Que tipo de super-herói
é o Homem-Aranha, criado em 1962 e transformado em
filme de sucesso quatro décadas depois? Qual seu simbolismo
astrológico? Carlos Hollanda dá a resposta e,
tecendo a teia das analogias, aproveita para estudar o Duende
Verde e os vilões dos próximos filmes. Eletrizante!
O super-herói
sofre como um Cristo medieval
Alguns astrólogos já escreveram
a respeito de personagens de histórias em quadrinhos
e cultura popular. No entanto, muita gente que ainda não
leu trabalhos desse tipo deve estar estranhando o fato de
um super-herói ser compreendido segundo parâmetros
astrológicos. "Para quê eu vou ler isso?
Não tem nada a ver!" - poderiam dizer. Posso assegurar,
porém, que estarão perdendo uma excelente oportunidade
de descobrir que a simbólica dos personagens não
só é muito divertido como extremamente didática.
É ainda muito mais esclarecedora do ponto de vista
da Psicologia Social e da Antropologia Cultural. É
um verdadeiro exercício de autoconhecimento. Você
ainda duvida disso? Então, como o fariam os personagens
de quadrinhos, desafiamos você a continuar a ler toda
a matéria sem mudar de idéia.
"Todo homem é filho de seu
tempo", diria o historiador italiano Benedetto Croce.
Podemos expandir esta afirmação e dizer que
toda obra, todo personagem e todo contexto deste personagem
também são filhos de seu tempo e marcam o espírito
de uma geração. Mais ainda, uma vez que refletem
conteúdos arquetípicos, isto é, comuns
a todos os seres humanos, transcendem sua geração
e figuram como uma mitologia moderna para gerações
futuras. Esta forma atual de mitologia é muito pouco
considerada, pois tende-se a levar em conta apenas os mitos
das sociedades antigas. No entanto, da mesma forma que os
antigos, os mitos atuais refletem os dramas e as necessidades
tanto do indivíduo quanto das sociedades.
|
Os dramas coletivos, as tensões de uma
época e os questionamentos acerca de que rumo os acontecimentos
tomarão durante fases críticas são estranhamente
captados por indivíduos particularmente sensíveis.
São eles os escritores e os artistas. Muitas obras de literatura
assumem o caráter de seu tempo justamente porque tais pessoas
expressam metaforicamente as tendências do momento e, com
sua potente imaginação, produzem versões sobre
o possível desenrolar dos fatos. Assim foi com Julio Verne,
por exemplo, que viveu em pleno século XIX, produzindo romances
onde revela o quanto captou as possibilidades daquilo que vivenciara
em germe no cientificismo da época.
De uma certa maneira, os artistas e escritores,
produtores de cultura que são, influenciam o desenrolar dos
fatos ao formarem opiniões e trabalharem sentimentos do público.
Ainda que nem sempre de forma intencional, eles reproduzem uma ânsia
humana por vivenciar situações arquetípicas.
Disso decorre que tanto os clássicos de literatura quanto
as mais populares histórias em quadrinhos sucesso contêm
em si a expressão de arquétipos do Inconsciente Coletivo.
E é por isso que elas têm tanto apelo popular!
Seja em filmes, romances policiais, histórias
de amor ou até histórias baseadas em fatos reais,
o público que assiste busca sempre a repetição
de um arquétipo muito próprio da cultura ocidental:
o ordálio do herói, sua purificação
e sua vitória final. Encontramos isso no Antigo e Novo Testamento,
também no Bhagavad Gita, mas especialmente nos mitos nórdicos.
Estes últimos estão entranhados na mentalidade do
Ocidente graças a todo um processo de miscigenação
cultural e ao sincretismo religioso ocorrido nos primeiros séculos
da era cristã, prolongando-se por toda a Idade Média.
Trata-se da mescla entre a cultura romana, potencializada pela Igreja,
e a cultura bárbara dos germanos da Europa Medieval, que
dava extrema importância à figura do herói,
do guerreiro que precisava morrer em batalha para ir ao Walhalla
(o paraíso dos mitos nórdicos). O século XI
foi decisivo na formação da mentalidade do homem ocidental,
individualista, preocupado com causas próprias e em provar
socialmente seu valor por proezas e atos de bravura. Ao mesmo tempo
em que aí vemos traços da cultura bárbara,
a idéia de ordálio e vitória posterior do herói
remete à figura do Cristo. Este último foi inúmeras
vezes representado dramaticamente em posturas heróicas, como
queria a cultura germânica, através dos pincéis
e cinzéis dos monges medievais, os produtores culturais da
época. O Cristo representado na iconografia do Ocidente Medieval
era louro, de olhos azuis e de físico musculoso, tal qual
os representantes da cultura que a Igreja visava a atingir. Era
o oposto do Cristo da iconografia do Império Bizantino, com
feições sofridas, cabelos, pele e olhos escuros, bem
como físico curvado e nada atlético.
Leia na seqüência:
O Homem-Aranha e o Inconsciente
Coletivo
Ou use a teia e salte para:
O Homem-Aranha como um herói
aquariano
O Duende Verde e outros bandidos muito simbólicos
|