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Edição 166 :: Abril/2012 :: - |
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ASTROLOGIA E ARTECoração de Estudante: a canção
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Fernando Fernandes |
A letra de Coração de Estudante, de Milton Nascimento e Wagner Tiso, parece ter sido feita sob medida para explicar o mapa de Tancredo Neves, presidente eleito em 1985 cuja morte coincide com o início do processo de redemocratização do país.
Coração-de-Estudante é o nome popular da Begonia undulata, uma pequena flor da família das Begoniaceae [foto], muito comum em Minas Gerais e em outras regiões do país. Coração de Estudante (sem o hífen) é também o nome de uma canção de Milton Nascimento e Wagner Tiso, lançada no final de 1983 e logo transformada num dos hinos da campanha das Diretas Já. Milton cantou-a, por exemplo, num show na Praça da Apoteose, no Rio de Janeiro, no início de 1984, acompanhado por sessenta mil pessoas a agitar faixas e bandeiras. Simples e emotiva, a canção conseguiu captar o clima de esperança vivido pelo Brasil naquele momento, mas acabou ganhando também um uso inesperado: em versão instrumental, foi o fundo sonoro das Redes Globo e Bandeirantes durante a cobertura do longo velório de Tancredo Neves em Brasília, São Paulo e Belo Horizonte, assim como do sepultamento em São João Del-Rei. Sem saber, Milton e Wagner Tiso haviam produzido o hino de um dos maiores momentos de mobilização popular da história nacional.
A escolha não foi casual, já que o próprio Tancredo adorava a música. Além do mais, a letra guarda diversas analogias com a carta do presidente eleito. É como se os autores tivessem conseguido traduzir em versos as configurações mais importantes do mapa do político mineiro que, internado às pressas na véspera de sua posse e submetido a sete cirurgias, acabou morrendo sem ocupar por um único dia a Presidência da República.
Consideremos em primeiro lugar o mapa de Tancredo Neves:
Tancredo de Almeida Neves - 4.3.1910, 4h LMT - S. João del Rei, MG
044w15, 21s08.
Uma análise superficial da carta mostra que, apesar do Sol em Peixes (Água) e da Lua em Sagitário (Fogo), o que predomina é o Ar, mais livre e imponderável de todos os elementos, associado à vida mental e ao gosto pelos contatos sociais. Em Ar estão o Ascendente Aquário e os planetas Vênus, Mercúrio, Júpiter e Plutão, além do Nodo Norte. Não é à toa que esse político mineiro entrou para a História como um grande argumentador e articulador.
Outro traço muito característico da carta é a dispersão dos planetas por nove signos diferentes, formando um padrão comumente conhecido como Salpicado. É um desenho que revela muitos focos de interesse e capacidade de lidar com assuntos díspares, ou com projetos contraditórios. Além do mais, Tancredo tinha Mercúrio (comunicação) e Vênus (afetividade, sociabilidade) no Ascendente, indicando uma disposição para o discurso persuasivo e para o uso da simpatia pessoal em prol da conciliação e do diálogo. Mas vamos à letra de Coração de Estudante:
Coração de Estudante
(Milton Nascimento / Wagner Tiso)
Quero falar de uma coisa
Adivinha onde ela anda
Deve estar dentro do peito
Ou caminha pelo ar
Pode estar aqui ao lado
Bem mais perto que pensamos
A folha da juventude
É o nome certo desse amor
A primeira estrofe fala de algo impalpável, que está em toda parte e “caminha pelo ar”. É um sentimento – a esperança – relacionado à possibilidade da implantação de um regime aberto e democrático. O elemento Ar, tão forte no mapa de Tancredo, é o das ideias, dos projetos, dos conceitos e abstrações. Ideias não são aprisionáveis. Mesmo o homem no cárcere é capaz de ir a qualquer parte e sonhar todos os sonhos através do pensamento.
