Um
olhar brasileiro em Astrologia
Edição 105 :: Março/2007 :: - |
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DISCUTINDO A REGÊNCIA DE ÉRISNem um, nem outro
Mais lenha na fogueira: Alexey Dodsworth incorpora o espírito de contradição de Éris, a deusa da discórdia que batiza o novo planeta descoberto em 2005, e traz novas luzes sobre a discussão em torno do verdadeiro regente de Touro e Libra. Era perfeitamente esperado: a partir do momento em que o corpo UB313 foi batizado de "Éris", surgiram especulações a respeito de quem este novo planeta regeria. Os signos favoritos à relocação de regentes são Touro e Libra, conforme demonstrado pelos colegas Bola e Raul na edição de dezembro de Constelar. Ofereço agora uma terceira visão (com perdão do trocadilho pretensioso): o "verdadeiro regente" de Touro e de Libra é o planeta Vênus. Simples assim. Surpreso, leitor? Não fique. A prática astrológica está longe, muito longe de ser unânime em diversos pequenos detalhes e isso, antes de ser um demérito, é o grande mérito da astrologia. Nem todos os astrólogos pretendem mudar os regentes de Touro ou de Libra, assim como há vários que continuam a aplicar as regências antigas para Escorpião, Aquário e Peixes. Classicamente, o setenário (sete astros) rege os doze signos. A proporção 7:12 sempre foi um dos pilares do conhecimento astrológico. O Sol, diurno que é, rege Leão; a Lua, por sua natureza noturna, rege Câncer. Todos os outros planetas possuem domicílios diurnos e noturnos: Marte rege diurnamente Áries e noturnamente Escorpião; Vênus rege diurnamente Libra e noturnamente Touro; Mercúrio rege diurnamente Gêmeos e noturnamente Virgem; Júpiter rege diurnamente Sagitário e noturnamente Peixes; e Saturno, por sua vez, rege Aquário diurnamente e Capricórnio noturnamente. Observem que, a partir desta lógica simples, o setenário engloba os doze signos perfeitamente. Não se trata de ignorar a importância de Urano, Netuno, Plutão ou mesmo de Éris. Entretanto, é delicado querer atribuir valor de regência a corpos trans-saturninos. Creio, aqui, que há uma confusão entre os conceitos de "regência" e "natureza". Peguemos as estrelas fixas, a título de exemplo. Elas não "regem" nada, mas possuem a natureza de vários planetas. Há estrelas com a natureza de Marte-Saturno, estrelas com a natureza de Vênus e de Júpiter. Do mesmo modo, não acho em absoluto estranho que Plutão seja análogo a Escorpião, mas eu jamais entendi Plutão como "o verdadeiro regente de Escorpião". O verdadeiro regente de Escorpião sempre foi Marte. Posso admitir, no máximo, um valor de co-regência para Plutão. Mas dizer que "o verdadeiro regente" é Plutão é ignorar que Marte também rege o oitavo signo. Meu raciocínio se pauta numa série de argumentos, e nenhum deles envolve o "argumento de antiguidade", muito utilizado pelos astrólogos clássicos, em que algo por ser antigo é mais verdadeiro ou certo do que algo novo. Curiosamente, os mesmos astrólogos que tentam modernizar a astrologia de vez em quando se fazem valer do argumento de antiguidade, principalmente quando lidam com céticos, ao afirmar que a astrologia funciona porque tem mais de cinco mil anos. Vamos, então, aos meus argumentos: A luz visívelA astrologia não lida com o céu real, e sim com o céu conforme se apresenta a nós. Se a astrologia lidasse com o céu real, consideraríamos as posições heliocêntricas, já que é a Terra que gira em torno do Sol, e não o contrário. O céu que vejo agora, enquanto escrevo estas linhas, não é o mesmo céu vislumbrado por alguém que esteja na Espanha ou por um habitante das ilhas do Pacífico Sul. Por isso, a astrologia é sempre relativa ao observador. E ela foi concebida para ser um instrumento simples, ao alcance de todos os seres, e não de apenas uns e outros. Ou seja: qualquer pessoa deveria ser capaz de interpretar os astros, dispondo do conhecimento simbólico, e para isso precisaria apenas olhar para cima. Mas eu não vejo Éris, se olho pro céu. Tampouco Urano, Netuno ou Plutão. Eles só existem porque uma autoridade me disse que existem (no caso, a autoridade científica) e eu assim aceitei. Os planetas tradicionais não pedem que tenhamos fé neles. Olhamos e vemos. Os trans-saturninos, ao contrário, demandam que eu acredite na autoridade. Imaginemos um trote astronômico: o astrônomo resolve dinamitar o meio astrológico e inventa que descobriu um corpo, batizando-o de qualquer coisa. Eis que os astrólogos começam a investigar o significado desta Qualquer-Coisa. Após dezenas de anos e muitos livros escritos sobre o novo corpo, o astrônomo safado diz que nos pregou uma peça. Observem bem, pois este é um ponto delicado