Aristóteles
em nova perspectiva
AUTOR: Olavo de Carvalho - 1996
Editora Topbooks - 199 páginas
Estou cada vez mais convicto de que a ciência
antropo-social necessita articular-se com a ciência da natureza,
e de que esta articulação requer uma reorganização
da estrutura mesma do saber.
(Edgar Morin)
Aristóteles: pai
da esquizofrenia cultural
ou apóstolo da integridade humana?
Para o filósofo Olavo de Carvalho, há
embutida nas obras de Aristóteles uma idéia medular
que escapou à percepção de quase todos os seus
leitores e comentaristas, exceto Avicena (1037 DC) e São
Tomás de Aquino (1036 DC). Estes, no entanto, limitaram-se
apenas a mencioná-la, conservando assim a vaga noção
de que havia uma estrutura de fundo que integrava e unia o conhecimento
sensível e o conhecimento racional, abarcando, num mesmo
território, todas as quatro obras de Aristóteles sobre
o discurso humano, que são:
- a Poética;
- a Retórica;
- os Tópicos, seu tratado de dialética;
- as Analíticas I e II, seus dois tratados de lógica.
Ademais, quando vistas em conjunto, essas quatro
obras já parecem constituir, nada mais, nada menos, do que
variantes de uma ciência única. Se assim for,
podemos conceber o discurso humano como uma potência única
que se expressa de quatro maneiras diversas: ou poeticamente, ou
retoricamente ou dialeticamente ou logicamente, sendo estas as quatro
expressões possíveis da inteligência humana.
As "quatro ciências do discurso" tratariam então
de quatro maneiras pelas quais o homem pode, pela palavra, influenciar
tanto a própria mente quanto a alheia.
Mas quando o autor deste livro defende a idéia
de que há uma unidade que perpassa por todas essas quatro
obras, ele está querendo dizer muito mais: está querendo
dizer que estes quatro discursos estão profundamente articulados
entre si, se necessitando mutuamente, sendo todos igualmente necessários
à perfeição do conhecimento, tendo, cada um,
uma função a cumprir na realização deste
objetivo. Haveria, portanto, entre eles, não uma diferença
propriamente estética como concebemos atualmente e, sim,
uma diferença funcional, que revelaria o peso e o valor de
cada um destes discursos na obtenção do conhecimento.
No entanto, esta noção de uma unidade
fundamental que integrava as quatro obras ficou mascarada historicamente
e pôde passar despercebida por séculos por causa de
um episódio editorial bastante curioso: ao compor a edição
das obras de Aristóteles no século I a.C., Andrônico
de Rodes classificou a Analítica e a Tópica como obras
lógicas, compondo o Organon, vendo-se forçado
então a classificar a Poética e a Retórica
em outra categoria por acreditar que estas eram de outra natureza,
determinando a tragédia que contribuiria para que houvesse
uma amputação da unidade original que integrava estas
quatro obras.
Não podemos nos esquecer também de
que, como a Retórica desde sempre foi uma ciência abominada
pelos filósofos (que nela viam o emblema dos seus próprios
adversários, os sofistas), e como a Poética veio somente
a reaparecer no ocidente no século XVI, todo o aristotelismo
ocidental que foi se formando no período que vai da véspera
da Era Cristã até o Renascimento foi identificado
à imagem de uma Lógica Formal, a um prédio
que tinha como coluna única a Analítica e a Tópica,
amputadas da sua base original fornecida pela Poética e pela
Retórica. Neste mesmo século a tragédia se
alastra por todo o prédio do saber e a Dialética passa
a ser considerada como uma ciência menor, sendo preterida
em benefício da lógica-analítica, muito embora
tivesse sido consagrada desde a Idade Média como a chave
mesma do pensamento aristotélico. Desse modo, a imagem de
um Aristóteles constituído de Lógica Formal
+ Sensualismo Cognitivo + Teologia do Primeiro Motor Imóvel
acabou se consolidando como verdade histórica jamais contestada.
Portanto, este livro apresenta como um apóstolo
da unidade aquele a quem todos costumam encarar como um guardião
da esquizofrenia. Contesta a imagem estereotipada que o tempo e
a cultura de almanaque consagraram com uma verdade adquirida. Remexe
velhas feridas, cicatrizadas por uma longa sedimentação
de preconceitos, sustentando-se na hipótese simples e perturbadora
de que, como ciências do discurso, a Poética e a Retórica
fazem parte, sim, do conjunto de uma obra que se destinava a refletir
todas as etapas pelas quais se vai construindo o próprio
conhecimento, o edifício do saber. O livro implica uma profunda
revisão da nossa concepção da linguagem e da
cultura em geral, sendo talvez uma chave para a atual busca de um
saber interdisciplinar. Por isso, esta pequeno e grandioso livrinho
não é de suma importância somente para a História
da Filosofia mas, sobretudo, uma pedra fundamental para a concepção
de uma cultura e educação globais e integradas, nas
quais se depositam atualmente as grandes esperanças da humanidade.
A Astrologia revelando analogias
estruturais
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