Plutão é um planeta tão lento que os últimos governantes nascidos com Plutão em Capricórnio já morreram há mais de cem anos. Só voltaremos a conhecer políticos e presidentes com este posicionamento daqui a alguns anos, quando os meninos nascidos a partir de 2008 estiverem adultos. Mas não é difícil imaginar que o planeta do poder no signo das estruturas e hierarquias deva ter alguma relação com a ambição política, desde que o restante do mapa aponte na mesma direção. Se este Plutão está em conjunção com a Lua e em quadratura com o Sol, podemos pensar não apenas em desejo, mas em compulsão pelo poder e pelo controle. Se, além disso, Marte está no dramático signo de Leão, enviando quadraturas simultaneamente a Júpiter, Vênus e Urano, agreguemos à imagem inicial boas doses de ousadia, excentricidade, disposição para correr riscos e um certo toque teatral. Trata-se, com certeza, de um Marte temperamental, impaciente e dado a rompantes.
Com Vênus no sensual signo de Touro, formando conjunção com o exagerado Júpiter e com o original Urano, eis alguém que supervaloriza o prazer material e é capaz de buscá-lo de uma forma altamente pessoal. Com tudo isso em quadratura com Marte, o que dá prazer não pode esperar: tem de ser agora!
A dona deste mapa teve grande participação nos acontecimentos da história do Brasil e de Portugal: foi Carlota Joaquina, a fogosa princesa espanhola para quem era muito pouco ser apenas a esposa de D. João VI e a rainha dessa “terra de negros e mestiços” chamada Brasil.
Carlota nasceu em Madri, em 22 de abril de 1775. Era filha do rei da Espanha, Carlos IV, e corria em suas veias o sangue dos Bourbon e dos Habsburgo. Amantes, Carlota teve-os às dúzias – apesar de ser, na descrição impiedosa dos cronistas da época, uma mulher excessivamente baixinha, absurdamente feia e tremendamente perigosa. Jamais se sentiu à vontade na corte portuguesa. Casada aos dez anos de idade por conveniência política com o príncipe herdeiro de Portugal, nunca alimentou por D. João qualquer sentimento mais nobre. Nos momentos menos tensos, apenas tolerou-o, mantendo dele a máxima distância possível. Com mais frequência, agiu como conspiradora, vendo no pacato marido apenas um estorvo para seus vastos projetos pessoais. Quando D. Maria I, mãe de D. João, foi declarada louca, Carlota tentou a todo custo ser declarada regente do trono português. Não conseguiu, mas já começava a mostrar do que era capaz. E não tinha ainda 20 anos!
Amantes, espiões e argentinos
Carlota era ao mesmo tempo um rebento da família real espanhola e rainha de Portugal, o que lhe permitia sonhar com a unificação das duas coroas e com a constituição de um vasto império que reunisse todas as colônias da América do Sul. Esta chance existiu objetivamente quando Napoleão invadiu a Espanha e depôs do trono Carlos IV, pai de Carlota. Esta, em 19 de agosto de 1808, apresentou uma petição a D. João, que ficou conhecida como Justa Reclamación, em que instava o marido a ajudá-la no projeto de invadir Buenos Aires e instalar uma regência espanhola no exílio. Se o projeto tivesse vingado, Brasil e Argentina poderiam hoje estar reunidos sob uma mesma administração e teríamos Buenos Aires como capital. Seríamos todos argentinos, por culpa de D. Carlota!
O povo de Buenos Aires, porém, não esperou passivamente e aproveitou para declarar a independência. D. João atendeu ao pleito da esposa pela metade e invadiu o Uruguai, transformando-o em província do império colonial português. Dona Carlota ficou a ver navios, mas não parou de conspirar. Ambiciosa e eternamente insatisfeita, maquinou intrigas até o fim de sua vida.
Depois da fuga da corte para o Brasil – à qual, aliás, ela era contrária – Carlota e João passaram a residir a uma distância segura, ele encastelado na residência oficial dos vice-reis (o depois chamado Paço Imperial, na atual Praça XV), e ela num palacete em Botafogo, onde entretinha-se com amantes, articulava-se secretamente com potências estrangeiras e recebia informes de seus espiões. Em contraste com a simplicidade de D. João, Carlota demonstrava a cada momento sua formação despótica e tirânica. Exigia que todos se ajoelhassem à sua passagem, vestia-se suntuosamente (Vênus em Touro em quadratura com Marte em Leão) e disparava impropérios em portunhol, com sua língua terrivelmente afiada (Mercúrio em Áries oposto a Saturno).
Qualquer que seja o horário de nascimento de Carlota Joaquina, haverá sempre um Grande Trígono em sua carta, envolvendo Plutão, Lua, Vênus, Urano e Saturno em signos de Terra e Ar. Metade do mapa integra esta poderosa configuração, cuja característica básica é aquela de todos os trígonos: a preservação do movimento e o aprofundamento de um modo de ser, seja ele qual for. Vênus é o planeta mais forte, na medida em que está em domicílio (Touro) e dispõe, direta ou indiretamente, de todos os demais planetas. Vênus está em conjunção com Urano e em quadratura com Marte, mostrando a rainha como uma pessoa capaz de acumular grandes recursos (Vênus/Touro) com vistas à autonomia e à afirmação do próprio espaço pessoal (Vênus-Urano) – mesmo que por métodos impessoais e brutais (aspectos tensos de Marte e Plutão). Se nascesse em nosso tempo, seria uma mulher empreendedora e capaz de competir de igual para igual com qualquer homem. Na tacanha corte portuguesa do início do século XIX, é natural que se sentisse como uma fera na jaula.
Leia a série completa sobre as personalidades que levaram o Brasil da Colônia à Independência:
- Do Quinto dos Infernos ao Novo Mundo
- Carlota Joaquina, quase rainha da… Argentina
- D. João VI, apenas um comedor de coxinhas?
- Marquesa de Santos, a Titila do Imperador
- O dia em que a família real fugiu para o Brasil
- Chalaça, a sombra danada do Imperador
- Afinal, quem era o Chalaça?
- Chalaça, o homem do Chupa-Chupa
- Chalaça e PC Farias, estranhas semelhanças
- Dom Pedro I e Fernando Collor: a história se repetiu?