Aquário no Ascendente de Tancredo (e também da carta de Independência do Brasil) é o signo que melhor consubstancia o conceito de liberdade. Mercúrio, ali posicionado, regente de Gêmeos na casa 5 (a casa do coração), traz à tona os valores de adolescência: é a folha da juventude, o próprio coração de estudante. Mercúrio está em conjunção com Vênus sobre o Ascendente. Por isso, pode ser claramente descrito pelos versos “a folha da juventude (Mercúrio) é o nome certo desse amor (Vênus)”. Juventude, aliás, também é atributo de Júpiter (a palavra deriva de Jove, outro nome romano do Deus), e o Júpiter de Tancredo está em trígono com Vênus.
Já podaram seus momentos
Desviaram seu destino
Seu sorriso de menino
Quantas vezes se escondeu
Mas renova-se a esperança
Nova aurora a cada dia
E há que se cuidar do broto
Pra que a vida nos dê flor e fruto
O sentimento de esperança e de liberdade não se afirma sem dificuldades, conforme nos diz a segunda estrofe: “já podaram seus momentos, desviaram seu destino”. Basta procurar Urano, regente moderno do Ascendente Aquário, para encontrá-lo na casa 12, recebendo a restritiva quadratura de Saturno. É um sonho “escondido”. Mas a esperança se renova (Mercúrio em trígono com Plutão na 5) e encara otimisticamente o futuro (Mercúrio em trígono com Júpiter na 9). Um dos fundamentos desta esperança é a força da amizade, da alegria e do sonho, tudo isso simbolizado por Júpiter na 9 (crenças) regente da 11 (amizades) e pela Lua sagitariana na cúspide da 11.
Coração de estudante
Há que se cuidar da vida
Há que se cuidar do mundo
Tomar conta da amizade
Alegria e muito sonho
Espalhados no caminho
Verdes: planta e sentimento
Folhas, Coração, Juventude e Fé.
Os dois últimos versos unem conceitos que guardam correspondência com a casa 1 de Tancredo Neves ao unirem o verde da esperança (Júpiter em Libra em trígono com seu dispositor, Vênus, e com o jovem Mercúrio, ambos em Aquário) ao coração (Mercúrio, regente da casa 5) e à fé (Júpiter e Vênus, regente da casa 9, significadora das crenças).
Se Tancredo tivesse vivido para governar o Brasil, é certo que o desgaste político do dia-a-dia traria a progressiva diluição dos ideais da Nova República, que ele corporificou. Mas Mercúrio no Ascendente é também o regente de Virgem na 8. O regente da casa da morte na casa da afirmação da vida é um posicionamento pleno de possibilidades contraditórias. Considerando que Mercúrio faz ainda trígono com o transmutador Plutão na 5, temos em Tancredo o simbolismo daquele que morreu para insuflar vida numa nova fase da história do país: morte e regeneração. O idoso senhor de 75 anos consolidou, com sua passagem para outro plano, a “nova aurora” em que o broto da democracia daria “flor e fruto”.
Capa do Jornal do Brasil, do Rio de Janeiro, em 15 de março de 1985. Deveria ser o dia da posse de Tancredo Neves como presidente, após 21 anos de governo militar. Contudo, quem acabou tomando posse foi José Sarney.
As imagens mais fortes do longo velório de Tancredo foram duas: a multidão comprimida junto às grades dos aeroportos de Brasília e São Paulo enquanto o avião que levava seu corpo levantava voo; e a escolta de jovens em motocicletas que espontaneamente acompanhou o cortejo pelas ruas de Belo Horizonte. Aquele corpo “caminhando pelo ar” e agregando a barulhenta juventude em torno de um cortejo fúnebre representou o ato final de uma vida sempre vivida com a amplitude do modelo Salpicado: unir os opostos e criar novas sínteses com elementos díspares. Só mesmo um Salpicado poderia chegar ao poder com um leque de apoios tão diversos, de militares moderados a ex-integrantes de grupos radicais de esquerda, e afirmar para todos, em seu discurso de candidato eleito: “Não vamos nos dispersar.”
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