do meu texto: eu não estou dizendo que Urano, Netuno, Plutão e Éris não existam e que sejam frutos de um trote. Até poderiam ser (e isso seria muito engraçado, no meu ponto de vista), mas não é nisso que acredito. Estou me referindo a algo muito mais importante: a simplicidade da astrologia e a consideração da luz visível. Éris não existe no meu céu. Plutão, muito menos. Só existem para quem tem telescópio. Um astrólogo clássico purista e xiita concluiria, portanto, que nenhum trans-saturnino tem a menor importância numa carta astrológica. E eu responderia que ele está errado. Desde a descoberta de Urano, ficou claro que existem coisas além daquilo que os olhos podem perceber. Não só pela descoberta de Urano, mas também por todos os eventos sincrônicos: a descoberta de microorganismos, de micropartículas, de corpos planetários outros, etc. Mas regente é algo que deveria estar ao alcance de quaisquer olhos. Deste modo, planetas trans-saturninos poderiam ser chamados de "regentes ocultos", "co-regentes", "regentes transpessoais", mas jamais, nunca de "verdadeiros regentes". Implicações em astrologia eletiva e horáriaImaginem a cena: o consulente procura o astrólogo, com a finalidade de elaborar uma carta eletiva para montar uma empresa. Fica evidente, a partir daquilo que o consulente solicita, que ele necessita de um momento em que o regente de Libra esteja forte. O astrólogo então toma Éris e vaticina: "sinto muito, seu negócio não poderá ser montado, pois Éris está em Áries, posição de exílio. Apenas quando Éris entrar em Libra, daqui a centenas de anos, poderemos montar seu negócio". Parece piada, mas faz sentido e já ouvi histórias assim. Quando Plutão passou por Escorpião, passei a colecionar histórias de astrólogos que apressavam seus clientes com o argumento de que uma determinada coisa só poderia ser feita naquele momento, pois uma nova oportunidade só viria em duzentos e cinqüenta anos. O mesmo vale para a astrologia horária. A astrologia horária se pauta em fundamentos bem simples: tomamos os regentes dos signos que estão nas cúspides das casas que importam na questão. Digamos que eu pergunte sobre minha irmã e sua saúde. Deverei tomar a Casa 3 do mapa da pergunta (irmãos) e a sexta casa derivada (que seria, no caso, a Casa 8). Deveria tomar os regentes das casas 3 e 8 e observar seu estado cósmico. Digamos que eu utilize a idéia dos regentes modernos. Se um planeta lento passa por sua posição de exílio e lá fica por trocentos anos, toda pergunta que envolver este planeta como significante terá uma negativa como resposta. Ao praticar a astrologia horária sempre me vali dos regentes clássicos, e sempre obtive resultados frutíferos. Se eu tivesse considerado "Urano" como regente de Aquário para uma série de perguntas, as teria errado. Volto a repetir: não estou dizendo que Urano não reja Aquário. Estou apenas dizendo que ele não é seu "regente verdadeiro". É um co-regente. Mas o regente verdadeiro de Aquário sempre foi Saturno. Uma questão estética?O
raciocínio dos que defendem a idéia de regentes "novos
e verdadeiros" sempre me pareceu seguir a idéia de que temos
doze signos e, assim sendo, deveríamos ter um planeta para cada
signo. Os mesmos defensores de Éris [à
esquerda em ilustração da NASA] como regente
"verdadeiro" de Touro ou de Libra provavelmente atribuirão
a um novo corpo a "verdadeira regência" de Gêmeos
ou de Virgem, num futuro próximo. Irônico será se
descobrirem muitíssimos novos planetas. O que farão os astrólogos?
Inventarão novos signos para que estes planetas-coringa possam
também reger alguma coisa? Um planeta regerá metade de um
signo e o outro planeta regerá a outra metade? Então vamos partir para a consideração de que Éris rege Libra. Se considerarmos isso, teremos uma simetria. Urano e Netuno na seqüência de Aquário e Peixes, Plutão e Éris na seqüência de Escorpião e Libra. Mesmo assim, esbarramos em outro problema estético: se Éris rege Libra e Marte rege Áries, o par-polar de Marte é... Éris? E Vênus, que sobraria para Touro seria o par-polar de... Plutão? Novamente, esbarramos num problema estético. Mas o problema estético nem é tão
grave ainda. Aguardemos pois alguns anos, quando novos planetas forem
descobertos e existirem planetas sobrando no Sistema. Planeta demais pra
pouco signo. Cacique demais pra pouca tribo. E há beleza nessas
controvérsias! Tais polêmicas apenas demonstram que a astrologia
está longe de ser algo uniforme e a pluralidade de idéias
sempre será a nossa garantia contra absolutismos e contra os "donos
da verdade". Outros textos de Alexey Dodsworth. |
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