Uma gente rude comendo formigas
assadas
Eram treze jesuítas numa casinha de barro
e paus, coberta de palha, com 14 passos de comprimento e 10 de largura,
onde, nas palavras de Anchieta, estavam a escola, a enfermaria,
o refeitório, a cozinha e a despensa. Davam as aulas ao ar
livre, para os índios.
Esse Colégio, comandado pela cabeça
esperta de Anchieta, produzia todo tipo de miscigenação
cultural nativa/cristã, de modo a facilitar a catequização.
Desse modo de lá saíram, segundo os historiadores,
os primeiros letrados e poetas que o Brasil possuiu, no entender
por exemplo, de Sérgio Macedo. Isso remete a uma energia
do elemento Ar.
Como em outros povoamentos coloniais, a região
vivia sob constante ameaça de ataques de tribos nativas contrárias
ao acerto político que compunha o poder em São Paulo.
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Tibiriçá numa versão
idealizada |
Em volta do colégio foram erguidas tabas e
o povoado era fechado por quatro portas. Duas ficavam ao norte,
guardadas pelos índios de Tibiriçá, pai da
mulher de João Ramalho, que aliás não se sabe
ao certo quando aqui chegou, mas era a influência política
hegemônica na região. As duas portas restantes ficavam
ao sul, defendidas pelo grupo nativo de Caiubi, outro chefe indígena
que compunha o poder político com João Ramalho.
Havia, pois, uma composição política,
comum na época e inteligente na ótica da dominação:
os colonizadores se apoiavam em grupos tribais e aproveitavam suas
brigas internas para irem estabelecendo o poder no lugar.
Na época da fundação, havia
o número cabalístico de 133 moradores, 13 jesuítas
e 120 nativos.
A igreja de São Paulo é inaugurada
em 1° de janeiro de 1556. Em 1561 é construído
um recolhimento para os exercícios dos padres, onde também
se ensinavam letras. Em 1560 a vila de Santo André é
extinta e João Ramalho se muda para cá, sendo que
este não via com bons olhos o crescimento de São Paulo,
provavelmente por causa da hegemonia jesuítica aqui, ao contrário
de Santo André. Ramalho traz o pelourinho com ele e o coloca
na frente do Colégio dos Jesuítas. O primeiro Paço
Municipal foi construído em 1575; a primeira cadeia, em maio
de 1579.
Em 1562 João Ramalho vira capitão-mor
de São Paulo, que então é elevada a comício
eleitoral. No mesmo ano, no Natal, morre o cacique Tibiriçá,
chefe guaianaz que fundou a cidade com o padre Nóbrega.
Nos anos subseqüentes chegam novas ordens religiosas.
Em julho de 1598 é fundada a ordem beneditina e começa-se
a construção de sua igreja: era a igreja da Sé.
A cidadezinha era pobre, as pessoas comiam formigas
assadas, e aqui, ao contrário do resto do Brasil só
as mulheres faziam o pão - e entenda-se por pão um
tipo de broa de milho, porque pão mesmo só chegou
depois de 1850, com a Grande Imigração, trazido pela
mão dos italianos.
Com a mistura de índios e portugueses, a estrutura
familiar européia se transforma: começam a aparecer
famílias inteiras com mais de uma mulher. Uma endogamia fechada
também era relatada nos diários de viajantes - Lery,
von Martius e escrivães da corte portuguesa. As primeira
mulheres européias que aparecem na região são
francesas, moram ali perto de São Vicente, e a elas se juntam
portuguesas, mulheres dos degredados.
As famílias andavam sempre meio trancadas
em suas casas, eram arredias - ainda se fala isso de paulistanos.
A Vênus em Capricórnio: essa gente rude e pouco expansiva
que aqui medra...
No final do século XVI, duas famílias
brigavam pelo poder: os Ramalho e os Pinheiro. O chefe da primeira
facção era neto de Tibiriçá, filho da
nativa Bartira com João Ramalho. As duas famílias
eram miscigenadas e ricas. Brigavam por causa de extração
de ouro.
NOTAS DO EDITOR:
Entenda-se por ricas as famílias abastadas para os padrões
da região. Mesmo estas famílias tinham um padrão
de vida bastante rude, comparado ao de Salvador, por exemplo.
O ouro da região de São Paulo era de aluvião,
encontrado em quantidades ínfimas nos rios em torno da
vila. A descoberta do ouro de Minas Gerais só aconteceria
no final do século seguinte. |
O mapa de São
Paulo e os movimentos operários do século passado
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