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DISCUTINDO
O PAPEL DA ASTROLOGIA
Entre
os clássicos e os asteróides
Barbara Abramo
Em tom bem humorado, a autora se declara uma "astróloga antiquada" e critica os exageros da modernidade, considerando-os um fruto perverso do discurso neoliberal. Por outro lado, reconhece a importância de descobertas astrológicas recentes e explica a origem do quintil e do biquintil. Nos últimos tempos, com a troca acelerada de informação nas listas de Astrologia da Internet, ando lendo sobre assuntos que nunca antes me interessaram, como por exemplo, esta conversa sobre Quíron. Em minha tacanheza mental, decidia as coisas de outro modo, a saber, que como a Astrologia era uma coisa pra lá de antiga, o que eu tinha a fazer era uma arqueo-Astrologia, uma escavação no passado, e foi aí que cheguei na Suméria, cujo nome pronuncio aqui e me sinto clamando no deserto. Antiquada, preferia Manilius (Marcus Manilius, astrólogo romano do primeiro século de nossa era) a textos de moda, e, para não mentir, certa época andei interessada na Lilith, mas foi ocasional e passageira curiosidade. Minha cabecinha capricorniana ficava ligada em hierarquias - o que, afinal, é realmente importante? O que é arque, o que está no princípio? Como acho que só chegam a nós alguns subprodutos de um conhecimento potentíssimo que sofreu quebras, dejeções, exílios, caiu no limbo e que voltou, vestindo um novo look neste século. Até hoje primeiro me espanto e depois acho very annoying quando vejo alguém explicar algo através de algum biquintil da vida entre asteróides, planetóides, só para dar um exemplo. Acho que faço uma Astrologia velha, onde estas coisas não entram, talvez porque eu desconfie, ou meu instinto escorpiônico me faça desconfiar de coisas pouco seguras. Fico atrás de uma hierarquia, mínima que seja. O resto é o resto, ou seja, modernidade. É essa modernidade que me fez durante anos nem levar em conta Plutão, nem Urano, nem Netuno, quanto mais planetóides... Até hoje nem olho pra estes três quando analiso regências ou progressões. Ou olho de lado, com pé atrás. Só tenho confiança no que já passei e que identifico com algumas coisas que posso trazer para o campo da percepção. Sinto, acho ou desconfio - não tenho certeza - que determinadas preocupações são depositárias de um certo discurso perverso do neolibealismo, e que a sedução para entrar nele é muito grande, ou a pressão para tal. Um astrólogo está bombardeado, o tempo todo, pelas mesmas pressões que atingem qualquer profissional nesta periferia do sistema internacional. Clientes, por exemplo, querem tudo fácil, rápido, indolor, querem realizar a fantasmagoria do sistema: mania, produção, consumo, perversão. Ninguém quer ouvir um discurso que quebre o discurso interno sobre suas limitações. Custa tempo, trabalho, esforço, custa um Saturno bem estruturado.
O astrólogo talvez consiga ver de modo mais includente certos aspectos que se deixaram obscurecidos por tanta modernidade. Desde que não se deixe seduzir pela pressão da modernidade, do niilismo, do relativismo total. Não importa o que outros "istas" digam, o conhecimento de como um mapa opera é uma coisa clara pra quem os lê. Não importa o que digam físicos e psicólogos de variadas linhas. Ao largo com eles. São bons para instruir, mas desde que não nos enfiem uma camisa de força, com a desculpa de que assim - ah! assim - o discurso do astrólogo, este ledor do tempo e do ritmo, esse ser desafinado e fora de esquadro, seja finalmente cooptado para dentro de modernidades, que na maioria da vezes trazem consigo seu séquito: mania, rapidez, consumo, produção, perversão e desestruturação. Os narizes se torcem ao ler Lilly ou Maternus Ficinus [*], claro! Seu discurso não propõe a solução rápida, nem a liberdade - esse ledo engano - nem o consumo. Não sei, não tenho certeza. Acho que talvez não precisássemos dar conta de tudo que rola nos céus e fazer com que essas coisas todas coubessem num mapa. De novo, quem sabe os eclipses não são mais esclarecedores do que planetóides? Não sei. Ou as estrelas fixas, tão importantes para a Astrologia árabe e também lá na Suméria, onde tudo começou... Depois dos 40 se têm poucas certezas, mais dúvidas mesmo, como estas que estou colocando. E com minha cabeça antiquada e careta, fico pensando se já não estou defasada demais. Vai ver, é hora de pendurar as chuteiras e fazer um tricôzinho... sem dúvida lendo cantos sumérios! [*] William Lilly: astrólogo inglês (s. XVI e XVII) que consolidou as bases teóricas da Astrologia Horária; Maternus: astrólogo clássico da era romana. Quintis e biquintis no quintal do laboratório astrológico
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