astrólogo trabalha com associações,
com imagens, com símbolos abertos. Portanto, há um
determinado ponto da análise astrológica em que todas
as hipóteses, por mais absurdas que pareçam, são
colocadas na mesa. Aí é o rigor da lógica Mercúrio-Saturno
deve entrar em cena para pinçar, das hipóteses imaginosas,
aquelas que realmente fazem sentido. Cada uma precisa ser devidamente
testada, o que implica analisar séries históricas
em busca de dois tipos de confirmação: o fator considerado
deve estar presente em todas as situações que
postulamos serem a ele associáveis; e deve estar ausente
sempre que a situação não se verificar.
Analisando friamente, o conjunto de significadores
que considerei tem relação inequívoca, desde
o período colonial, com o problema da violência no
Rio de Janeiro e com fases de tensão e radicalização
de posições na política nacional. Contribui
para explicar alguns traços da cultura brasileira, como a
supervalorização de fatores geminianos. Mas não
explica a seqüência de vitórias e derrotas da
seleção ao longo das 17 copas já realizadas.
Os cuidados que devem ser tomados na análise de eventos esportivos
já haviam sido assunto de Constelar em novembro de
1999. Vejam o que escrevi na ocasião, lembrando que o que
foi dito para clubes vale também para seleções
nacionais:
Analisando eventos esportivos
A análise de instituições e eventos
esportivos é uma área relativamente recente na Astrologia,
e cheia de complexas sutilezas. Na verdade, a Astrologia Esportiva
é um campo de aplicação de várias vertentes
deste saber, e muitas vezes o astrólogo, ao privilegiar uma
determinada abordagem, perde de vista outras não menos válidas,
cujo uso poderia ser decisivo para a compreensão do conteúdo
simbólico presente no fenômeno dos esportes coletivos.
As ferramentas existem, mas faltam ainda estudos detalhados para
determinar sua hierarquia. (...)
Várias técnicas podem ser utilizadas
para a análise de uma partida de futebol, e raramente com
100% de acerto. Vejamos algumas:
· Levantar o mapa de fundação
dos dois clubes envolvidos e verificar qual deles está sendo
ativado de maneira mais poderosa e benéfica por trânsitos,
progressões primárias e secundárias, arcos
solares, revoluções solares e lunares etc.
· Fazer o mesmo com o mapa de todos os jogadores (ou pelo
menos dos principais) e também do técnico... e talvez
dos principais dirigentes!
· Fazer uma sinastria entre o mapa de fundação
do clube e a carta do início da partida.
· Levantar uma sinastria entre as cartas dos dois clubes,
para determinar como cada um afeta o outro.
· No caso de uma partida disputada entre clubes ou seleções
de regiões distantes uma da outra, levantar a carta do início
da partida e depois relocá-la para as sedes dos dois clubes,
verificando qual das duas apresenta uma domificação
mais promissora.
· Comparar o mapa de cada clube ou seleção
com o mapa da inauguração do estádio em que
a partida será disputada.
· Observar que linhas do mapa Local Space de cada clube cruzam
as proximidades do estádio em que a partida será disputada.
Estas são apenas algumas possibilidades. Mas
as dificuldades não param por aí. (...) O exemplo
vem a propósito pois revela a constante presença de
duas facetas na análise: de um lado, a exigência do
manejo correto da linguagem astrológica, qual seja, a capacidade
de identificar a função gramatical de cada elemento
do mapa e hierarquizar sua importância relativa; e, de outro
lado, o correto trabalho de tradução, ou seja, a transposição
de significadores do contexto puramente astrológico para
o contexto da realidade observada. Quanto mais complexa e relativizada
for esta realidade, mais dificuldades para o trabalho de tradução.
Comentário pós-Copa 2002: fazer
previsões desse tipo realmente é um risco desnecessário
(ou um dispensável ato de arrogância), porque dá
munição aos adversários da Astrologia. Não
há metodologia segura, não por culpa da Astrologia,
mas por falta de mais pesquisas nesta área. Tanto que não
há nenhum astrólogo que tenha conseguido, por exemplo,
acertar uma seqüência de três ou quatro clubes
campeões de torneios brasileiros ou estaduais.
Os acertos do primeiro artigo
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